sexta-feira, 15 de abril de 2022

Páscoa. José Mauricio de Carvalho

 




                                  "Cristo Ressuscitado no Túmulo"


 

A Páscoa é uma festa judaica relatada na Bíblia. No Primeiro Testamento os livros relataram a história da libertação dos judeus do Egito. Eles denominavam de Pessach ou "Festa da Libertação", a celebração desse fato que se deu aproximadamente em 1446 a.C. O relato bíblico mostra que a efetiva presença de Deus representou uma virada na vida dos judeus cativos no antigo Egito, introduzindo na vida do povo uma vida nova cheia de esperança. O que significou isso? Que a presença de Deus, quando invocada com fé consciente tem o poder de mudar as coisas do mundo. Porém, o livro do Êxodo mostra também que a mudança não vem sem sofrimento e que a libertação e a esperança são conquistas que incluem uma transformação interna que o homem pode experimentar diante de Deus, se ele superar o que o mantinha numa vida pobre e inautêntica. Uma vida que não contempla todas as possibilidades de uma vida plena. Em Êxodo 16,3 se lê: “Quem dera tivéssemos morrido por mão do Senhor na terra do Egito, quando estávamos sentados junto às panelas de carne, quando comíamos pão até fartar! Porque nos tendes trazido a este deserto, para matardes de fome a toda esta multidão.” E esse mesmo lamento da condição anterior, da perda da confortável prisão em que viviam se repete no livro de Números 11:4-6: "Ah, se tivéssemos carne para comer! Nós nos lembramos dos peixes que comíamos de graça no Egito, e também dos pepinos, das melancias, dos alhos porós, das cebolas e dos alhos. Mas agora perdemos o apetite; nunca vemos nada, a não ser este maná! "

 

O episódio da saída de uma vida de escravidão para uma vida em liberdade, com a promessa de uma vida plena numa terra de fartura mostra que o homem vive nesse mundo e que enquanto aqui estiver deve construir um sentido para viver, mas um sentido que não se esgota no dia a dia ou na fenomenologia da existência. Ele precisa descobrir para ter vida plena um sentido que vá além dos objetivos imediatos.

 

O Segundo Testamento considera também a Páscoa o momento de passagem para uma vida plena. Nela Jesus recupera a vida depois de haver morrido. A fazê-lo acena para a continuação da vida como está em Mt, 28, 1-7: “Passado o sábado, no domingo bem cedo, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o túmulo onde Jesus tinha sido enterrado. 2 Naquela ocasião houve um grande terremoto, pois um anjo do Senhor tinha descido do céu, removido a pedra que fechava o túmulo e agora estava sentado sobre a pedra. 3 Ele se parecia com um relâmpago e as suas roupas eram brancas como a neve. 4 Os guardas tinham ficado com tanto medo, ao ponto que ficaram tremendo e, ao mesmo tempo, paralisados como se estivessem mortos. 5 Então o anjo disse às mulheres:—Deixem de ter medo! Eu sei que vocês vieram procurar por Jesus, aquele que foi crucificado, 6 mas ele não está mais aqui. Ele ressuscitou, exatamente como havia dito que iria fazer. Venham ver o lugar onde ele estava deitado. 7 Agora, vão depressa e digam aos discípulos dele o seguinte: “Jesus ressuscitou dos mortos e vai adiante de vocês para a Galileia. Lá vocês o verão novamente”.

 

 As duas descrições bíblicas da Páscoa representam a passagem de uma realidade para outra mais plena, que lhe dá continuidade. E creio que se possa somar às duas descrições pois Jesus cumpriu toda a Lei antiga e foi um judeu excelente como reconheceram Martin Buber e Vilém Flusser, esse último considerou mesmo Jesus a figura central do judaísmo porque nele via quem conseguiu modificar a consciência histórica dos homens com a noção de fraternidade universal. Isso significava apresentar um projeto existencial para todos os homens com termos universalmente judaicos.” E assim, embora pregasse para os filhos perdidos da casa de Israel que viviam naqueles dias, a mensagem de Jesus é transhistórica isto é, possui um sentido existencial que não fica presa à contingências históricas. Jesus recolhe em si toda a experiência judaica e depois a apresenta para o mundo todo e com validade para todos os tempos. E como modelo Ele está além de toda realidade concreta. Creio que a Páscoa traduz isso, a proposta de um grande sentido existencial que vem da passagem de uma vida para outra mais plena.


Postagens mais vistas