sexta-feira, 15 de maio de 2015

Que esperança sobra quando falha o Estado. José Maurício de Carvalho - UFSJ



Muitos americanos foram às ruas protestar contra a morte do jovem negro Freddie Gray, de 25 anos, que se feriu ou foi ferido enquanto estava sob responsabilidade da polícia de Baltimore depois de ser preso, sem razão legal, em 12 de abril próximo passado. A maioria da população norte-americana revela-se indignada contra a discriminação dos negros pelas autoridades policiais e descumprimento dos direitos civis. Um pequeno número entre esses manifestantes promoveram grande confusão na cidade de Baltimore, saquearam e incendiaram lojas, enfrentaram a polícia levando as autoridades decretarem toque de recolher.
Milhares de manifestantes se reuniram no dia 1º de maio para protestar contra a exposição universal na cidade de Milão, um evento bilionário que deve se estender por seis meses na elegante cidade italiana. A manifestação pretendia denunciar o enorme investimento naquele evento num momento em que a economia anda mal e os Estados mostram-se fracos e sem recursos para enfrentar a crise. No meio dos manifestantes uma centena protagonizou ação violenta, queimando latas de lixo, veículos e objetos do mobiliário urbano, transformando a cidade italiana num caos. Essa última confusão bastante semelhante às ações do Black Bloc que promoveu grande anarquia no Brasil nos últimos meses. Black Bloc, recordem, é um movimento anarquista cujas manifestações violentas pipocam em diversos países do mundo. Basta algo ter visibilidade mundial lá estão eles se esforçando para instalar o caos. A atuação desses grupos é tão mais violenta quanto fracas e inseguras se mostram as autoridades locais. Esses grupos violentos parecem se inspirar nos movimentos contra a globalização que tiveram início nos anos 90 na Europa e Estados Unidos, cuja forma de agir era semelhante. Vestiam-se de negro e usavam capuz para impedir a identificação.
De comum entre os dois eventos a incapacidade do Estado de responder eficazmente os problemas atuais. No primeiro a incapacidade norte americana de superar o preconceito racial e garantir a efetivação dos direitos civis para os negros. No segundo a incapacidade dos governos de enfrentarem com eficiência a grande crise econômica que se iniciou em 2008 e cujas consequências ainda andam pelo mundo, inclusive no Brasil. Nos dois eventos a presença de uma minoria, organizada e anárquica a enfrentar os agentes do Estado no esforço para destruí-lo.
Essa realidade mundial pode merecer várias leituras e interpretações, mas não deixa de mostrar que, onde o Estado atua mal, as consequências são quase sempre em ordem crescente: a manifestação inconformada, a revolta e a violência. Entre nós se multiplicaram grupos de justiceiros, aumentam o registro dos crimes e a ação inconformada da população que, vez ou outra, espera fazer justiça com as próprias mãos.
Na raiz da insatisfação, lá de fora e daqui, um tempo onde as pessoas não sabem a que ater vida e a direcionam ao consumo ansioso e gozo irresponsável, cuja frustração culmina em mais violência. Um tempo em que as guerras convencionais foram substituídas pela violência intra-nacional e onde o hedonismo ansioso se nutre de drogas alucinógenas e estimulantes, essas últimas capazes de acelerar o funcionamento do cérebro e induzir a hiperexcitabilidade.

A realidade mais especificamente humana, a individualidade e liberdade, exigem para sua manifestação, um Estado organizado capaz de assegurar a ordem, promover o dever e de funcionar bem nos serviços que presta. Sem responder aos desafios de nosso tempo, os Estados contribuem para popularizar a desesperança e desassossego. Assim caminhamos num tempo de intranquilidade, não por causa da bomba atômica e dos riscos do cataclismo nuclear, mas da violência urbana que pode alcançar qualquer um em qualquer parte.

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