sexta-feira, 30 de setembro de 2016

A Reforma do Ensino e a Filosofia. Selvino Antonio Malfatti.




A inclusão ou não da filosofia no currículo do ensino médio nos remete a Aristóteles: devemos ou não filosofar? Se devemos, então filosofamos. Se não devemos, então devemos filosofar para justificar por que não devemos filosofar. Logo, sempre filosofamos.
Há, no meu entender uma questão de fundo que subjaz na à questão. É aquilo que Montesquieu chama de o “espírito”, Chateaubriand de “gênio” e Tocqueville de “substrato natural. Um determinado comportamento não tem necessidade de legaliza-lo quando a sociedade por si mesma o faz. Os anglo-saxões tem-no na common law, por exemplo, pela qual a tradição é mais importante que a legislação.  No entanto, há sociedades que necessitam legislar sobre tudo. Para os italianos, por exemplo, não basta dizer: é proibido. Há que se enfatizar: “absolutamente proibido”. Se for proibido, então é proibido, mas para eles não basta isso, tem que ser absolutamente proibido.

Qual a função da filosofia no ensino médio? É ser um instrumento para a cidadania para as sociedades que não têm o recurso do “espírito”, “gênio” ou do “natural”. A filosofia, mal comparando, é uma prótese que determinadas sociedades necessitam para formar cidadãos que os ajudem a avaliar valores, enxergar as consequências de comportamentos, julgar atitudes e criticar pensamentos ou ideologias. Diante disso, percebe-se que nem todas as sociedades necessitam de filosofia para seu ensino médio que, além dos conteúdos das disciplinas, forma o cidadão. Sociedades culturalmente homogêneas estariam dispensadas.  À medida que sobem na escala da heterogeneidade cultural, preme a necessidade de filosofia para sua cidadania. Os anglo-saxões, os japoneses, os hindus não necessitariam. Os alemães, os espanhóis e franceses precisariam bem pouco. Os italianos e brasileiros, carecem muito. 
Se lançarmos um olhar rápido pelo mundo sobre o ensino da filosofia no ensino médio, constatamos uma grande disparidade. Infelizmente o debate da filosofia no currículo básico, na prática recai sobre o problema de custos econômicos, pois o privado não vai querer pagar mais um professor e o público não vai nomear mais um. Os ganhos espirituais no investimento não são levados em conta.
Como já frisamos os países de língua inglesa praticamente não possuem filosofia no ensino médio. Como exemplo, pode ser citado Reino Unido e América do Norte. Na Rússia a filosofia está ausente no ensino médio, mas não há uma rejeição explícita. Na Irlanda, apesar da ausência da filosofia nas escolas acredita-se que ela pode contribuir para formar cidadãos esclarecidos. No Chile, há uma crença de que a filosofia pode exercer uma influência positiva no convívio social, pois orienta os adolescentes quanto à sexualidade, drogas e assuntos relativos a questões existenciais.
Embora em alguns países, como Nova Zelândia, dão ênfase às filosofias nativas, o mais corrente é considerar as filosofias oriundas da Grécia antiga, Europa medieval, e as filosofias de França e Alemanha como universais. 
Nos diversos encontros e colóquios bilaterais entre Brasil e Portugal surgiu a hipótese de que só existem filosofias nacionais, especificadas cada qual pelo seu problema, ou ênfase nas questões específicas. Com efeito, cada país possui uma temática própria que caracteriza sua filosofia como o SISTEMA na Alemanha, o ESPÍRITO na Itália, a RAZÃO na França e assim por diante. No Brasil o pano de fundo é a CULTURA e em Portugal DEUS.
A questão da cultura na filosofia brasileira reflete bem o substrato social, qual seja a heterogeneidade: somos um conjunto de todas as raças, religiões, embora haja predominância numérica de católicos, há um caldinho de credos, ideologias mais desencontradas caminham pari passu, as cores raciais são um estampado vivo.
No caso brasileiro a filosofia pode ser o tripé para a concertação social.

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