sexta-feira, 11 de abril de 2014

QUASE UM SÉCULO DE CULTURA. Selvino Antonio Malfatti




Hoje Reflexão homenageia ANTONIO PAIM, o intelectual brasileiro que completou 87 anos.
Inicialmente projetado para ser o guru do socialismo-comunismo no Brasil – inclusive com formação acadêmica em Moscou – quando percebeu o dogmatismo dessas ideologias, converteu-se à liberal-democracia. Devido à perseguição movida pela KGB russa teve que abandonar aquele país deixando por lá mulher e filha. 
No Brasil passa a lecionar em universidades fundando cursos de pós-graduação. Como resultado conseguiu formar escola e ter seguidores. Estes poderiam ser divididos em três categorias: os de primeira geração como Ricardo Vélez Rodriguez, Leonardo Prota, Anna Moog Rodriguez e outros. Os de segunda geração, como José Maurício de Carvalho, Tiago Lara, Selvino Malfatti e os de terceira geração que receberam formação de discípulos de Paim.
Nada melhor ouvirmos seu discípulo, um dos mais completos, Ricardo Vélez Rodriguez:

O ANIVERSÁRIO DO MESTRE ANTÔNIO PAIM




No passado 7 de Abril, um grupo de familiares, amigos e discípulos de Antônio Paim,  comemoramos em São Paulo os 87 anos do mestre. O evento aconteceu na Tasca do Zé e da Maria, em Pinheiros. A filha Augusta (que mora em S. Paulo) e a amiga Rosa Mendonça de Brito (residente em Manaus), planejaram tudo. Foi uma festa surpresa para o querido mestre. As organizadoras teriam gostado que mais amigos e discípulos do Antônio Paim estivessem presentes. Mas com o corre-corre foi difícil entrar em contato com mais pessoas. 

Estiveram presentes: Maria e Arsênio Corrêa (S. Paulo), Leonardo Prota (Londrina), Anna Maria Moog (Petrópolis), Ricardo Vélez Rodríguez (Londrina), Rosa Mendonça de Brito (Manaus), Augusta Fonseca Paim (S. Paulo) e Antônio Roberto Batista (S. Paulo).

Antônio Paim é um desses educadores que conseguem manter nexos de amizade com as várias gerações de discípulos que passaram pelas suas aulas. Coloco, a seguir, os depoimentos de duas discípulas do mestre: Anna Maria Moog e Rosa Mendonça de Brito. 

Eis o depoimento da Anna Maria Moog: "Ao receber o e-mail de Rosa (Mendonça de Brito)  propondo que eu fosse, dali a dois dias, participar de um jantar comemorativo do aniversário de mestre Antonio Paim, pensei que não conseguiria me desvencilhar dos compromissos prévios.  Mas logo decidi colocar tudo de lado e viajar para S. Paulo .  Valeu a pena. Foi uma enorme alegria estar com amigos de longa data, unidos justamente pela amizade, respeito e admiração que nutrimos pela figura de Paim. Ao longo dos anos, Antonio Paim tem sido nosso norte, a referência inelutável para seus amigos, ex-alunos e admiradores de sua obra, sobre todos os temas relativos à cultura, à filosofia, à moral e à política.  Acima de ser referência intelectual, reconhecemos nele o homem de bem, de postura discreta mas capaz de iluminar com suas palestras inteligentes e, por vezes, espirituosas, nossas reuniões.  O homem que nunca faltou  com seu apoio aos que a ele recorreram e jamais, jamais deixou um amigo 'na mão'.Inúmeros depoimentos sobre sua pessoa já o declamaram de sobejo. Por esse, e muitos mais motivos, o jantar dos 87 anos do jovem Antonio Paim foi festejado  com alegria, mormente porque proporcionou aos amigos a oportunidade de lhe demonstrar mais uma vez o carinho que lhe temos e a alegria de o abraçarmos".

A seguir, o depoimento de Rosa Mendonça de Brito: "O encontro com Paim, Augusta, Anna Moog, Leonardo Prota e Ricardo Vélez,   encontro de mestre e discípulos, colegas e amigos, em São Paulo, na Tasca do Zé e da Maria me fez retroceder no tempo e chegar a 1975, 39 anos atrás, quando da seleção para o Mestrado em Filosofia da PUC/RJ. Vencidas as duas etapas da seleção, a avaliação do projeto de dissertação e prova de língua estrangeira, tinha que encarar uma entrevista com três professores do Programa. Lembro-me que tive de passar pelo crivo de Celina Junqueira e de Antonio Paim, não me recordo do nome do outro professor. Naquele momento, quando da entrevista, uma pergunta de Paim me marcou profundamente. O mestre perguntou: 'EU GOSTARIA QUE VOCÊ ME EXPLICASSE POR QUE O HUME DESPERTOU O KANT DO SONO DOGMÁTICO?' Minha resposta foi: 'não sei, faço tal afirmação porque ela sempre esteve presente nos livros que estudei e nas aulas dos meus professores, mas nunca li ou ouvi qualquer explicação sobre a afirmação'. A resposta para o desconhecimento foi uma bela aula que nunca mais esqueci. Aceita, após aprovação na seleção, para compor a turma de Mestrandos de 1976, voltei a encontrar Antonio Paim em sala de aula. Minha intenção era fazer o Mestrado em Filosofia da Ciência, mas suas aulas me levaram a optar pela área de Filosofia Brasileira e procurá-lo para pedir - e confesso que bastante temerosa -, para que ele me orientasse. Para minha satisfação, ele aceitou. Naquela jornada, a fim de suprir a minha deficiência de conhecimentos - me sentia uma formiga diante de elefantes - e não decepcioná-lo, estudava pelo menos 18 horas por dia. Entrava na PUC às sete da manhã e saía às dez da noite, quando a Biblioteca fechava. Em casa, estudava pelo menos até 2 da madrugada, mas valeu a pena! Paim se colocava a disposição e, além disso, disponibilizava livros, orientava na busca de documentos e obras que deveria estudar. Defendida a Dissertação, em 1979, voltei para Manaus, mas não perdi o contato com o Mestre, que já considerava amigo. Com a criação do Doutorado em Filosofia Luso-Brasilera, na Gama Filho, submeti para a seleção de 1982 o meu Projeto de Tese com tema sugerido por Paim, feito da seguinte forma: 'Você topa realizar um estudo sobre a Filosofia de Kant no Brasil? É um estudo denso, mas é muito importante para o pensamento brasileiro'. Eu lhe perguntei: 'O senhor acha que eu tenho competência para realizar este trabalho?'  A resposta foi: 'sim, tenho certeza que você fará um bom trabalho'. Era um estudo que ele pretendia realizar 5 anos mais tarde, mas que, acreditando na minha capacidade, o delegou a mim. Diante da demonstração de confiança,  senti-me lisonjeada e, apesar de apavorada com a dimensão e profundidade do estudo, resolvi aceitar o desafio. Enfrentei algumas dificuldades: doença, fechamento do setor de obras raras da Biblioteca Nacional, 2 filhos pequenos (Márcio com 1 ano e meio e Gisele com dois anos e oito meses), falta de empregada de confiança. Apesar disso, consegui com a orientação segura e indispensável de Paim, concluir o doutorado em três anos, tendo a honra de ter como membros da banca de defesa, além de Antonio Paim, Anna Maria Moog, Creuza Capalbo, Ricardo Vélez e Aquiles Guimarães, amigos queridos a partir de então.Naquele momento, além da dimensão de educador, descobri em Paim uma dimensão humana fantástica. Nunca passou a mão na minha cabeça, ao contrário, exigia o máximo de mim, cobrava o tempo todo, mas ajudava sempre através de discussões, de indicação de onde encontrar com pessoas ou instituições o material para o desenvolvimento do trabalho que envolvia pesquisa em obras raras. Evaristo de Moraes Filho, por intermédio de Paim, me disponibilizou a sua biblioteca particular, em sua casa, para que ali realizasse estudos em obras não encontradas em outro lugar. Paim fez muito mais! Levando em consideração que eu tinha duas crianças pequenas, fazia a minha orientação em seu apartamento no Leme, com isso, tornei-me amiga de Rita, sua mulher, e suas filhas Juliana e Augusta. Toda semana, quando ia para o encontro de orientação e não tinha com quem deixar os meus filhos, eu os levava. Juliana e Augusta ficavam com eles enquanto me era dado o privilegio de receber magníficas aulas. Paim foi fundamental para o meu desenvolvimento intelectual. Ser-lhe-ei eternamente grata. Ele será sempre o meu guru e mestre favorito!"



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