sexta-feira, 9 de agosto de 2019

PLURALISMO E RELATIVISMO – A Verdade dos Outros. Selvino Antonio Malfatti



Não restam mais dúvidas. O Brasil está infestado pelo joio da intolerância. É prática comum nas redes sociais, principalmente, nas conversas, nas trocas de ideias, na avaliação acadêmica. O diálogo sereno, a avaliação imparcial, o respeito critico, foi banido. Nos outros não há verdade. Predominam os odiadores, os aborrecedores, os “haters”, os “trolls”.
Enclausurados em nossas salas acústicas, onde ouvimos pelas redes sociais os ecos de nossos próprios sons, isto é, opiniões dos que pensam como nós, na verdade voltamos ao estágio primitivo. No centro da aldeia finca-se uma estaca e a partir dela enxerga-se o mundo. Os antropólogos, como William Graham Sumner, denominaram isto de etnocentrismo. É a atitude de quem considera o grupo, o “nós”, a ”tribo” superior ao grupo externo, o “seu”, o “outros”.  A terapia para tal doença é o “pluralismo”, que consiste em sair das câmaras de eco e ouvir a verdade dos outros.
Há, porém, um cuidado com outra armadilha: o relativismo. A diferença entre ambos – pluralismo e relativismo – consiste em que o primeiro possui um número limitado de valores humanos. Não pretende alcançar a todos, mas os reconhece  plausíveis e não se nega à crítica dos mesmos. O segundo, o relativismo, acha que tudo é possível, isto é, todos os valores de cada um são válidos. Um pluralista se apavora com o apedrejamento de mulheres adúlteras como pregam os talibãs, um relativista considera válido. (Giancarlo Bosetti «A verdade dos outros. A descoberta do pluralismo em dez histórias "(Bollati Boringhieri, páginas 198).
A questão do pluralismo e relativismo esteve subjacente ao pensamento filosófico. Ora mais visível ora velado. Pode-se exemplificar com Maquiavel, considerado o fundador do pluralismo. Ao contrastar os valores pagãos – força, justiça e coragem - e cristãos – caridade, misericórdia e sacrifício - deixou clara uma contradição aparente e fez brilhar o paradoxo. Eles são somente aparentemente contraditórios. Existem princípios válidos, ainda que em conflito entre eles, como liberdade e igualdade, clemência e justiça, amor e imparcialidade. Tudo o que decorre de uma única construção monista é sempre duvidosos.  Outro exemplo é o mito da Torre de Babel; Deus desgostou-se não da altura da torre, mas da monotonia da linguagem. Falar muitas línguas foi um presente e não um castigo.
Uma das lições mais convincentes do pluralismo nos foi deixada pelo filósofo Orígenes. Aos trinta e três anos encontrou-se em Antioquia com Giulia Namea, esposa de imperador Septínio Severo, que havia decapitado seu pai. Giulia Namea pediu conselhos a Orígenes sobre a educação de seu filho, conforme os textos sagrados. Orígenes disse-lhe que os textos sagrados não devem ser tomados literalmente e que a salvação é extensiva a todos e não somente para os cristãos.
Falamos no início deste texto sobre a problemática da intolerância que grassa em nossa sociedade. Todos concordam que é preciso estancar o ódio. Para tanto, devemos fazer como os renascentistas. Perguntar-se onde e quando começamos errar. E eles identificaram corretamente: quando entronizamos a intolerância e admitimos o monismo gnosiológico. A partir daí, em vez do pluralismo, nos guiamos pelo relativismo.  Então, corajosamente, voltaram atrás até onde haviam abandonado a tolerância e o pluralismo. Esta atitude salvou a ciência, filosofia, arte, convívio religioso. Foi o Renascimento.
Nós também temos que fazer um feedback, uma autocrítica, e retomarmos o nossa marcha na direção correta. A pergunta: o que nos desviou?   O abandono da hierarquia, o esquecimento do respeito, difusão da mentira. Por isso, é preciso voltar e retomar:
1.    A hierarquia – Com ela se consegue garantir o pluralismo e afastar o relativismo, considerar os demais como inimigos, difundir o erro.
2.    Exigir respeito – É o princípio do sistema democrático. Com isso cada um pode ter garantia da verdade.
3.    Usar as redes sociais para externar a verdade e não para haters.
4.    Antes de falar, pensar se é verdadeiro, se conveniente e se ajuda alguma coisa.

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