sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

A JUSTIÇA DA LEI. Selvino Antonio Malfatti.





 

Pilatos perguntou: “Que farei então de Jesus, que é chamado o Cristo?”. Todos responderam: “Seja crucificado!”.

A condenação de Jesus foi legal?

- Sim. Infringiu a lei judaica.

Foi justa?

- Não. Não cometeu crime algum. 


Quando uma sociedade institui o poder judiciário é para que este atue imparcialmente, não só aplicando a lei, mas suprindo suas lacunas, fazendo justiça. Justiça e lei não são a mesma coisa. A lei é uma parte da justiça. No entanto, inúmeros casos de juízes perversos e parciais surgiram na história, como os casos de:

1.   George Jeffreys – Inglaterra (século XVII), no período de Jaime II. Sua notoriedade destacou-se por julgamentos sumários, condenações pré-determinadas execuções em massa. Usava o tribunal como braço político do rei para eliminar os adversários do rei.

2.   Roland Freisler – Tribunal do Povo Nazista (Alemanha, 1934–1945). Freisler presidiu o Volksgerichtshof, tribunal criado pelo regime nazista para julgar crimes políticos. Seus julgamentos eram encenações externas, humilhações, ameaças e sentenças de morte anteriormente combinadas.

Teoricamente todo juiz deve agir com imparcialidade aplicando a lei dentro dos limites da justiça. O grande filósofo e jurista brasileiro, Miguel Reale, entende o mundo da justiça três dimensões da realidade: fato social, valor e norma. É a teoria da tridimensionalidade do direito, conhecida mundialmente. Segundo ele, o direito não pode ser compreendido apenas como norma escrita, nem apenas como fato social, nem apenas como valor; ele nasce da correlação dinâmica entre três dimensões: comportamentos, situações e necessidades reais da vida em sociedade — conflitos, práticas sociais, mudanças econômicas, costumes, transformações culturais. Nenhum fato se torna jurídico por si só. Ele só adquire relevância quando a sociedade atribui valor ao fato: justo/injusto, permitido/proibido, relevante/irrelevante. É nesta dimensão que entram princípios éticos, expectativas de  justiça e critérios de convivência. Por sua vez a norma é o resultado da interação entre fato e valor. Faz direito o que a sociedade considerou relevante e valioso. A norma é forma, estrutura e decisão: a materialização do direito.

Fala-se atualmente entregar o julgamento dos litígios sociais à inteligência artificial: IA. Seria possível?

Sim, é possível naquilo que a IA é excepcional. Em primeiro lugar seria na interpretação das normas: texto, jurisprudência e coerência. Em segundo, mapear os fatos, com as provas documentais, consolidação dos depoimentos e identificando padrões.  No entanto, no julgamento dos valores, este escapa ao lógico, pois leva em conta o histórico, a cultura e ética. Para tanto é necessário prudências, sensibilidade, compreensão e as consequências humanas da decisão.  O juiz vai além da letra fria pesando a aplicação da lei aos princípios da justiça, equidade, proporcionalidade e razoabilidade.  A dimensão do valor é irredutível a algoritmos. Não basta ser técnico, é preciso empatia para ir além da norma.

Nossos juízes? São  justos ou técnicos da lei?

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