Correu
no Brasil dos smartfones e celulares o vídeo de um empresário dono de uma das
empresas denunciadas na Lava Jato. Ele foi hostilizado num resort. Não importa
a empresa, nem o local, nem o empresário, o emblemático é o fato. Ele reflete a
indignação dos que trabalham honestamente (ou invejam os esquemas fraudulentos
de enriquecimento ilícito), mas expressa, nos dois casos, a desconfiança das
instituições. Nenhum cidadão tem que hostilizar outro no espaço social. Cabe à
justiça julgar e punir, na forma da lei, quem errou. E assegurar a aplicação da
punição. Se algo deve fazer o cidadão honesto é acompanhar e cobrar o
funcionamento da justiça. O que a operação lava jato mostra é que faz tempo que
a política perdeu seu sentido verdadeiro e descobrimos, em nosso país, um novo
caso de amor entre o políticos e o grande empresariado.
Sabe-se
que a base da moral é a consciência individual, moral é uma interdição da
consciência para fazer o mal. É sempre possível agir moralmente, mesmo em
ambientes ruins. Contudo, ambientes ruins alimentam a imoralidade e permitem
que pessoas de moral frouxa encontrem mais espaço para agir. E um exemplo de ambiente
assim é o que se instalou em nosso país: quase quarenta partidos (sem qualquer razão
real para existir ou ideologia além de sobreviver e beneficiar os seus). O espectro
ideológico poderia ser coberto por três ou quatro partidos. As maiores
democracias do mundo não fogem a isso. Essa realidade se agrava com custos
crescentes da campanha eleitoral e o uso dos meios de comunicação de massa.
Essas mídias privilegiam a performance publicitária mais que as propostas e seu
detalhamento. Some-se a isso uma população pouco escolarizada, com reduzido espírito
crítico e pequena capacidade de entender os problemas. Acrescente uma elite egoísta,
desejosa de prazer imediato e despreocupada com as consequências do que faz. Se
no dia a dia o esforço pessoal é o que conta, há certos problemas no espaço social
que se não forem resolvidos dificultam a vida de todos, dito de outro modo, não
é possível se salvar sozinho de um barco afundando e do qual não há como sair.
E assim enquanto alguns acham que se salvam em festas privadas e condomínios fechados,
a miséria e a ignorância permanecem e crescem geração após geração.
O
que a lava jato mostrou é o casamento, com juras de amor eterno: entre
políticos de carreira com o grande empresariado. As exceções existem e
confirmam a regra. O político discursa sobre o destino do povo, mas apenas quer
se manter no poder e o empresariado faz o discurso capitalista da livre
concorrência, mas não arrisca e ganha o grosso do seu dinheiro fazendo negociatas
com o Estado. Obtém recursos subsidiados e paga propina para garantir grandes
obras, em resumo, fraudam os mecanismos de controle do Estado e patrocinam os
esquemas de poder de políticos corruptos e seus comandados nas empresas
públicas. Casamento abençoado pela grande mídia que ganha fortuna com o jogo
político e a propaganda partidária e dos governos. Tudo isso num sistema mundial
que alimenta o consumo, o gozo irresponsável e o divertimento das massas.
Trata-se, enfim, de uma acomodação do patrimonialismo tradicional à nova
circunstância do mundo globalizado.
O
que se vê é que políticos e alguns grandes empresários reconstruíram as bases
do patrimonialismo tradicional, num mundo chamado de pós-moderno, em que as
circunstâncias são diferentes do capitalismo mercantil ou industrial. Refizeram
o discurso capitalista naquilo que convém a cada um. A corrupção existe em todo
o mundo, basta lembrar do que se passou na FIFA e recentemente e os casos de
corrupção denunciados na Turquia, na China, na Ucrânia, etc., mas ela não
fragiliza Estados fortes, nem os desvia de sua rota de longo prazo, porém fragiliza
os países emergentes, neles perpetua a miséria, pune os que trabalham
honestamente e piora a vida dos mais pobres.