sexta-feira, 24 de setembro de 2021

Como está a volta às aulas? Selvino Antonio Malfatti.

 


                                                    Volta às Aulas

Chegou de sopetão. De início mostrava-se inofensivo o Leviatã. De repente acionou a ceifadeira e ia botando no chão tudo o que encontrasse. Todo mundo perdido. Alguns diziam que não era nada. Seria fácil, fácil de debelar. No entanto, avançava semprer mais mortífera a fera monstruosa. Primeiramente atingia os idosos, depois os mais jovens com comorbidades, em seguida os adultos. Alastravam-se mortes por toda parte. Tentaram-se todas as estratégias, inclusive suspender as aulas presenciais. Todos passaram para o ensino remoto. 

Enquanto isso os pesquisadores trabalhavam dia e noite para conseguir a vacina. Depois de um ano, finalmente foi descoberta e a fera mortífera estava enjaulada. As medidas foram afrouxando até que decidiram permitir a volta às aulas dos estudantes.

Após um ano e meio de pavor, será que são as mesmas pessoas que voltam às salas de aula depois da pandemia? Umas tiveram que abandonar às pressas as aulas, pois o vírus estava avançando avassalador como uma larva de vulcão. Muitos voltam mais pobres por que os pais perderam o emprego, outros a casa, outros algum bem lucrativo para família. Pior, há quem volte sozinho por ter perdido um ente querido. Neste caso a volta vem acompanhada com a morte na alma. Embora não tenha sentido a dor da morte pessoalmente pressentiu sua presença rondando por perto. O medo apontou no horizonte. Alguns saltaram de crianças para adultos. O mal atingiu a todos não só pelo perigo, mas por não saber como enfrentar o perigo. Os que estavam em dificuldades econômicas, culturalmente pobres, socialmente marginais, idosos doentes. Estes caíram como folhas secas. Mas há também ricos, saudáveis, bem sucedidos, jovens vigorosos que igualmente caíram. Em síntese: caíram todos: de todas as classes, saudáveis e não saudáveis, jovens e idosos. A pandemia não foi seletiva, ao contrário, atingiu a todos.

Em que pese a vacina ter encurralado a fera a sensação de insegurança persiste e por isso o medo acompanha sempre todo mundo, até mesmo os jovens que parecem não se importar na sua algazarra.

Por isso ninguém voltará mais como era antes. Todos, de uma maneira ou outra, foram atingidos. Aquele mundo seguro, promissor e ao mesmo tempo frágil desmoronou. O antes não existe mais e o agora ainda não surgiu. Estamos soltos entre o passado que desapareceu e o presente que ainda não foi criado.

É verdade que ficamos felizes por voltar às aulas, mas onde está fulano? E este que está aí não é um perigo para mim? Ele pode me contaminar e me matar. Será então meu amigo? Colega de infortúnio? Como posso ser amigo de alguém quando o vejo dentro de mim como potencial inimigo?  O que devo fazer? Devo manter distância (a propaganda com precaução insiste nisso). A distância que devo manter dos demais se converte em o outro manter distância de mim. Onde? Na recreação, sala de aula, casas. Ficar longe, de quem, quanto? Até quando? A ordem: 

- Não toque, não se aproxime!

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