sexta-feira, 27 de maio de 2016

Ortega y Gasset e nosso tempo. José Mauricio de Carvalho - Professor do IPTAN




Acaba de ser publicado, pela Filoczar de São Paulo, Ortega y Gasset e nosso tempo. O livro é uma continuidade de nossos estudos sobre o filósofo espanhol. Em certo sentido continua o que foi proposto em Introdução à Filosofia da Razão Vital de Ortega y Gasset, publicado em 2002, pela editora Cefil, de Londrina. Não se trata de uma ampliação da temática abordada naquela ocasião, mas de uma reconstrução de aspectos fundamentais do pensamento orteguiano, a partir dos estudos mais recentes e sistemáticos feitos sobre sua obra. Desde a publicação daquele livro muitas dezenas de tese de doutoramento foram defendidas sobre o autor, surgiu a revista do Centro de Estúdios Orteguianos, que estuda exclusivamente sua obra, e uma nova edição comentada de suas Obras Completas foi publicada pela Taurus. Muitos desses estudos renovaram nossa compreensão do pensamento do filósofo.
Questões que no primeiro livro foram apresentadas como intuição e rapidamente comentadas, por exemplo a aproximação do raciovitalismo com a fenomenologia de Husserl, assunto controverso pois era negado pelo próprio filósofo, foram confirmadas com estudos mais recentes de uma nova geração de pesquisadores. Ficou bem demonstrado que Ortega conhecia apenas uma parte pequena da obra do criador da fenomenologia. Também ficou demonstrado o impacto do pensamento de Heidegger sobre a razão histórica e os livros da chamada segunda navegação. Além disso, a noção de razão vital apresentada como aprofundamento da ideia de autenticidade da vida em circunstância, isto é, dos assuntos propostos nos primeiros escritos parecem consolidadas com as últimas pesquisas sobre o autor. Ficou mais claro que os textos da década de trinta constituem uma segunda navegação, mas não propriamente uma mudança nos rumos da meditação inicial. E há muito mais novidade, os estudos sobre o tempo das massas nos permite entender melhor os dias que vivemos, ainda que muitos aspectos de nosso tempo Ortega tenha apenas vislumbrado, e há ainda a inédita aproximação com Karl Jaspers que estamos também antecipando.
O livro, portanto, é essencial para todos os interessados na obra do pensador espanhol e nos estudos de Filosofia em geral, mas destina-se a um público maior. O entendimento de que estamos num tempo de crise de valores é percebido hoje ainda mais que nos dias em que viveu Ortega e esse desvio do homem contemporâneo de crenças que guiaram as gerações anteriores, pede a compreensão da realidade humana, impregnada por questões onde a ética se torna um esforço de sentido. Esse compromisso de fidelidade do homem consigo mesmo e com o significado de sua vida é apresentado por Ortega como resposta a um tempo histórico e a uma sociedade que, sem referentes comuns, exige o extraordinário empenho de todos nós para encontrar sua missão. Missão entendida como concreta vocação que exprime o legado que somente o indivíduo é capaz de deixar para todos os homens em todos os tempos. Isto porque as escolhas que fazemos marcam não só nossa história pessoal, mas a trajetória da sociedade que vivemos.

Finalmente, o livro permite entender a Filosofia como atividade necessária e adequada a todo homem. A Filosofia é mais ou menos procurada ao longo da sua longa tradição de mais de dois mil e quinhentos anos de história. Em nossos dias refletir sobre a vida, tema essencial de Ortega, é exigência para a superação da rotina de trivialidades, de trabalhos superficiais e da luta pela sobrevivência, que geralmente ofuscam o que a vida tem de mais encantadora, desafiadora, saudável e realizadora. Não é a toa que pesquisas recentes mostram que o estudo da Filosofia melhora a inteligência das crianças e torna melhor a vida do adulto.

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