sexta-feira, 8 de março de 2019

Universidade de pesquisa, a venerável instituição do ocidente.José Mauricio de Carvalho – Academia de Letras de São João del-Rei













A universidade de pesquisa, com liberdade de pensamento e de investigação, na qual professores e estudantes se associam na criação, aplicação e transmissão do conhecimento foi uma das grandes conquistas do ocidente. Ela se consolidou como instituição fundamental associada ao destino dos povos europeus quando o modelo alemão se transportou e foi assimilado em outros países.

A universidade, como instituição, existe desde a Idade Média, mas nos tempos modernos ganhou prestígio quando ajuntou o estudo da ciência com a tradição humanista. Em nenhum lugar ela atingiu esse objetivo com tanta qualidade, profundidade e prestígio como na Alemanha. Em nenhum lugar o seu cerceamento e perseguição a amordaçou tanto quanto na Alemanha de Hitler.

Essa instituição, que compromete o professor e o aluno de forma integral e livre, é um legado dos povos civilizados. Ela necessita receber alunos bem formados nas instâncias de base para alcançar os altos objetivos da formação humanística associada à pesquisa científica. Essa instituição foi modelo enquanto teve o nobre privilégio de poder viver na liberdade, seguindo regras próprias de funcionamento e aferição de qualidade, avaliando seus docentes e estudantes segundo deveres estabelecidos e pré-acordados. Essa instituição se perdeu de si mesma quando, durante o nazismo, o governo perseguiu e afastou docentes e alunos acusados de não colaborar e de não pensar com o sistema. Essa instituição somente voltou a ter reconhecimento quando pode novamente recuperar a liberdade. Foi então que pela qualidade do ensino oferecido contribuiu com a sua parte para a continuidade da tradição humanística e científica das nações livres do ocidente, depois de liberta dos nazistas e não mais fechada em si mesma, pode a universidade alemã se mirar na Universidade no Ocidente. Nessa tradição de liberdade, o campus universitário, tornou-se uma venerável comunidade de esforços, onde docentes e estudantes, na medida de suas limitações, esforçam-se para realizar a nobre missão que deles esperam a sociedade.

Em nosso país, onde temos um sistema público e privado, atuando de forma complementar, havendo pois espaço para os dois sistemas, fica na responsabilidade do sistema público, especialmente federal e de algumas estaduais, a tarefa de levar adiante mais diretamente a tradição ocidental da universidade de pesquisa. Seus resultados podem ser avaliados pela integração que mantém com as principais universidades do mundo. Não se pode perder de vista que também no ensino essas instituições têm excelentes resultados.

Ao lembrar essa tradição e a perseguição que sofreu na Alemanha a Universidade de pesquisa, que não foi diferente de outras experiências totalitárias pelo mundo, manifesto minha indignação contra manifestações repetidas nas redes sociais que reduzem o trabalho de nossas universidades públicas a formação ideológica dos alunos, o que não somente não é verdade como esconde um fato perverso dessa mentalidade grotesca. E o grotesco é o seguinte. Não se pode defender princípios humanitários, cuidado com o planeta, respeito aos direitos humanos ou qualquer boa causa, coisas com as quais o ocidente civilizado encontra-se comprometido há décadas, sem que isso seja, de pronto, associado a ideologia e desqualificado.

Triste tempos de ignorância das massas onde essas críticas não têm fundamentação adequada, objetividade desejada e a clareza requerida. A Universidade pública brasileira é uma instituição que está longe de ser perfeita, mas está mais longe de ser uma fábrica de ideologia, que forma cidadãos míopes, imbecis e inúteis. Muito ao contrário, formam-se nela os melhores quadros de cientistas e profissionais para nossa sociedade. E ainda, alguns comprometidos não com ideologias, mas com as boas causas da humanidade. Quanto a ideologias nela há de tudo.

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