sexta-feira, 9 de agosto de 2013

CRISE E EQUILÍBRIO . Selvino Antonio Malfatti





O homem sempre usa a inteligência para entender o que acontece ao seu redor e, quiçá, prever o futuro, isto é, compreender a História. Assim foi na antiguidade com Tucídides que quis entender as leis que a rege, na Idade Média com Santo Agostinho descrevendo a presença da Providência nela, na Idade Moderna Maquiavel procurou descobrir as leis da Política que a conduz, na Idade Contemporânea Saint-Simon introduziu o ingrediente econômico e Augusto Comte desenvolve a teoria dos Três Estados. Todos eles estenderam um olhar transtemporal e supralocal.  Além destes, existem dezenas de outros. Hoje quero apenas me fixar num desses: Saint-Simon, que estudou os períodos orgânicos e as crises na sociedade.
Conforme ele num período de época orgânica as sociedades repousam sobre um conjunto de crenças e valores considerados válidos. As sociedades encontram uma justificativa para suas ações e limites comportamentais. Há, por isso, uma legitimidade. E isto traz o equilíbrio social. As pessoas encontram sua própria identidade no meio social. Os comportamentos dos outros são previsíveis, assim como as próprias ações merecem da sociedade uma aprovação. Então o mundo que rodeia as pessoas é considerado natural, isto é, é assim por que deve ser assim.
Nos momentos de crise, porém, ocorre o inverso. Cada qual acha que deveria ser diferente. Daí a desconfiança e o temor. O outro é visto como um espião, ou inimigo. A sociedade é uma prisão. As instituições são vistas como grilhões que prendem.
Se tomarmos aleatoriamente como parâmetro três componentes da convivência social – política, religião e economia – pode-se aplicá-los a cada época e descobrir onde estava assentada a normalidade ou o orgânico.
Na antiguidade as sociedades consideraram como válido as cidades-estados, politeísmo e o escravismo. Na idade Média, império, o catolicismo e o feudalismo. Na modernidade, os reinos, pluralismo cristão e o comércio. Já no período contemporâneo temos o sistema representativo, a liberdade religiosa e os primórdios da era industrial. E na atualidade?

Parece que vivemos o mais longo período e a mais aguda crise de todos os tempos,  isto por que perdemos o referencial de valores. Concretamente nada mais tem valor real. Em política ainda temos o sistema representativo, mas já não responde mais às demandas sociais. A sociedade vive a era da informática, enquanto os políticos fazem discursos vazios, para si mesmos e nem eles mesmos escutam ou levam a sério. Em religião as crenças tornaram-se um self-service que cada um escolhe o que lhe agradar mais. E em economia estamos diante de valores virtuais. São tantos bilhões, mas a moeda não existe, pois é somente um número imaginário. Vivemos um mundo virtual com a globalização da informação. Tudo é uma imagem virtual produzida a partir de números. A imagem se sobrepõe ao real. É como um brinquedo de criança: faz de conta. “Faz de conta que eu sou a mamãe, que você é papai, que a fulana é a tia...” Os valores deram lugar aos números. E não são números sagrados, como queria Pitágoras, mas criadores de imagens, geradas por números.
O Eu não existe mais, tornou-se um número ou senha. A família, um número de indivíduos convivendo no mesmo teto.  A sociedade, um número x de habitantes. Querem um exemplo? Para provar que existimos não basta nossa presença, temos que apresentar o número de identidade. O próprio amor é uma imagem formada por números.

Diante de tal crise, onde buscar o equilíbrio? Todos estamos sedentos de humanidade. Penso que seja através de um novo Renascimento, isto é, voltarmos até onde nos desviamos - nos trocamos por números - encontrar nossa identidade e a partir daí seguir. Só, então, encontraremos novamente o equilíbrio.

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