sexta-feira, 30 de março de 2018

Páscoa 2018, ainda Jesus. José Mauricio de Carvalho – Academia de Letras de São João del-Rei



A comemoração de datas significativas é uma interessante estratégia humana de repensar a vida e seus significados. Sendo histórica a consciência humana, ela renova e aprofunda o entendimento dos fatos vividos quando a eles volta. Sendo histórica a própria vida, torna-se possível rever explicações e renovar convicções. Como celebração cristã, a festa da Páscoa é o centro da fé, pois se Cristo não ressuscitou é vã nossa fé (1 Cor. 15, 14). A recordação da morte de Jesus anuncia sua ressurreição e a lembrança de sua morte e ressurreição ressignificam fatos que não foram compreendidos enquanto ele vivia: a palavra proferida, o batismo e o enfrentamento do mal.
Este último aspecto é oportunidade para comentar bobagens que ultimamente povoaram as redes sociais. Depois do lamentável assassinato da vereadora carioca Marielle Franco e do seu motorista Anderson Gomes, a mais idiota geração de direita que esse país já produziu, decidiu denegrir a imagem da moça. Veicularam que ela mereceu morrer porque defendia bandidos e marginais, dos quais acabou vítima. Ao fato respondeu a não menos dotada parcela da esquerda brasileira dizendo que igualmente não se devia lamentar a morte de Jesus, pois Ele também defendia bandidos e prostitutas. Nunca imaginei que ouviria um diálogo desse nível nas redes sociais, mais sua existência não pode ficar sem ser comentada.
Um comentário que começa com a constatação de que o tempo das massas ignorantes identificadas pelo filósofo espanhol José Ortega y Gasset, constituída por homens cujo conhecimento não estava à altura do seu tempo, produziu outra ou outras gerações igualmente ruins, provavelmente piores. A triste morte da vereadora carioca foi resultado da soma de corrupção policial, desmando político, descontrole público e injustiça social. O Rio de Janeiro, uma unidade do Estado Brasileiro, perdeu o controle da vida social, permitindo uma sequência de fatos desastrosos (assassinatos, furtos, roubos, violência crescente, tráfico de drogas, etc.). Essa realidade se implanta em sociedades submetidas a sérias catástrofes. Algo semelhante ocorreu depois do terremoto do Haiti, quando o Estado Nacional perdeu o controle da sociedade. Retomar esse controle é o que se tenta hoje com a intervenção federal no Rio. Porém, a situação de calamidade do Rio é difícil de ser enfrentada porque além da desorganização social há quadrilhas armadas que funcionam como poder paralelo. A vereadora foi vítima desse estado lamentável de coisas. Quando o crime atinge um agente do Estado como ocorreu com Marielle é sinal de que o descontrole chegou a um ponto gravíssimo.
Quanto a Jesus, a parte de haver sofrido um julgamento injusto, do qual nos tornamos cúmplices com nossas injustiças, nunca pactuou com o mal. No seu julgamento enfrentou líderes religiosos que reduziram a fé num instrumento de poder; autoridades civis que abdicaram da justiça por medo e o povo que testemunhou a injustiça por inércia. Essas coisas são próprias de quem é incapaz de viver o verdadeiro amor de Deus. A incapacidade de vencer o mal é própria do homem. É o que nunca faltou em Cristo, coragem e força para enfrentá-lo. Se Ele aceitou Paulo de Tarso, assassino de Estevão; Agostinho de Hipona, egoísta, ambicioso e libidinoso e Mateus, corrupto cobrador de impostos, não apadrinhou esses erros. Os perdoou porque eles passaram a lutar contra o mal, neles mesmos e no mundo.
Á parte do significado salvífico do sacrifício de Jesus, sua morte foi um decisivo passo no enfrentamento do mal de um modo que não somos capazes de fazer, Jesus é o que de melhor podemos desejar ser. E ao reaparecer, depois da horrorosa morte, para um grande número de testemunhas, Ele realizou o que nenhum homem conseguiu. Ele voltou da morte. Por isso, sua ressureição trouxe esperança e um significado para viver que somente Deus pode oferecer.

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