sábado, 28 de janeiro de 2023

A HERANÇA PÓSTUMA DE BENTO XVI. Selvino Antonio Malfatti

 





Há poucos dias o mundo foi tomado de comoção pelo falecimento do papa emérito Bento XVI. Todo mundo esperava e sabia que ia acontecer uma hora ou outra, como o falecimento de um ente querido à beira da morte. Mas a emoção é inevitável.

Bento de XVI, além da graça da santidade, ele era respeitado pelo seu humanismo, filosofia, teologia, antropologia e outras especialidades científicas. O mundo sabia que nele estava depositada a cultura cristã acumulada de séculos. E por isso que, quando viu a morte colhê-lo, ficou literalmente órfão. Aos órfãos deixou uma pequena herança póstuma: uma escatologia do cristianismo. Isso para que não sintamos medo. O não sentir medo é recorrente na teologia da Igreja: Nada menos do que 366 vezes é repetido: "Não temas", na Bíblia. Não temer o quê?

1.   Pecado

Se você fez algo errado e sentiu-se culpado e o remorso o acompanha dia e noite martelando na consciência. Liberte-se pela confissão. Após a confissão sente-se confortado, leve e feliz por entregar-se a Cristo. Justamente porque o pecado separa a pessoa de Deus. Para libertar-se do pecado é preciso arrepender-se e voltar novamente a Deus. Por  isso, não é preciso ter medo do pecado mas fazer o que Deus pede.       

2.    Raiva

Às vezes outras pessoas podem, sem ser por maldade, espalhar inverdades a seu respeito. Isto poderá provocar em ti uma raiva. Ao entregar a Deus Ele o ajudará a vencer. Por isso, não sinta medo da raiva, mas aplique o remédio certo para vencê-la.

3.   O medo

Não temer o medo. Quando o sentires lembre-se do que aconteceu com os apóstolos e o Senhor. Os apóstolos sentiam medo do mar e o mestre mostrou-lhe que junto com ele não precisava ter medo. O medo é um estímulo aversivo que provoca um desejo de luta ou fuga. Quem confia em Deus sabe que não precisa ter medo. Basta pedir a ajuda de Deus.

4.   Dor

Se sentires tristeza por ver os pais se separarem, confia no senhor, pois a reconciliação deles trará muito alegria para ti, Não deve temer o futuro, pois Deus pode provocar-lhe a reconciliação e a alegria virá novamente para ti.

A dor, que pode ser física ou psíquica, também pode ser ajudada fisicamente ou espiritualmente. A dor física pode ser aliviada pela medicina e a espiritual com o auxílio de Deus. Por isso, seja confiante em Deus e não tenha medo.

 

Bento XVI contrapõe o “medo” ao amor e confiança. Assim como os filhos podem temer o pai ou amá-lo, da mesma forma podemos ter uma relação temerosa com o pai ou amável com o "Abbá! Pai!"

Na oração que o mestre nos ensinou, guardada desde o início do cristianismo, a Igreja escolheu : “seja feita a tua vontade”.

E é precisamente o tratamento que os cristãos dão a Deus que afasta deles todo medo. Como uma criança que está nos braços do pai nada teme.

 

Como homenagem póstuma publicamos, em anexo, um texto extraído do livro: O que é o Cristianismo. «Che cos’è il cristianesimo» (Mondadori): il suo testamento spirituale.

“ Uma expressão essencial da relação com os mortos é, em todas as religiões tribais, o culto aos ancestrais, visto principalmente no passado em oposição à visão cristã da vida e da morte. Horst Bürkle propôs uma nova apropriação e representação do culto aos ancestrais que me parece digna de consideração. Ele mostra que o individualismo que se desenvolveu no Ocidente e representa a mais forte resistência ao culto dos ancestrais é, na realidade, também oposto à imagem cristã do homem que se vê protegido no misterioso corpo de Cristo.

 

O vínculo do homem com Cristo não é apenas um relacionamento eu-você, mas cria um novo nós. A comunhão com Jesus Cristo introduz-nos no corpo de Cristo, isto é, na grande comunidade de todos os que pertencem ao Senhor e, portanto, atravessa também a fronteira entre a morte e a vida. Nesse sentido, a comunhão com aqueles que nos precederam é parte essencial do ser cristão. Permite-nos encontrar formas de comunhão com os mortos, que talvez na África se apresentem de forma diferente da Europa, mas em todo o caso permite-nos fazer uma transformação significativa do culto dos antepassados.

 

Agora, porém, surge a questão de como a crença em um Deus pode superar o mundo dos deuses. Verbite Wilhelm Schmidt argumentou que a crença no Deus único está na origem da história da religião e foi progressivamente mais e mais ofuscada pelas múltiplas divindades, até que foi capaz de suprimir os deuses mais uma vez. Ele mesmo finalmente admitiu que tal desenvolvimento não pode ser provado.

 

Em vez disso, de alguma forma sempre se soube que os deuses não são simplesmente o plural de Deus, Deus é um Deus no singular. Ele existe apenas na unidade. A pluralidade de deuses se move para outro nível. De fato, o mundo em suas diversas esferas é regido por divindades que só podem dominar uma parte. (…)

 

Ao longo da história das religiões, Deus foi considerado como um monarca que tem poder sobre tudo, mas não o exerce. O único Deus verdadeiro não precisa de adoração, porque ele não ameaça ninguém e não precisa da ajuda de ninguém. A bondade e o poder do único Deus verdadeiro condicionam sua insignificância ao mesmo tempo. Ele não precisa de nós e o homem pensa que não precisa dele.

 

Com a proliferação da crença nos deuses, cresceu o desejo de que o verdadeiro Deus pudesse libertar o homem do regime de medo no qual a crença nos deuses se desenvolveu amplamente. Segundo a crença cristã, exatamente isso havia acontecido com Jesus: o único Deus entra na história das religiões e depõe os deuses. Acima de tudo, Henri de Lubac demonstrou que o cristianismo era percebido como uma libertação do medo em que o poder dos deuses enredara os homens. Afinal, o poderoso mundo dos deuses desmoronou porque o único Deus entrou em cena e acabou com seu poder.

 

Tentei descrever esse evento um pouco mais de perto na obra coletiva Gott in Welt, publicada por ocasião do sexagésimo aniversário de Karl Rahner, e pude estabelecer que existem duas maneiras de abandonar a fé nos deuses. Primeiro as religiões monoteístas originárias da raiz de Abraão, nas quais o único Deus como pessoa determina o mundo inteiro. Ao lado deles, há uma segunda saída, ou seja, as religiões místicas com o budismo Hinayana como forma central. Aqui não há um Deus pessoal, mas mesmo o Deus único se dissolve, torna-se evanescente. O caminho do Buda tende para a aniquilação.

 

Na realidade, essa forma severa de dissolução mística de todas as figuras individuais não se impôs, mas, em última análise, sempre permaneceu como uma representação final e alcançou um poderoso efeito atrativo precisamente nas culturas outrora cristãs da Europa. Na esfera lingüística alemã encontrou expressão na frase atribuída a Karl Rahner: "O cristão de amanhã será um místico, ou não existirá mais". Aparentemente, isso visa uma interiorização e um aprofundamento interior da fé. (…) Para muitos, ao contrário, apenas esconde o programa de apresentar todas as formas concretas de fé como secundárias para chegar, em última análise, a uma devoção impessoal, tal como Luise Rinser indica como a forma superior de ser cristão que ela conseguiu entretanto.

 

A escritora alemã me explicou pessoalmente que o objetivo de publicar a troca de cartas com Karl Rahner era demonstrar que ela era mística e que a longa jornada espiritual que fizera com Rahner resultou finalmente na explicação mística do cristianismo. Não ficou claro para mim até que ponto Luise Rinser queria envolver Rahner na transformação do cristianismo em uma religião mística. Em todo caso, ele queria oferecer uma explicação para a famosa frase de Rahner como uma abertura para o futuro.(Tradução realizada mecanicamente pelo Google e revisada pelo autor do Blog Reflexão).

 

“Un’espressione essenziale del rapporto con i morti è in tutte le religioni tribali il culto degli antenati, che perlopiù venne considerato in passato in opposizione con la visione cristiana della vita e della morte. Horst Bürkle ha proposto un’appropriazione e una rappresentazione nuova del culto degli antenati che a me sembra degna di considerazione. Egli mostra che l’individualismo che si è sviluppato in Occidente e rappresenta la più forte resistenza nei confronti del culto degli antenati si contrappone, in realtà, anche all’immagine cristiana dell’uomo che ci vede protetti nel misterioso corpo di Cristo.

 

Il legame dell’uomo con Cristo non è solo un rapporto io-tu, ma crea un nuovo noi. La comunione con Gesù Cristo ci introduce nel corpo di Cristo, vale a dire nella grande comunità di tutti quelli che appartengono al Signore e oltrepassa perciò anche il confine tra morte e vita. In questo senso la comunione con quanti ci hanno preceduto è parte essenziale dell’essere cristiano. Ci permette di trovare forme di comunione con i morti, che forse in Africa si presentano diversamente dall’Europa, ma in ogni caso ci consentono di operare una trasformazione ricca di senso del culto degli antenati.

 

Ora, però, si pone la questione di come la fede in un unico Dio possa superare il mondo degli dèi. Il verbita Wilhelm Schmidt ha sostenuto la tesi che la fede nell’unico Dio si pone all’origine della storia della religione e venne progressivamente sempre più oscurata dalle molteplici divinità, finché fu in grado di sopprimere ancora una volta gli dèi. Egli stesso ha alla fine ammesso che un tale sviluppo non può essere dimostrato.

 

Piuttosto, in qualche modo si sapeva sempre che gli dèi non sono semplicemente il plurale di Dio. Dio è un Dio al singolare. Egli esiste solamente nell’unità. La pluralità degli dèi si muove a un altro livello. Di fatto il mondo nei suoi diversi ambiti è retto da divinità che possono dominare solo su una parte. (…)

 

Nell’estensione della storia delle religioni Dio è stato considerato come un monarca che ha sì potere su tutto, ma non lo esercita. L’unico vero Dio non ha bisogno di culto, perché non minaccia nessuno e non ha bisogno dell’aiuto di nessuno. La bontà e la potenza dell’unico vero Dio condizionano nello stesso tempo la sua insignificanza. Non ha bisogno di noi e l’uomo crede di non aver bisogno di lui.

 

Con la proliferazione della fede negli dèi crebbe la nostalgia che il vero Dio potesse liberare l’uomo dal regime di paura nel quale si era ampiamente sviluppata la fede negli dèi. Secondo la convinzione dei cristiani, con Gesù era successo proprio questo: l’unico Dio entra nella storia delle religioni e depone gli dèi. Soprattutto Henri de Lubac ha dimostrato che il cristianesimo venne percepito come liberazione dalla paura nella quale la potenza degli dèi aveva imbrigliato gli uomini. In fondo il possente mondo degli dèi crollò perché entrò in scena l’unico Dio e pose termine alla loro potenza.

 

Io ho cercato di descrivere un po’ più da vicino questo evento nell’opera collettanea Gott in Welt pubblicata in occasione dei sessant’anni di Karl Rahner, e ho potuto stabilire che vi sono due vie d’uscita dalla fede negli dèi. Dapprima le religioni monoteiste originate dalla radice di Abramo, nelle quali l’unico Dio come persona determina il mondo intero. Accanto a queste vi è una seconda uscita, vale a dire le religioni mistiche con il buddismo Hinayana come forma centrale. Qui non vi è alcun unico Dio personale, bensì anche l’unico Dio viene dissolto, diventa evanescente. La via del Buddha tende all’annichilimento.

 

Nella realtà questa forma severa di dissolvimento mistico di tutte le singole figure non si è imposta, ultimamente però è rimasta sempre come rappresentazione finale e ha raggiunto una potente efficacia attrattiva proprio nelle culture d’Europa una volta cristiane. Nell’ambito linguistico tedesco ha trovato un’espressione nella frase attribuita a Karl Rahner: «Il cristiano di domani sarà un mistico, oppure non esisterà più». In apparenza questo mira a un’interiorizzazione e a un approfondimento interiore della fede. (…) Per molti, invece, nasconde solo il programma di presentare come secondarie tutte le forme concrete della fede per giungere ultimamente a una devozionalità impersonale, come quella che Luise Rinser indica come la superiore forma dell’esser cristiani nel frattempo da lei conseguita.

 

La scrittrice tedesca mi ha personalmente spiegato che lo scopo della pubblicazione dello scambio epistolare con Karl Rahner era quello di dimostrare che lei era una mistica e che il lungo percorso spirituale da lei compiuto con Rahner sfociava da ultimo nella spiegazione mistica del cristianesimo. Non mi è divenuto chiaro fino a che punto Luise Rinser volesse coinvolgere Rahner nella trasformazione del cristianesimo in una religione mistica. In ogni caso voleva offrire una spiegazione della famosa frase di Rahner come apertura verso il futuro.”( Che cos’è il cristianesimo» (Mondadori): il suo testamento spirituale”

 


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