sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Liu Xiabo e a liberdade. José Maurício de Carvalho.




Ao chinês Liu Xiabo foi concedido o Prêmio Nobel da Paz no ano de 2010. Ao proceder a escolha de Liu Xiabo o Comitê Norueguês aceitou polemizar com a tradição despótica do oriente. O governo chinês não gostou da indicação e pediu explicações ao governo da Noruega. O agraciado é pouco conhecido no Brasil, mas ganhou notoriedade desde que fez greve de fome pela libertação dos estudantes chineses encantoados pelo exército vermelho no famoso cerco militar da Praça da Paz Celestial. A democracia acabou não vindo na China, mas as reformas econômicas no sentido de respeito ao livre mercado trouxeram um desenvolvimento econômico há muito desconhecido da China.
Livre mercado é bom, mas só ele não assegura o desenvolvimento humano. A experiência dos últimos duzentos mostra que livre mercado só traz benefícios para toda a sociedade quando se associa com moral social negociada, estado de direito, democracia formal, partidos fortes com definição programática, liberdade religiosa e estado laico. Capitalismo sem o restante ajuda a enriquecer uma pequena parte da sociedade e deixa o restante na pobreza. Aliás, para entender isto não é preciso conhecer a China e sua história, sabemos por experiência própria o que é um país onde o desenvolvimento beneficia principalmente uma pequena parte da população, deixando a maioria fora dos benefícios da riqueza. Felizmente a Nova República de Tancredo começou a dar frutos e o Governo do Presidente Lula conseguiu melhorar a vida de milhões de brasileiros mais pobres.
A liberdade política é expressão da liberdade pessoal, já nos ensinava Tancredo Neves. Para entendermos o sentido disto é importante lembrar os ensinamentos do filósofo alemão Edmund Husserl. Ele mostra que a consciência é criadora, permite não apenas pensar o mundo de uma forma objetiva e compartilhada, mas fazê-lo aparecer como experiência de um eu singular. O mundo surge na consciência como criação do existente e assim é único. Entende Husserl que a consciência é afetada pelo contato com os objetos à sua volta, eles entram em cada pessoa e passam a fazer parte da vida de um modo particular. Se nós somos únicos pela forma como incorporamos o que está à nossa volta, precisamos de um sistema político que seja também expressão disto.
Deixando de lado o valor da liberdade política e retornando à decisão dos organizadores do Nobel, eles chamaram atenção do mundo para a luta de um docente universitário de 54 anos de idade que há mais de vinte anos luta pelos direitos civis na China. Professor de literatura, poeta e orador, ele foi afastado da cátedra universitária e preso três vezes nos últimos vinte anos. Atualmente cumpre pena de 11 anos de prisão por denunciar o desrespeito do governo chinês aos direitos humanos. Encontra-se preso a quinhentos quilômetros de Pequim por um regime que embora tenha iniciado a transição para uma sociedade livre conserva uma tradição despótica mais que secular. O despotismo chinês encontrou no totalitarismo comunista uma expressão contemporânea quando consideramos a história milenar do país. Entretanto o comunismo, hoje em dia, é passado para a maioria dos países, pois desde a queda do muro de Berlin e a dissolução da União Soviética, fora Cuba e alguns partidos políticos brasileiros (Leia-se PCB, PSOL, PSTU), ninguém aposta mais em revolução comunista e estado totalitário.  

O professor Liu Xiabo tomou ciência do prêmio pela mulher que o foi visitar, mas não poderá deixar a prisão para buscar o diploma, a medalha e o dinheiro do prêmio. Não sabemos se sua mulher Liu Xia poderá representá-lo, pois também ela se encontra em prisão domiciliar desde 2008, somente saindo de casa para visitar o marido e sempre acompanhada da guarda vermelha. Que venha, pois, a liberdade para Liu Xiabo.

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