sexta-feira, 8 de maio de 2020

Nação e Heróis. José Mauricio de Carvalho - Academia de Letras de São João del-Rei



Tempos extremos suscitam o heroísmo. Infelizmente também promove o contrário. Viktor Frankl dizia que nas situações extremas da vida as escolhas separam os santos e os porcos. E nós precisamos demais dos primeiros.
Nesses dias em que o mundo enfrenta uma pandemia, heróis são fundamentais. Quanto mais difícil o momento, mais precisamos deles. Eles estão agora entre profissionais de saúde, trabalhadores que precisam manter serviços essenciais e pessoas que apoiam os mais vulneráveis.
Fui educado numa limitada visão de democracia que ensinava que um povo não necessita de heróis. Foram precisos anos de experiência e um genial pensador espanhol chamado Ortega y Gasset para mostrar que não é assim. Uma nação necessita de heróis para guiá-la, lidera-la e mantê-la de pé. A democracia, é uma forma de organização política e é ótima quando não impede a liberdade e os talentos individuais. Em resumo, uma democracia que respeita a liberdade, para não adoecer, não pode ir além da organização política, não pode alcançar, disse Ortega (Democracia Morbosa, Obras Completas, v. II, 1988, p. 135): “a religião e a arte, (...) o pensamento e gesto, (...) o coração e os costumes (sendo nesses casos) a mais perigosa doença que pode padecer uma sociedade.” Poucas coisas são piores para um povo que, em momentos de crise, possuir uma legião de porcos, como disse Frankl.
A lição de Ortega sobre democracia, somada ao que ele escreveu em dois livros clássicos; España Invertebrada (1921) e A Rebelião das Massas (1930), mostra que pessoas notáveis são chamadas a liderar a sociedade. Ninguém lidera em todas as áreas, apenas alguns se destacam em cada uma: o artista nas criações estéticas, o prático nas atividades tecnológicas, o gênio nas criações científicas e filosóficas, o ético nos movimentos sociais e também o santo. Essas são formas diferentes de ser herói. Viktor Frankl relata em Em busca de Deus e questionamentos sobre o sentido a atuação de médicos na Segunda Guerra (2014, p. 90): “minha tarefa é testemunhar diante de vocês como médicos vienenses passaram fome e morreram; dar testemunho de verdadeiros médicos que viveram como médicos (...) que não podiam ver os outros sofrer, não podiam deixar sofrer”. Esses médicos foram heróis.
O mês de abril é um tempo bom para falar de heroísmo, não apenas porque se recorda a morte de Tiradentes, que deu a vida pela liberdade do país, mas porque se comemora a vitória da FEB em Montese, que, se não foi significativa como a de Fornovo, foi marcada pela bravura e onde, em pouco tempo, morreram quase quinhentos brasileiros. Veio depois da Batalha de Monte Castelo, que se arrastou por três longos meses e onde morreram mil militares. E ocorreu antes da de Fornovo ocasião em que soldados da FEB aprisionaram a 148ª Divisão Alemã e parte de uma Divisão Panzer no total de quase 15 mil soldados alemães. Esses brasileiros morreram, como tantos outros já haviam feito em nossa história, para termos uma nação forte.
Que nosso povo veja surgir muitos heróis nesses dias e que eles sejam, para os outros brasileiros, exemplo e inspiração.


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