sexta-feira, 6 de outubro de 2017

SOCIEDADE QUE SE AUTO INSPIRA E INDIVÍDUOS ATOMIZADOS. Selvino Antonio Malfatti.





O historiador alemão, Jacob Burckhardt, no estudo das civilizações antigas constatou um fenômeno genuinamente peculiar com a cidade-estado de Esparta: o poderio de Esparta surgiu de si mesma, por autoafirmação, pelo seu gênio interno de submeter e exterminar os povos submetidos como um fim em si mesmo. Era uma sociedade que emergia de sua própria energia, um pathos peculiar que a fazia diferente das demais. Haja vista a vizinha Atenas que desenvolvia uma democracia, cultivava a liberdade e prezava a igualdade, culminando c om a democracia liberal do século XIX.
O germe de Esparta não morreu nem se perdeu na história. Ressurgiu com toda força no decorrer do século XIX, e ainda está em curso. Apresenta-se como um movimento contra tudo que pudesse evocar o “religioso”. Pode ser caracterizada como uma sociedade laica, sem necessidade de ditames externos, para se tornar ela mesma um quadro de referência para qualquer significação. Na sua fisiologia e estrutura as explicações e razões se deveriam buscar no interior de si mesma.
O modo de ser político, econômico, jurídico assume formas as mais divergentes. Na economia como capitalismo ou socialismo; na política, democráticas ou ditatoriais; jurídico, como protecionistas, liberais ou militares. Em qualquer circunstância sempre devendo ser consideradas como variantes da própria sociedade. Parece que a sociedade foi amputada da capacidade de ver mais longe do que a si mesma. A capacidade de buscar referências externas foi extirpada. Colocou-se numa posição de viver a cima do bem e do mal.
Apesar de estender-se a todos os regimes esta maneira de viver em sociedade é na democracia que encontra o melhor solo para germinar. Nesta forma de governo, o sumo da felicidade consiste em viver e favorecer a máxima liberdade. Na democracia é possível o pensar, decidir e proceder que emergem da sociedade em si mesma. Todos os modos de pensar são legítimos, exceto aquele que pretende revogar a democracia. Sinteticamente Thomas Jefferson definiu como: o preço da democracia é a eterna vigilância. Qualquer cochilo pode acarretar-lhe a morte. Um exemplo histórico foi o que aconteceu na Alemanha em janeiro de 1933, Hitler, que convenceu de ele e somente ele poderia salvar a Alemanha. Foi o golpe mortal contra a democracia alemã. “Viva a Alemanha, o povo e o Reich!”. Engenhosamente Hitler introduz um elemento fora da sociedade, transformado em teologia, que se torna política, a qual se torna totalitária.
Mas este processo político, como modelo, vai se estendendo a todos os níveis. Sem o temor do mistério a sociedade se recusa a aceitar a realidade e a proposta se torna apenas acadêmica. Não encontra palavras para definir, conforme regras consagradas, a sociedade envereda para a superstição nova e insinuante: a superstição de si mesma, difícil de perceber e dissolver, pois qualquer tentativa é considerada preconceituosa. Quem se opuser é in limine escrachado e marginalizado.
Os piores desastres aconteceram e acontecem quando a sociedade secular resolve tornar-se orgânica, aspiração recorrente de toda sociedade que desenvolve o culto de si mesma, calcada sobre as melhores intenções. Sempre tendo como pano de fundo a Perda do Paraíso e modernamente a perda da bondade de Rousseau, ou a concórdia de Marx, Saint- Simon, Hitler e Lenin. Visionários do Orgânico, do belo. Para eles a atomização da sociedade é considerada uma maldição. Ninguém se dá conta que é justamente nisso que consiste a autodefesa dos males mais graves. Nesta sociedade atomizada não é preciso que a polícia secreta bata a porta às quatro da manhã, pois ela mimetiza sua segurança.
Atualmente esta tendência evolui no sentido de a individualidade assumir as mesmas características do orgânico.
Como uma tendência antípoda do orgânico e igualmente contrário à democracia, e dentro dela, está se manifestando aqui e acolá uma postura anárquica, isto é, uma reação negativa não só externa à sociedade como o que emana da sociedade. É uma tendência de atomização total da sociedade sem nenhum vínculo de coesão. Tudo o que vier fora de si próprio, do indivíduo é condenado. É um movimento novo, ainda não individuado totalmente. As palavras mais comuns para mostrar a repulsa de tais indivíduos à postura do bom senso é “fascista”, “moralista”, “escroto”, “reacionário”, conservador, asqueroso etc. Ninguém pode opinar em questões de gênero,  sexualidade, arte, política, educação, drogas. Até mesmo a pedofilia é defendida. Dentre os ativistas mais atuantes está o grupo LGBT. Os valores da democracia, para estes indivíduos, são disfarces de dominação .  Causa estranheza que tais atitudes não floresçam na Rússia, China, Cuba, Coreia do Norte, Indonésia mas em sociedades livres. São sofistas da época atual.
Algumas questões podem ser postas:
1.    Mudanças são necessárias, mas será a partir de terra arrasada?
2.    O movimento inclui o desfrute ao máximo tudo o que se apresenta.: o próprio corpo, meio ambiente, família, sociedade, sem limites. E as gerações futuras?
3.    Os movimentos que tentam conter tal onda (sic?) conseguirão freá-lo pacificamente? Religiões, Grupos organizados, poder judiciário?
4.    Disso advirá uma nova ordem?

Uma assistente social que atende adolescentes encaminhados pela justiça dá um depoimento sobre o estado anárquico e as perspectivas de recuperação. Diz ela que observa, a partir dos atendimentos, uma sociedade profundamente perdida, esperando que surja alguém que diga qual o caminho?
Diz que seu trabalho é avaliar as situações, orientar mostrando as possibilidades de mudanças, que se ganha ou se perde, mas cada um precisa e deve saber de suas carências e dificuldades. Vê o quando ficam frustradas esperando algo magico, como uma pílula que resolvesse e extirpasse toda dor ou sofrimento.
A salvação para uma sociedade não se perder, seria o fortalecimento da família, onde se transmite valores, regras e o respeito ao outro.
As famílias estão minúsculas, os irmãos aprendiam uns com os outros, principalmente dividir companheirismo, livros, brincadeiras etc
Mas as famílias estão deixando suas crianças nas creches, terceirizadas e sendo cuidadas por pessoas que não formam vínculos, um bebê, sem o aconchego, será um adulto inseguro o emocionalmente,  fragilizado.  Hoje existe um movimento para as escolas prepararem as crianças para lidar com as perdas e frustações, assim serão adultos preparados para viver em sociedade.
O desfrute onde o ser que se consome no vazio de sua existência, numa procura incessante do prazer, nada mais é que o vazio da vida. Vejo uma sociedade sem regras, sem autoridade, sem leis que devem ser respeitadas. Isto possibilitaria a formação de cidadãos cientes de seus deveres, conhecedores de seus direitos, mas com uma grande consciência de sociedade participativa e honesta consigo mesma. (I.R.S.)


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