sexta-feira, 25 de outubro de 2013

A Justiça e a Ética. Selvino Antonio Malfatti.




















A noção de justiça para a ética é extremamente complexa. Por isso, não é fácil indicar seus aspectos fundamentais.  A primeira observação que podemos verificar é que ela preside a todas as relações intersubjetivas: jurídicas, sociais, políticas e até mesmo teológicas.  Se nos perguntarmos quais os critérios para estabelecermos os parâmetros da justiça constatamos que salta à vista a diversidade de interpretações desde a lei do mais forte até oferecer a outra face. No entanto, as diversas interpretações não significam um relativismo axiológico em relação à justiça. O que acontece são experiências concretas, históricas de justiça de cada uma. Se nos abstivermos desses momentos vividos particularmente, verificamos que ela possui um conteúdo universal.
A Justiça está no âmago da ética. Aquela pressupõe uma igualdade originária entre os seres humanos. A função da justiça não é apenas para dirimir conflitos, mas ser um farol que aponta para as virtudes éticas e concretizar a convivência intersubjetiva pacífica.
A definição dada por Aristóteles é perfeita. Haveria dois vetores de justiça. Um, horizontal, estabelece as relações dos indivíduos entre si na troca de bens e serviços e outro, vertical, estabelece a distribuição dos méritos, evidentemente levado adiante por critérios pré-estabelecidos.
A primeira revela algo extraordinário. A justiça deve ser exercida num ambiente de liberdade, pois só assim todos podem ser considerados iguais. Supõe, portanto, relações de pessoas livres que contratam livremente entre si. A condição primeira para que haja justiça é que ocorra num ambiente de liberdade. Senão, vejamos o inverso: como pode haver justiça, isto é, a permuta entre bens e serviços se uma das partes está privada da liberdade. A que está privada da liberdade será necessariamente explorada, pois a outra fará as regras que lhe interessar. 

Mas como fica a justiça no seio de uma sociedade livre e individualista? Há dois instrumentos para se chegar a ela: os pactos – podendo ser ocasionais, tácitos e os contratos – relação bilateral da distribuição de bens e serviços. Isto por que o pressuposto ôntico do ser humano é da igualdade metafísica e desigualdade social, ambas decorrentes da racionalidade e liberdade. No entanto, embora os pactos e contratos sejam os únicos meios numa sociedade individualista para se atingir a justiça, não se pode dizer que sejam uma garantia de cem por cento. Os egoísmos e interesses podem atropelá-los e consequentemente vão afetar a justiça. Além disso, e muito mais grave, é o poder político querer uniformizar os interesses, tornando-os todos igualitários. A justiça tem por fim conciliar uma igualdade originária com uma efetiva desigualdade. Por isso, por paradoxal que seja, sem desigualdade, não haverá justiça, por que esta supõe espaço para as diferenças.

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