sexta-feira, 13 de setembro de 2024

ALCIDE DE GASPERI -PAI DA EUROPA. SELVINO ANTONIO MALFATTI

 

                                                              ALCIDE DE GASPERI



Natural da província de Trento, Itália, foi o mais importante político da Itália do pós-guerra. No contexto europeu os “Pais da Europa” são Alcide de Gasperi, Konrad Adenauer, Robert Schuman e Jean Monnet.

De Gasperi sempre esteve ligado à Igreja Católica. Inimigo do regime fascista foi preso e condenado. Mas graças à intervenção do Papa Pio XI foi libertado. Para enfrentar o fascismo fundou o Partido da Democracia Cristã. Este partido se disseminou para a maioria dos países europeus e conduziu os destinos da Europa por meio século.

O período “degasperiano”, desde a fundação da Democracia Cristã até 1953, é um período particularmente desafiador para a Democracia Cristã . Primeiramente é um partido novo, com alguns participantes com experiência no extinto Partido Popular como Alcide De Gasperi e Luigi Sturzo. Em segundo lugar, não foi um partido que emergiu da sociedade italiana, mas em boa parte criado artificialmente em laboratório, mormente no Vaticano. Guindado ao governo deveria dar conta de algumas tarefas nada fáceis para um pós-guerra, no qual a Itália não somente foi perdedora, como ficou falida economicamente. Mas, a maior de todas as missões era de conter fascismo de direita, e o comunismo de esquerda, o segundo partido mais forte da Itália. Neste preciso período, a Democracia Cristã será atacada pelos amigos e inimigos, pelos seus apoiadores e opositores, precisamente quando estava se organizando.

Neste primeiro período predomina a figura carismática De Gasperi. É considerado como uma autêntica liderança: forte, decidido, de marcante influência pessoal. Faz-se sentir no enfrentamento dos problemas cruciais e na organização do novo partido. Sob sua inspiração a Democracia Cristã amadureceu, ou feita amadurecer, num ambiente eclesiástico e no laicato católico. Foi criada com o objetivo de contrapor-se às forças laicizantes e comunistas, para tutelar, defender e promover os interesses da Igreja e dos católicos na fase de reconstrução, reduzindo ao mínimo os inconvenientes decorrentes dos compromissos da Igreja com o Fascismo. Mas na prática significou muito mais que isto, como por exemplo, a incorporação dos eleitores católicos num regime democrático.

Nesta fase tornava-se crucial conseguir os máximos de recursos organizativos com o fito de conter a esquerda, máxime os comunistas. Passados os primeiros momentos, o partido deu  mostras de  estar atingindo os objetivos. Para o momento subsequente, era preciso continuar contar com o apoio da organização católica e por outro, defender a democracia republicana. O primeiro era tanto mais importante, pois em alguns setores da Igreja se pensava em criar outro partido. Isto se tornava crucial para o partido da Democracia Cristã. O apoio eleitoral da Democracia Cristã, neste período estava dependente do empenho do catolicismo da Democracia Cristã. Por isso, o partido não poderia perder nenhum apoio. O preço de optar pelo “partido dos católicos”, neste momento, talvez tenha sido inevitável para a Democracia Cristã radicar-se na sociedade italiana, e desempenhar o papel que lhe foi cometido. Isto não significa que não tenham advindo consequências negativas. Uma delas é o fato de que o partido conseguia mover-se com dificuldade pois sentia o peso da mediação católica, mormente da alta hierarquia, quando não do vértice do Vaticano. Mas há também as positivas, sendo que se pode apontar como uma das mais importantes é que a Democracia Cristã evitou que alguns setores eclesiásticos enveredassem para experiências do tipo salazarista, mantendo o mundo católico dentro dos limites democráticos. Nesse sentido, parece que a balança pende positivamente, pois, perante tantas dúvidas, mesmo da parte da hierarquia eclesiástica, a liderança degasperiana garantiu para a Itália a opção democrática.

Em consequência disso, o partido da Democracia Cristã tem como primeiro desafio de sua organização a assimilação dos dirigentes da ação católica nos seus quadros. Nesse sentido inicia um intenso trabalho de recrutamento de filiados para poder preencher os cargos em nível local e nacional. Nesse momento inicia o processo de desvencilhamento da tutela eclesiástica, pois precisa expandir-se além do seu raio de ação. É consenso se afirmar que o sucesso do primeiro período da Democracia Cristã se deveu á organização da ação católica atraída para o partido. Mas a Democracia Cristã não para aí, passando a partir de então a andar com autonomia, aceitando criticamente o apoio dos meios católicos. Isto por que De Gasperi, tinha consciência que um partido de uma religião, seria um contra senso. Poderíamos nos perguntar: como foi possível que de uma doutrina religiosa adviesse uma proposta política que conseguiu sublimar a opinião pública e imantou os interesses nacionais? Ocorreu aquilo que John Rawls denominou de “concepção política de bem”. Conforme o autor, uma concepção de bem em política é diferente de uma concepção religiosa ou filosófica. Esta última é abrangente, isto é, absoluta. A política é específica, isto é, é para aquele objeto concreto, de modo que, ao aceitar uma determinada ideia de bem em política não é necessário aceitar esta ou aquela religião. Com isso ela se torna razoável e não matéria de fé ou sentimento. É isto precisamente o que caracteriza um regime democrático. Caso fosse a concepção de bem absoluta, certamente cairíamos no totalitarismo, fundamentalismo ou outro regime, mas nunca o democrático. Uma proposta de bem político democrático pode ser aceito por toda sociedade, composta de cidadãos livres e iguais, pois que não pressupõe uma doutrina abrangente.

Com efeito, foi o que ocorreu com a Democracia Cristã a partir da concepção da lavra de De Gasperi. Ele, paulatinamente, passou a atuar politicamente de forma autônoma em relação à hierarquia eclesiástica. Estabeleceram-se metas e programas fora do manto da Igreja. Eram metas de uma sociedade civil, como a inserção da Itália na comunidade europeia, ou a industrialização. De Gasperi quando organizava a economia no sentido de o Estado fazer o papel de regulador criando uma estrutura para o processo econômico capitalista, fazendo conviver prosperidade e liberdade,  não tinha em mente uma determinada religião, mas um interesse que atingia a comunidade civil. Nisso, parece, que consistiu a possibilidade de êxito da Democracia Cristã na Itália e nos demais países europeus que a adotaram, como foi o caso da Alemanha e outros países.


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