sexta-feira, 5 de julho de 2019

Pelo Estado e suas estradas. José Mauricio de Carvalho – Academia de Letras de São João del-Re


Uma das dificuldades atuais da sociedade brasileira está na crise do Estado. Isso pouco tem a ver com ideologias de direita ou esquerda, com esse ou aquele governo, mas com a importância do Estado e do seu papel. Também não é resultado da atual crise econômica, atribuída à Previdência Social. Não, a desidratação do Estado é antiga. Há décadas não vemos uma ação efetiva do Estado em qualquer área ou observamos bom resultado de sua atuação.
Parte dessa crise está no seu afastamento da sociedade. Isso não é só produto da mentalidade neoliberal dos últimos anos. Desde algumas décadas o Estado está sendo desidratado, ele não presta bons serviços em saúde, ele não faz segurança efetiva, ele não promove educação de qualidade. Ao ficar nesses três aspectos elenquei aqueles que foram, até recentemente, a pauta dos liberais, mais ou menos conservadores. Em outras palavras, fazer um pouco mais ou menos, mas atuar de forma efetiva pelo menos nesses três segmentos.
Hoje temos crescente falta de resultado nesses campos e vemos a proposta de armar a sociedade. Já temos quadrilhas de bandidos explodindo bancos, em breve teremos cidadãos com revolver na cintura, duelos ao pôr do sol, num verdadeiro retorno aos tempos do bang-bang americano. Fantasias da infância prestes a virar pesadelo.
Um capítulo desastroso dessa desidratação do Estado é a privatização das rodovias. Pelo menos das mineiras. Mantendo traçado antigo de, pelo menos seis décadas, pouco ou quase nada foi feito em mais de meio século para mudar a rede viária de Minas. Enquanto isso o padrão dos automóveis mudou e o desenvolvimento tecnológico avançou muitíssimo. Um dos mais tristes exemplos dessa realidade foi a privatização da Rodovia 040 (JF-Brasília).
A privatização da estrada exigia que fosse feito um importante investimento antes de se cobrar pedágio. Menos de 10 por cento do valor previsto foi investido e a empresa começou a cobrar pedágio. Pior, nada de realmente importante foi realizado na via, pouco mais que tampar buracos, construir uma ponte e colocar uma ambulância aqui e outra acolá. Quase nada de importante foi feito. Por que a empresa que assumiu esse empreendimento fez tão pouco? Por que os órgãos de controle não revisaram a concessão? Enquanto tudo continua como está, vidas são quotidianamente ceifadas, acidentes se multiplicam, enquanto a providência é multiplicar o número de radares para reduzir a velocidade de carros feitos para andar a duzentos por hora, obrigando-os a trafegar a 40 ou 60 km por hora.
Agora quando se começa a discutir a privatização da BR 265 esperemos que o absurdo da via 040 não se repita. Essa outra rodovia federal precisa passar por rápida duplicação e receber outras melhorias. Para a sociedade nada adiantará privatizar essa outra rodovia federal se ela continuar a ser o que é, uma rodovia pequena, subdimensionada, com traçado inadequado, de pista simples, um corredor de acidentes e um canteiro de mortes. Se o Estado privatiza rodovias deve cuidar que o dinheiro arrecadado seja empregado na efetiva melhoria da via.

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