sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Sobre a honestidade e a política.José Mauricio de Carvalho



Nada fez tanto sucesso nas redes sociais que a afirmação de nosso ex-presidente de que não há no Brasil ninguém mais honesto do que ele. Sucesso considerando-se a quantidade de comentários e partilhamentos. Foi o fato que mais circulou na Internet e nas mídias. De engraçado a imagem do ex-presidente com as vestes papais em aura de santidade. Não entendi se tantos compartilhamentos foi porque muita gente teve consciência de que era tão honesta como Lula, tão desonesta como ele ou nenhuma das alternativas anteriores. Enfim, como não tenho condição de auferir a verdade da afirmação (não estou na consciência do ex-presidente), vou deixar à justiça a tarefa de verificar a afirmação. Aproveito, contudo, a oportunidade para tratar da honestidade.
Quando se pensa em honestidade não há como não se lembrar do ensaio  intitulado Sobre a Discordância entre a Moral e a Política, a propósito da paz perpétua, escrito pelo filósofo alemão Immanuel Kant. Depois de explicar que política e moral são duas ordens distintas e que, portanto, a prática mostra a distância entre elas, Kant defende a honestidade como valor fundamental da sociedade, afirmando que ela não é incompatível com a prática política. Kant disse: "Quando estas duas coisas não podem coexistir em um mesmo mandamento, há realmente um conflito entre a Política e a Moral, mas se ambas devem ser inteiramente unidas, o conceito do contrário é absurdo e a questão de saber como resolver aquele conflito não se apresenta mais como problema. Embora a proposição: a honestidade é a melhor política, contenha uma teoria que infelizmente, a prática com muita frequência contradiz, a proposição igualmente teórica: a honestidade é melhor do que qualquer política, está infinitamente acima de toda objeção, sendo mesmo condição indispensável da política" (Textos seletos, Petrópolis, 1985, p. 130).
O texto de Kant veio a calhar toca em dois pontos importantes. Primeiro, na vida política o comportamento moral é difícil, segundo, embora difícil a consciência honesta pode presidir qualquer ação social, inclusive na política. Portanto, é bem possível a um político ser verdadeiramente honesto e então descobrimos um Lula kantiano, não porque ele faz o que diz, mas porque afirma, como bom kantiano, que não há incompatibilidade entre a vida política e a honestidade. Ao confirmar a afirmação kantiana, Lula coloca nossa classe política numa situação complicada, pois não é um filósofo que diz que é possível ser honesto e político, é um político contemporâneo. Assim, os políticos pegos na mentira, além de responderem criminalmente pelo mal feito, cometem imoralidade. Devem se punir diante da própria consciência, o que exigiria, no mínimo, arrependimento, um pedido público de perdão e reparação do mal, para que pudessem pagar na cadeia por seus crimes, mas com a consciência redimida.
Além disso, a fala de Lula é importantíssima porque anuncia a necessidade da moral, ou do seu acirramento, num tempo em que os valores e a religião encontram-se em baixa. De fato, é preciso retomar a discussão sobre os costumes e seus fundamentos para assegurar que a sociedade possa bem viver. Sem moral não se pode esperar bom funcionamento do corpo social, pois é a constrição da consciência de cada um que o obriga a agir corretamente: o motorista a levar responsavelmente seus passageiros, o médico a operar com excelência, o eletricista a bem ligar a eletricidade e assim sucessivamente. A retomada da moral como um importante agente do tecido social é talvez o que de mais importante ficou do episódio do ex-presidente.


sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

DIFERENÇAS ENTRE O FÓRUM ECONÔMICO INTERNACIONAL MUNDIAL E FÓRUM SOCAIL MUNDIAL. Selvino Antonio Malfatti.












Quase simultaneamente realizam-se os dois fóruns: o Econômico o Internacional Mundial - WEF e o Fórum Social Mundial - FSM. O primeiro começa no dia 20, em Davos na Suíça e o segundo no dia 19, em Porto Alegre Brasil. Apesar de as datas serem praticamente coincidentes seus conteúdos e métodos são diametralmente opostos devido a ideologias opostas.



Em um e outro os participantes também diferem, pois cada um leva em sua bagagem a ideologia própria de seu país, melhor dito, de seu governo, pois nem sempre a ideologia do país coincide com o governo.
Nossa pretensão é apontar algumas diferenças, entre ambos não no sentido de desmerecê-lo ou aprová-lo, mas submetê-lo ao crivo da crítica. (
Crítica no sentido originário grego: crinein= distinguir). Eis algumas confrontações:
1.    Renovações científico-tecnológicas
As novas descobertas científicas e tecnológicas devem estar a serviço do bem estar das populações, não só beneficiando a todos e não excluindo ou explorando outros, como são acusados os seguidores do sistema capitalista. Os partidários do Fórum Social querem a socialização plena da ciência e tecnologia.
2.    As migrações
Como enfrentar os novos habitantes, migrantes de países em conflitos internos? O que fazer para acolhê-los? São um milhão de refugiados. O Fórum Social quer a liberação total das migrações, enquanto os do Fórum econômico quer uma migração racional, isto é, medir a capacidade concreta de cada país para absorver as ondas migratórias.
3.    Segurança
O terrorismo é uma realidade que atinge a todos. Como conseguir a segurança respeitando os direitos humanos? A divisão política e religiosa que grassa no oriente se expande pela Europa e América, divisão entre sunitas e xiitas, Arábia Saudita e Israel. O terrorismo já alcançou uma escala mundial. Os do Fórum Social pensam que o terrorismo é uma consequência das injustiças praticadas pelo sistema econômico capitalista, enquanto os do Fórum Econômico atribuem à incapacidade de assimilar a ideia de tolerância religiosa, de raça, etnias e classes.
4.    Crise nos países emergentes
Como estimular o crescimento destes países? Quais ações afirmativas – incentivos econômicos - e ações dissuasivas – combate à corrupção? Os do Fórum Social acham que os países emergentes ou de terceiro mundo devam criar uma economia alternativa, não capitalista, mas social. Os do Fórum Econômico apostam na assimilação destas economias.

5.    Desníveis entre ricos e pobres
Como mudar o quadro de 1% da população ser detentora de 99% dos bens? O(s do fórum social querem a distribuição e os do fórum econômico a participação.
6.    Sistema econômico-financeiro global
Como blindar o sistema econômico e financeiro mundial das crises econômicas locais ou regionais? Como criar uma estabilidade em momentos de instabilidade? Justamente nisso que diferem os dois fóruns. O sistema econômico mundial entende que a interdependência é benéfica a todos, enquanto o fórum social mundial acha que cada país, região ou local deve ter uma economia adaptada às necessidades e potencialidades locais. Os primeiros são partidários da globalização e os segundos da regionalização.

7.    Meio ambiente
É possível crescer, produzir, desenvolver respeitando a natureza? É isto que pensa o Fórum Econômico Mundial. O Fórum Social acha que se deve pôr um basta na exploração econômica do planeta. Irá pronunciar-se nada mais e nada menos que o ativista Leonardo di Caprio.
8.    Trabalho
Uma das grandes ameaças ao trabalho humano, aliás sempre foi, é a tecnologia,  como as máquinas e agora a robótica. O Fórum Econômico entende que pode conviver pacificamente tecnologia e trabalho. O Fórum Social quer a máquina longe do trabalho, pois este é de exclusiva competência do homem.
9.    Petróleo
Um dos temas é a queda vertiginosa do preço deste produto natural. Em 2014 valia US$ 100 o barril, 2015 valia 57 US$ o barril e atualmente US$ 30 o barril. O Fórum social quer que sejam socializados os lucros da exploração deste produto natural. O que é da terra é de todos, dizem seus partidários.
10. Saúde mundial
Apesar de todo o avanço mundial na saúde as populações marginais não são beneficiadas. Como conseguir? O Fórum social aposta na estatização da saúde, enquanto o econômico não se opõe que haja saúde estatizada, mas quer garantir também um espeço para a iniciativa privada.


sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

O novo caso de amor patrimonialista da política nacional com o grande empresário. José Mauricio de Carvalho


Correu no Brasil dos smartfones e celulares o vídeo de um empresário dono de uma das empresas denunciadas na Lava Jato. Ele foi hostilizado num resort. Não importa a empresa, nem o local, nem o empresário, o emblemático é o fato. Ele reflete a indignação dos que trabalham honestamente (ou invejam os esquemas fraudulentos de enriquecimento ilícito), mas expressa, nos dois casos, a desconfiança das instituições. Nenhum cidadão tem que hostilizar outro no espaço social. Cabe à justiça julgar e punir, na forma da lei, quem errou. E assegurar a aplicação da punição. Se algo deve fazer o cidadão honesto é acompanhar e cobrar o funcionamento da justiça. O que a operação lava jato mostra é que faz tempo que a política perdeu seu sentido verdadeiro e descobrimos, em nosso país, um novo caso de amor entre o políticos e o grande empresariado.
Sabe-se que a base da moral é a consciência individual, moral é uma interdição da consciência para fazer o mal. É sempre possível agir moralmente, mesmo em ambientes ruins. Contudo, ambientes ruins alimentam a imoralidade e permitem que pessoas de moral frouxa encontrem mais espaço para agir. E um exemplo de ambiente assim é o que se instalou em nosso país: quase quarenta partidos (sem qualquer razão real para existir ou ideologia além de sobreviver e beneficiar os seus). O espectro ideológico poderia ser coberto por três ou quatro partidos. As maiores democracias do mundo não fogem a isso. Essa realidade se agrava com custos crescentes da campanha eleitoral e o uso dos meios de comunicação de massa. Essas mídias privilegiam a performance publicitária mais que as propostas e seu detalhamento. Some-se a isso uma população pouco escolarizada, com reduzido espírito crítico e pequena capacidade de entender os problemas. Acrescente uma elite egoísta, desejosa de prazer imediato e despreocupada com as consequências do que faz. Se no dia a dia o esforço pessoal é o que conta, há certos problemas no espaço social que se não forem resolvidos dificultam a vida de todos, dito de outro modo, não é possível se salvar sozinho de um barco afundando e do qual não há como sair. E assim enquanto alguns acham que se salvam em festas privadas e condomínios fechados, a miséria e a ignorância permanecem e crescem geração após geração.
O que a lava jato mostrou é o casamento, com juras de amor eterno: entre políticos de carreira com o grande empresariado. As exceções existem e confirmam a regra. O político discursa sobre o destino do povo, mas apenas quer se manter no poder e o empresariado faz o discurso capitalista da livre concorrência, mas não arrisca e ganha o grosso do seu dinheiro fazendo negociatas com o Estado. Obtém recursos subsidiados e paga propina para garantir grandes obras, em resumo, fraudam os mecanismos de controle do Estado e patrocinam os esquemas de poder de políticos corruptos e seus comandados nas empresas públicas. Casamento abençoado pela grande mídia que ganha fortuna com o jogo político e a propaganda partidária e dos governos. Tudo isso num sistema mundial que alimenta o consumo, o gozo irresponsável e o divertimento das massas. Trata-se, enfim, de uma acomodação do patrimonialismo tradicional à nova circunstância do mundo globalizado.
O que se vê é que políticos e alguns grandes empresários reconstruíram as bases do patrimonialismo tradicional, num mundo chamado de pós-moderno, em que as circunstâncias são diferentes do capitalismo mercantil ou industrial. Refizeram o discurso capitalista naquilo que convém a cada um. A corrupção existe em todo o mundo, basta lembrar do que se passou na FIFA e recentemente e os casos de corrupção denunciados na Turquia, na China, na Ucrânia, etc., mas ela não fragiliza Estados fortes, nem os desvia de sua rota de longo prazo, porém fragiliza os países emergentes, neles perpetua a miséria, pune os que trabalham honestamente e piora a vida dos mais pobres.



sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

SOCIEDADE LIQUIDA. Selvino Antonio Malfatti.




O pensador polonês Zygmunt Bauman é o autor da teoria da sociedade liquida. 
Nasceu em 1925, em Poznán. Na II Guerra Mundial combateu no exército russo. Pertenceu ao partido comunista polaco, mas desfilhou-se devido às experiências fracassadas no leste europeu.
Graduado em sociologia pela URSS chegou ao cargo de professor universitário. Inicia sua carreira acadêmica na universidade de Varsóvia, mas é afastado devido aos seus escritos, censurados pelo Partido Comunista. Sai da Polônia devido às perseguições antissemitas e radica-se na Grã-Bretanha, como professor titular da Universidade de Leeds. Durante sua carreira conquista vários títulos acadêmicos. Atualmente está com 90 anos e participou de um debate em Burgos numa promoção do Foro da Cultura em cujo evento, em novembro, dá uma entrevista. Várias questões lhe foram postas. Destacaria algumas:
1.      A democracia diante do modelo político democrático. É preciso haver um casamento entre poder e política. O primeiro é a capacidade de atuar e o segundo selecionar o que é mais urgente ou necessário. Na cidade-estado de Atenas origina-se a democracia que combina perfeitamente poder e política. Aí, um grupo é considerado cidadãos iguais, a democracia, os eupátridas. Funcionou principalmente por que havia identidade de interesses do grupo local com as medidas políticas a serem adotadas pelo estado.
Na idade moderna, o modelo grego recebeu a forma de democracia liberal cujo modelo foi praticado na Inglaterra. Politicamente tinha como critério o censitário, isto é, os mesmos interesses econômicos e políticos de grupos locais. Com isso, tanto o local como o estado combinavam, pois o estado atendia os interesses locais.
No período contemporâneo, de nação-estado, surge a universalidade da participação política criando uma dicotomia entre os interesses localizados e as políticas globais. Neste modelo, a democracia entrou em crise, pois o poder é universal e a política tem demanda local. Não há mais interdependência entre o poder e a política. O todo não tem o querer local e o local não tem poder global. Concretamente pode ser amenizado através do voto distrital que contempla algumas demandas sociais locais e globais.

2.      A dicotomia entre liberdade e segurança.
Um dos temas que Bauman  atribui maior importância  é o dilema entre liberdade e segurança. Pensa o autor que são dois valores dificílimos de conciliar. Se quisermos segurança deves renunciar certas liberdades e o inverso, se preferirmos liberdade, ficamos expostos à insegurança. A crença na liberdade absoluta levou a sociedade à orgia de consumo. Tudo estava ao alcance de todos mediante o crédito. Este pode satisfazer a todos os desejos e o próprio sistema econômico dissemina esta ideia. Mas, quando acaba o crédito, como acontece atualmente, cai-se numa dura realidade. A classe média, então, foi a mais atingida, pois passou a viver em situação de precariedade. Tudo era incerto, provisório: o emprego, a empresa, os bens que se possui. O conflito de classe foi substituído pelo de sociedade. A barreira não é mais a classe, mas a sociedade. E a falta se segurança acabou atingindo a liberdade. Neste momento o homem perdeu a liberdade e a segurança.
Outro tema caro de Bauman é o ativismo das redes sociais. Acha que aquilo que é chamado de identidade própria, como as comunidades das redes, é algo puramente imaginário por que comunidade se tem ou não. O que se pode fazer é criar artificialmente um substituto da comunidade. Nesta cada uma lhe pertence, nas redes a comunidade lhe pertence. Todos podem acrescentar amigos, eliminá-los, podem controlar sua comunidade. Mas na vida real não é assim, Há necessidade de interagir com outras pessoas, há que se dialogar e aí volta o conflito que parecia eliminado nas redes sociais. As redes sociais podem fazer bem, mas são apenas engodos, cedo ou tarde, mostram sua artificialidade.
O pano de fundo do pensamento de Bauman e sua matriz condutora é o conceito de sociedade liquida em oposição à sociedade sólida. Parte da constatação do fim das ideologias (comunismo, socialismo e capitalismo). Agora não há mais por que lutar, sonhar, refletir, planejar. Em vez de o homem conduzir a história é o mercado que a conduz. Este dita regras, estabelece comportamentos, derruba valores existentes. A vida passa a ser desordenada, não há mais uma previsão de comportamentos. Cada um se move conforme os apelos momentâneos do mercado.
Fonte: Estado de crisis. Zygmunt Bauman y Carlo Bordoni. Traducción de Albino Santos Mosquera. Paidós. Barcelona, 2016.







sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

ENCONTRO DE NAPOLI SOBRE OS DIREITOS DO HOMEM. Selvino Antonio Malfatti



















Teve lugar em Napoli, dia nove e dez de dezembro de 2015, um Encontro sobre os Direitos do Homem, confrontando-se o relativismo local e o universalismo absoluto. O referido evento foi patrocinado pelo Instituto para os estudos filosóficos do Centro Gaetano Salvemini. Algumas questões foram colocadas como: será que se pode falar que toda pessoa em qualquer parte da terra e em todo momento deve gozar dos mesmos direitos? Na verdade os direitos universais são patrimônio da cultura ocidental. E como de fato funciona em cada Estado estes direitos? Estas são as perguntas para justificar o caráter relativista e universal destes direitos, no dilema que se estabelece concretamente entre cultura e política ou, uma coisa é o meio social e outro a engenharia política de cada Estado.



Depois dos atentados de Paris e São Bernardino, que reduziram os direitos individuais em razão da segurança, agudizaram a questão e provocaram novos debates, os quais mereceram mais aprofundamento diante da ameaça do Terror Global.
A questão dos direitos do homem não nasceu pronta, Foi uma conquista ética de milhares de anos que atravessou as mais diversas culturas, mormente as ocidentais.
Um conjunto de direitos afetos à individualidade do homem, também denominados direitos do homem, evidenciou-se como consciência deles, nas diversas experiências do Ocidente. Através de contínuas assimilações de legados de povos diversos e em tempos históricos diferentes, a consciência dos Direitos do Homem constitui hoje uma confluência cultural fazendo parte de valores da pessoa humana. Atualmente estes direitos ocupam um lugar privilegiado entre as instituições políticas, pois foram considerados pela Organização das Nações Unidas um Patrimônio da Humanidade.
No entanto, atualmente há três momentos marcantes quanto a estes direitos. Trata-se da institucionalização na Constituição da Revolução Americana, na Revolução Francesa e na Declaração da Organização das Nações Unidas.

1.    Revolução Americana
Os Representantes das 13 colônias, nos Estados Unidos, se reuniram em Filadélfia em 4 de junho de 1776, em Congresso Continental e anunciam a famosa Declaração de Independência. Nela já se expressariam os princípios filosóficos que iriam nortear a futura Constituição. Primeiramente se estabelecem os princípios dos Direitos do Homem, tais como a igualdade, a vida, a liberdade e a buscada felicidade. Estes direitos são considerados inalienáveis e originários do nascimento como ser humano. Estes princípios são "self-evidenf'. No dizer de Jefferson a Declaração não inventava nada, seguindo o senso comum, isto é, o consentimento. Mas ao citar expressamente os ensinamentos de Aristóteles, Cícero, Locke e Sidney, identificou-se com uma filosofia que considerava os Direitos do Homem provenientes da lei natural.
Na questão da organização do Estado, surgiram duas tendências: uma queria praticamente uma soberania para cada ex-colônia, eram os anti-federatlstas, e outra queria uma ampla autonomia para os estados, mas sem a soberania. Eram os federalistas. Na Convenção encarregada de elaborar uma Constituição, de 17 de setembro de 1787, os delegados houveram por bem silenciar sobre a questão dos Direitos do Homem, merecendo diversas críticas posteriores. No entanto, em 15 de Dezembro de 1791, 10 artigos são aditados à Constituição, devidamente ratificados pelos legislativos estaduais.
O princípio que norteou a Carta de Direitos foi o jusnaturalismo. Estabeleceu-se que, para os Estados, "tudo o que não está reservado, está concedido", mas para o Governo geral, "tudo o que não está concedido, está reservado". Daí que a Carta, em seus 10 artigos, sintetiza os principais direitos do homem, perante o governo central. O Congresso, não pode fazer leis sobre religião e comércio, não pode restringir a liberdade de imprensa e palavra. Proibir o povo de reunir-se. O povo pode possuir e portar armas. Proíbe-se o alojamento de soldados em casas, sem o consentimento do proprietário. Ao povo é garantido o direito de integridade pessoal, patrimônio e documentação. Os mandatos de busca e apreensão devem ter descrições pormenorizadas de locais, pessoas e objetos. Todo processo que vise a vida, propriedade e liberdade deve ter amparo legal, sem falar no direito de defesa e de julgamento público e imparcial, incidindo somente sobre crimes identificados. Em processos que exceda vinte dólares, após julgado por um júri, não pode ser julgado por outro tribunal, senão de acordo com lei comum. Não haverá fianças e multas excessivas, ou castigos cruéis e extraordinários. A enumeração destes direitos não elimina outros que estão na posse do povo. Os poderes que não foram delegados ao governo central, nem proibidos aos estados, permanecem nos estados e no povo.

2.    Revolução Francesa
Na noite de 4 de agosto de 1789, a Assembléia na França aboliu os dízimos, as obrigações feudais dos camponeses, a servidão foi extinta, caíram os privilégios de caça dos nobres, a isenção de impostos, e os monopólios. Este foi o primeiro passo, fazer tabula rasa de todas as classes e nível social, igualando a todos perante a lei. Após serem removidos os entulhos inicia a obra de reconstrução.
De imediato faz-se a Declaração dos Direitos do Homem como precaução contra a antiga ordem. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão traz um objetivo universalista. A Carta americana referia-se somente a seus habitantes. A francesa objetiva todo o homem, primeiramente porque a fundamentação dos Direitos do Homem inspirou-se na razão. E em segundo lugar, iniciava-se uma consciência da universalidade desses direitos. A Assembléia já estava legislando para toda a humanidade.
Embora fale em "direitos naturais", na verdade são abstrações de situações concretas. Quem descobriu os direitos naturais foi a razão, sendo eles válidos uniformemente para todos os homens, de todos os tempos e em qualquer situação. Os direitos consagrados na Declaração são de liberdade, igualdade, propriedade, segurança e resistência à opressão. A soberania, de acordo com a doutrina contratualista, é depositada na nação. Além disso, todos têm direito á pública e ampla defesa quando acusados. É garantida a liberdade de expressão, podendo para tanto, falar, escrever e imprimir suas idéias. É instituída uma força pública para garantir os direitos do homem. Este artigo evidencia o caráter estatal e convencionalista, dos direitos presentes na revolução francesa. A defesa dos direitos necessita de uma força, quando, a ideia de direitos naturais é deter a força perante estes direitos. Com isso o poder se arroga o árbitro dos direitos, ideia estranha à doutrina jusnaturalista.

3.    A Declaração Universal dos Direitos do Homem
A Declaração Universal dos Direitos do Homem é a suprema consciência alcançada até agora. Nela estão presentes tanto os direitos provenientes da razão, os convencionalistas, como os naturais, jusnaturalista. O caráter racionalista dos Direitos do Homem parece predominar na Carta das Nações Unidas em 1948, através da Declaração Universal dos Direitos do Homem. No entanto, todos os direitos do jusnaturalismo também estão presentes e dá a entender que estes direitos estão acima dos Estados e governos, os quais devem reconhecê-los. Possui um Preâmbulo e 30 artigos. No primeiro, através dos "considerandos", se estabelecem os grandes princípios da convivência humana, tais como a dignidade humana, o ideal democrático, resistência à opressão e outros. A Carta divide os direitos em individuais e sociais. Entre os primeiros constam os quatro grandes direitos do homem: vida, liberdade, igualdade e propriedade. Mas outros foram acrescidos como nacionalidade, asilo, intimidade, família, ir e vir, participação política e outros. Quanto aos segundos consta a segurança, trabalho, seguridade, educação e cultura. Já o artigo 29, estabelece os deveres perante a comunidade e finalmente no artigo 30, determina que a interpretação seja sempre em benefício da verdade.

quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Ano novo: entre o tempo cíclico e a progressividade. José Mauricio de Carvalho - Prof. do IPTAN

Estamos, conforme a tradição, nos aproximando do ano de 2016 contados do nascimento de Jesus de Nazaré, reconhecido como o Cristo. Observe-se que não sabemos a ocasião exata do seu nascimento, 25 de dezembro foi uma data simbólica escolhida pela Igreja Romana, no século IV, para sobrepor-se às festividades do Deus Sol cultuado entre os romanos. Igualmente não sabemos se o nascimento de Cristo se deu exatamente no ano que a tradição estabeleceu. Esta data foi inicialmente calculada por Dionísio, o pequeno, com base em outras datas de referência do Império Romano (fundação de Roma, governo de imperadores, etc.). Os cálculos iniciais de Dionísio estavam errados e foram corrigidos posteriormente. Chegou-se então ao ano aproximado do nascimento de Cristo, tomando-se como parâmetro os governantes do Império Romano mencionados nos evangelhos. Com base nesses cálculos Cristo deve ter nascido entre três e seis anos antes da data estabelecida. Assim estaríamos, de fato, um pouco além dos 2016 cuja entrada vamos comemorar, mas isso importa pouco para o que destacamos, o olhar cíclico do tempo.
Para esse olhar cíclico, o solstício de Inverno (22 de dezembro no hemisfério norte) tomado como referência para o nascimento de Cristo e que era para muitos povos antigos símbolo do recomeço e do renascimento, significa uma nova era na história humana. A festa do solstício de inverno, desde os tempos da antiga Babilônia, também representava na consciência daqueles povos a ideia de que as coisas se renovam de tempos em tempos. Assim, quando comemoramos a entrada de 2016 estamos marcando um novo ciclo, um recomeço para nossas vidas. Essa ideia de renovação cumpre um papel psicológico importante num ser cuja experiência de viver é marcada pelos limites e pela dor das perdas. De fato, a nossa existência é transpassada pelo sofrimento, pela morte e pela culpa, realidades que fez os filósofos existencialistas falarem de um mundo quebrado para traduzir os limites e o fato de que as coisas em nossa existência não se encaixam bem. Na passagem para o ano de 2016 temos a oportunidade de lidar melhor com o que não conseguimos mudar e de mudar o que podemos para viver ainda melhor. Viver mais de acordo conosco, com nossas possibilidades, com aquilo que desejaríamos para nós, é saber a que se ater e a dedicar a vida.
Embora a ideia de renovação acompanhe a vida, pela possibilidade de refazer para melhor, as escolhas que temos que fazer, o próprio cristianismo que popularizou a ideia de renovação periódica do viver, também difundiu a ideia de tempo como um ir ao futuro. Este tempo por vir é o tempo em que o Senhor Jesus, que vive na Glória, estenderá seu Reino por toda a terra. E essa ideia de uma vida que no presente vive com os olhos no futuro é aquela que mais precisamos cultivar. Podemos sempre procurar ser melhor e recomeçar quando as coisas não vão bem, não é preciso datas especiais, temos o desafio de construir uma vida mais de acordo conosco, pois o que deve guiar nossa existência é um sentido de vida construído individualmente na meditação diária e, se possível, no autoconhecimento vindo da psicoterapia. Estar em paz conosco pelo caminho que escolhemos, superar as culpas pelo que não podemos mudar e não incorrer em novos erros é uma boa direção a seguir. Se conseguirmos tirar de nossa existência o melhor que ela pode dar, teremos um ano novo melhor do que aquele que passou e ajudaremos a sociedade a ser melhor do que foi. Esse é o desafio de viver quando olhamos a vida como um caminhar para o futuro, a vida é direção a um sentido. O modo de existir implica em não só saber enfrentar o que nos acontece com atitudes e valores que se formam na esfera da moralidade, mas também em ter um sentido de futuro pelo exercício consciente da liberdade.



quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

NATAL - NASCIMENTO DE JESUS.






https://letras.mus.br/andrea-bocelli/1610268/

                           Entrada da Igreja dos Anjos - Belém


Também José subiu da Galileia, da cidade de Nazaré, à Judeia, à Cidade de Davi, chamada Belém, porque era da casa e família de Davi,
para se alistar com a sua esposa Maria, que estava grávida.
Estando eles ali, completaram-se os dias dela.
E deu à luz seu filho primogênito, e, envolvendo-o em faixas, reclinou-o num presépio; porque não havia lugar para eles na hospedaria.
Havia nos arredores uns pastores, que vigiavam e guardavam seu rebanho nos campos durante as vigílias da noite.
Um anjo do Senhor apareceu-lhes e a glória do Senhor refulgiu ao redor deles, e tiveram grande temor.
O anjo disse-lhes: Não temais, eis que vos anuncio uma boa nova que será alegria para todo o povo:
hoje vos nasceu na Cidade de Davi um Salvador, que é o Cristo Senhor.
Isto vos servirá de sinal: achareis um recém-nascido envolto em faixas e posto numa manjedoura.
E subitamente ao anjo se juntou uma multidão do exército celeste, que louvava a Deus e dizia:
Glória a Deus no mais alto dos céus e na terra paz aos homens, objetos da benevolência {divina}. (Lucas 2:4-14)


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