sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

O AVANÇO DA DIREITA NA EUROPA, UM SINAL DOS TEMPOS? Selvino Antonio Malfatti.




Politicamente a Espanha é uma monarquia, com governo parlamentar, e está dividida em 17 comunidades autônomas. A maior delas populacionalmente é Andaluzia e segunda em território. Possui quase oito milhões de habitantes. Elege 350 deputados. Para comparar, a segunda, Castela e Leão, possui dois milhões e meio de habitantes e 109 deputados.

No dia 2 de dezembro ocorreram as eleições na região autônoma de Andaluzia. O que parecia uma eleição rotineira para a Espanha, com uma vitória corriqueira da esquerda, de repente a surpresa: a direita vence de modo avassalador. 
A maioria dos jornais a caracteriza como vitória da extrema direita. O tempo dirá. O certo é que não foi vitória da esquerda, mas de uma direita que se aproxima de Trump dos EUA, Marine Le Pen, da França, Matto Salvini, da Itália e, por que não dizer, de Jair Bolzonaro, do Brasil?
Apresentou-se ao eleitorado com as principais bandeiras: governo único em toda Espanha com o fim das comunidades autônomas, Congresso único, extinção do Senado, retomada de Gibraltar, construir um muro entre as cidades de Ceuta, Melilla e Marrocos para deter os imigrantes que chegam. Como inimigos foram apontados os movimentos de independência, como os de Catalunha, a imigração, a lei da memória histórica, a lei contra a violência de gênero. O partido condutor foi o recém instituído Vox, sob a liderança de Santiago Abascal. Conseguiu quebrar uma tradição de quase quarenta anos, elegeu doze deputados, com 11% dos votos contra os apenas 0,5% de três anos atrás. Santiago Abascal vai mais longe: pensa que esta eleição em Andaluzia foi uma amostra do que vai acontecer em outras regiões de toda Espanha. 
A partir de agora, ao que tudo indica, a Espanha se tornou um país “normal” na Europa e a exceção findou. Espanha tem partido de direita, com forte suspeita de radical.
Trazemos algumas manifestações do líder Santiago Abascal.

No Congresso dos Deputados descreve a atuação atual dos partidos:
“Queremos que los partidos dejen de jugar con el futuro de España en pactos infames con quienes quieren romperla, ya sea para aprobar unos presupuestos como hizo Rajoy con el PNV, o como hace ahora Pedro Sánchez para okupar la Moncloa. Queremos que entiendan algo que deberían saber, porque lo han jurado o prometido… que lo primero es España, no sus partidos ni sus intereses”, sentenció.

Também no Congresso dos deputados procura colocar Espanha acima de seu próprio partido Vox:
“Hoy no estáis aquí por VOX, estáis aquí por España. Nosotros no hemos convocado esta movilización para pedir vuestro apoyo, sino para dar voz al pueblo español. Queremos que los españoles puedan votar”, aseveró.

Abascal apresenta as principais reivindicações do partido:
“...devolución de las competencias de Educación, Sanidad y Seguridad al Estado, la defensa de las fronteras, contra la inmgración ilegal y el islamismo radical y la ilegalización de partidos separatistas. ” . Hay que regular la inmigración. No es lo mismo la inmigración procedente de los países hermanos latinos que la inmigración islamista”

Entrevista em Álava, local de origem de Vox, com  ALBERTO DI LOLLI, no jornal El...MUNDO :

-¿Le gusta que le llamen facha?-Ni lo soy ni me gusta. Me resbala. Hasta a Felipe González le llaman facha. Lo utilizan para deslegitimarnos, para que nos callemos. -¿Fascista?-No me identifico con el fascismo, claro que no. -Franquista...-No estoy ni en la crítica destructiva ni en la apología de Franco. Lo de Franco fue un régimen autoritario, pero no fue Hitler ni Stalin.También negará ser machista, homófobo, nacionalista español. «Los que más me insultan son los ultras de la extrema derecha, los fachas de verdad», dice, convencido de que sus palancas de crecimiento, con las redes sociales como aliadas («los medios ya no decidís»), son el secesionismo catalán y el rechazo al Estado de las autonomías («porque quita igualdad y libertad a los españoles y es un despilfarro»). Algo en lo que, subraya, ya está arrastrando al líder del PP: «Con la boca muy pequeña, Casado habla de la recuperación de la Educación. Yo noto esa influencia y la veo con alegría».

Não diríamos como Dilma: a esquerda perde por que a direita ganha, apenas constatamos um avanço da direita não só na Espanha, nem só na Europa, mas no Ocidente de um modo geral.

sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Filosofia e Ciência precisam dialogar. Selvino Antonio Malfatti.









Sem diálogo, conversação, entendimento mútuo, uma relação matrimonial não sobrevive. Entre eles, o mais importante, é o entendimento. Muitas vezes este é tão importante que precisa ocultar-se. Para obter uma mudança é preciso aparentar que não se sabe. Se eu quiser que o outro tenha mais contenção nos gastos, peço-lhe sugestões de como poupar.
Assim é na relação entre filosofia e ciência. Entre ambas deve reinar o máximo de compreensão. À filosofia cabe a iniciativa, enquanto que o prosseguimento cabe à ciência. A filosofia pergunta por que os objetos caem? A ciência busca a resposta e diz-lhe que é por causa da gravidade. A filosofia pergunta se é somente aqui ou em toda parte? A ciência responde que é em toda terra. A filosofia pergunta se é somente na terra? A ciência responde que em todos os corpos que possuem massa. Como é em cada um, pergunta a filosofia?!
 O DIA LOGOS – ΔΙΑ ΛΟΓΟΣ . Diálogo (andar em direção), significa o progresso do conhecimento. A cada pergunta da filosofia, a ciência responde. E a filosofia faz mais perguntas e a ciência responde. É nisso que o conhecimento progride.
É o que propõe o físico italiano. Carlo Rovelli,com o título de seu último lançamento : «Ci sono luoghi al mondo dove più che le regole è importante la gentilezza»,(Há lugares no mundo onde civilidade é mais importante que as regras). Outro livro dos mais famosos é : Che cos´è la Sicenza la Revoluzione di Anassimandro. E o best-seller: Sete Breves Lições de Física.
Rovelli já esteve no Brasil participando do Programa: Fronteiras do Pensamento, Porto Alegre, maio de 2017.
Esta ideia de profunda relação entre filosofia e ciência é pensamento recorrente para o físico Rovelli. Para tanto apresenta como testemunho o pensamento do filósofo grego Anaximandro. Ao contrário de todas as demais civilizações antigas – egípcias, maias, chinesas e babilônias, - que pensavam o mundo como um céu por cima e uma terra embaixo, os gregos, através de Anaximandro, tinham outra concepção: a terra é uma gigantesca pedra navegando no espaço tendo um céu que continua sob os nossos pés. Esta concepção filosófica deu origem às descobertas científicas de Copernico, Galileo, Newton, Einstein e inúmeros outros. Na maioria das vezes todo cientista é também filósofo e vice-versa, como Kant, Pitágoras, Aristóteles, Descartes e inúmeros outros. Por outro lado, os povos que possuem grandes filósofos também possuem grandes cientistas.
Aliás, foram os gregos que delinearam praticamente as fronteiras de cada conhecimento ou ciência através da filosofia.
Rovelli dá mais exemplos desta íntima relação entre filosofia e ciência. Em Aristóteles encontrou várias teorias válidas para a ciência atual. O tempo, por exemplo, não é o mesmo em tudo. Há vários níveis, alguns físicos, outros apenas mentais ou mnêmicos. Para nós, por exemplo, o tempo é uma emoção de um contínuo fluir e que tudo termina. Mas onde comprovar esta afirmativa? De momento é só um pensamento filosófico-emotivo, mas a ciência poderá ou não comprovar.
No progresso do conhecimento a iniciativa quase sempre cabe à filosofia e a comprovação à ciência, mas ambas são necessárias: iniciativa e comprovação para que haja conhecimento.

sábado, 24 de novembro de 2018

O NOVO MINISTRO DA EDUCAÇÃO: Ricardo Vélez Rodríguez e o Ensino. José Mauricio de Carvalho Prof. Titular aposentado da UFSJ e do UNIPTAN






Ricardo Rodríguez e o ensino
É natural a curiosidade dos cidadãos sobre pessoas que ocuparão postos estratégicos num futuro governo. Portanto, é natural e louvável o interesse dos brasileiros sobre os novos ministros entre os quais o Ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. Dos outros ministros indicados conheço pouco, Ricardo Rodríguez conheço bem. Nascido em 15 de novembro de 1943, em Bogotá, Colômbia, ele vive no Brasil há mais de quatro décadas tendo se naturalizado brasileiro e tido dois filhos brasileiros. Dotado de inteligência rara e grande capacidade de estudo e trabalho, Ricardo Rodríguez licenciou-se em Filosofia na Universidade Javeriana, em 1963. Cursou Teologia no Seminário Conciliar ainda em Bogotá, fez mestrado em Filosofia na PUC-Rio (1974), doutorado em Filosofia na UGF (1982) e estágio de pós doutorado na França. É membro da Academia Brasileira de Filosofia e Sociedade Tocqueville (ambas no Rio de Janeiro), Instituto de Filosofia Luso-Brasileira (Lisboa), Instituto Brasileiro de Filosofia (São Paulo), The Planetary Society (Pasadena – Califórnia), Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro, integra o Conselho Diretor do Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro (Salvador) e o Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio. Foi professor na Universidade Estadual do Paraná, na Universidade Gama Filho e, desde 1985, atuou como Professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde se aposentou como Associado. Destaco entre seus interesses intelectuais: filosofia brasileira, filosofia das ciências, história da filosofia, filosofia política, ética e história da cultura.
Vou apresentá-lo a partir do que já escrevi sobre ele em Contribuição contemporânea à História da Filosofia Brasileira (3. ed., Londrina, Eduel, 2001) e em Antologia do culturalismo brasileiro (Londrina: Eduel, 1998). Ricardo escreveu importantes livros sobre a realidade ibero-americana e brasileira entre os quais se destacam: Liberalismo y conservantismo en América Latina (Bogotá, Tercer Mundo, 1978); Castilhismo, uma filosofia da república (Est-EDUCS, 1980, reeditado em 2000 pelo Senado Federal na Coleção Brasil 500 anos); A propaganda republicana (Ed. UnB, 1982); O trabalhismo após 1930 (Ed. UGF, 1985); O Castilhismo (Ed. UGF, 1994); A ditadura republicana segundo o apostolado positivista (Ed. UGF, 1995); Tópicos especiais de filosofia moderna (Ed. da UEL e Ed. da UFJF, 1995), Oliveira Vianna e o papel modernizador do estado brasileiro (Ed. da UEL, 1997), Socialismo moral e socialismo doutrinário (Ed. UGF, 1997);  Avanços teóricos da socialdemocracia (Ed. UGF, 1997); A democracia liberal segundo Alexis de Tocqueville (Mandarim, 1998), Keynes, doutrina e crítica (Ed. Massao Ohno, 1999) e Estado, cultura y sociedad en la América Latina (Bogotá, Universidad Central, 2000). Além desses é autor de muitos capítulos em outras obras e centenas de artigos científicos.
Rodríguez conhece como poucos o positivismo e sua derivação política no Brasil, o castilhismo. Além disso, aplicou, com grande habilidade, os conceitos da sociologia weberiana no estudo da realidade ibero-americana. Dessa forma, avalia a organização político-burocrática dessas nações a partir dessa sociologia, evitando utilizar categorias marxistas, que Vélez conhece bem, mas avalia não traduzirem a realidade dessas sociedades. Com o conceito de Weber elaborou um outro para explicar o comportamento político nessa sociedade: a ética patrimonial. O que a tipifica? O fato de o homem projetar, no espaço cultural, a consciência de seus limites e desejar encontrar no útero protetor da organização política, aquilo que a vida parece negar. Essa noção de patriominialismo ajuda a entender como os assuntos do Estado são resolvidos como se fossem assuntos familiares, confundindo-se o público e o privado. Esta forma administrativa, o estado patrimonial, teria prevalecido na Rússia e nos países do Leste Europeu, na leitura de Max Weber. Rodríguez e os weberianos brasileiros a ajustaram à realidade ibero-americana. Dialogando com Wanderley Guilherme dos Santos empregou o conceito de autoritarismo instrumental, como o modelo patrimonial de modernização do qual é exemplo a própria revolução de 64 que usa o autoritarismo para promover a modernização da sociedade. Nesse sentido, o movimento revolucionário parece-lhe parte de um processo transitório, enquanto a democratização da economia não se completava.
Na interpretação da cultura ibérica, Ricardo Vélez considera que o patrimonialismo que aqui se estabeleceu é uma espécie de centripetismo privatizante, estruturado em torno da figura do monarca, e foi herança política de um meio cultural igualmente absorvente, a cultura muçulmana. Entre os árabes, que ocuparam por oitocentos anos a península ibérica, a religião universalista e o dirigente protetor eram a garantia contra uma vida insegura e instável. A novidade da leitura de Ricardo é que, para ele, a opção patrimonial não destruiu a tradição contratualista ibérica, afastando-se, assim, da clássica interpretação de Alexandre Herculano. Por isso, a ideia de patrimonialismo pareceu-lhe uma vertente destacada, em alguns períodos da história mais ativa, porém secundária em relação ao desejo da liberdade e um certo gosto pelo individualismo que entre os ibéricos se exteriorizou no direito consuetudinário visigótico, sob cujas bases desenvolveu-se, hoje em dia, a democracia ibérica. Sua interpretação do patrimonialismo modernizador revelou que o movimento podia caminhar em direção a uma sociedade aberta.  Isso porque o patrimonialismo ibérico, como dito, não destruiu o espírito de liberdade, herança do direito visigótico. É nessa tradição que ele estabelece as raízes do pensamento liberal que lhe parece pode modernizar a sociedade brasileira, ao mesmo tempo que dá, à sua interpretação, uma coloração filosófica, que não é evidente na interpretação mais sociológica que Alexandre Herculano realizou da sociedade ibérica.
Para Ricardo Vélez, a superação do patrimonialismo é fundamental, pois ele está associado ao atraso econômico, social e político da sociedade brasileira, completando a influência negativa deixada pela moral contra-reformista, que teve forte impacto entre nós durante mais de três séculos e que popularizou o ódio ao lucro, o desinteresse pelas coisas deste mundo e a avaliação negativa do trabalho entendido como castigo. Parece que, inicialmente, Rodríguez entendeu o movimento que afastou Collor de Melo era uma recuperação dessa raiz visigótica em direção a um liberalismo maduro, mas depois se convenceu que não foi o que ocorreu. Recentemente enxergou nos governos petistas um recrudescimento do patrimonialismo, onde a mistura se deu não entre as coisas da vida privada do governante e do Estado, mas na confusão entre os interesses do Partido e do Estado, o que levou a corrupção generalizada entre os altos dirigentes.
No livro Tópicos especiais da filosofia contemporânea (2001), Ricardo Vélez reconheceu sua filiação à escola culturalista e fez uma análise da tradição pedagógica ibérica, vendo-a marcada pela falta de interdisciplinaridade. Parece-lhe que o motivo foi o papel da teologia no ensino escolástico, substituída, no século XVIII, pela aritmética política pombalina, que não modificou seu caráter. Para superar essa limitação, parece-lhe que a pesquisa continuada e a formação humanística do universitário constituem os caminhos mais seguros para garantir a interdisciplinaridade. Quanto à importância desse humanismo no ensino básico, Ricardo o faz integrar a formação para a cidadania necessária na formação inicial do cidadão.
Isso permite esperar tanto a revalorização das humanidades na formação universitária, às quais Ricardo Vélez sempre deu atenção destacada e é tão necessária quanto a competência técnica e profissional na formação do estudante, quanto a educação interdisciplinar orientada para a formação da cidadania, na escola fundamental, que seria entregue aos municípios, na melhor tradição visigótica.
O aprofundamento das chamadas humanidades representa uma orientação que intelectuais como Ortega y Gasset e boa parte dos fenomenólogos fizeram desde o século passado. Eles pretendiam assim enfrentar a superficialidade e outros males advindos da falta de reflexão presente nas sociedades de massas. Esse estudo consiste no entendimento e aprofundamento do legado que veio desde os tempos clássicos, antiga Grécia e Roma, e foi revisitado no final da Idade Média e Renascença. Nosso sistema educacional não tem cuidado do entendimento e análise dessa tradição, praticando-se uma leitura comentada de raras obras apenas nos seminários de pós-graduação. A disponibilidade de textos na rede mundial de computadores não garante uma leitura proveitosa deles e é importante que a escola possa, do ensino fundamental até a universidade, organizar um programa de estudo desses conteúdos essencial para a formação para a cidadania.
Ricardo Vélez e outros culturalistas (Leonardo Prota e Antônio Paim) elaboraram um programa de estudos das humanidades tendo como referência as escolhas feitas no St. John´s College ou da coleção Great Books da Enciclopédia Britânica, havendo preparado um curso de humanidades sistematizando e comentando algumas obras ali referenciadas. Esse estudo abrangia assuntos e livros da antiguidade clássica, Israel e helenismo, bem como textos da Renascença e do pensamento moderno e contemporâneo.
A finalidade do estudo das humanidades, no âmbito do programa feito Ricardo, Paim e Prota, tem em vista o enfrentamento de dificuldades da sociedade atual. Parece-nos que o desafio a ser vencido é o que resumimos no livro O homem e a filosofia, pequenas meditações sobre a existência e a cultura. 3. ed., Porto Alegre: MKS, 2018, como se segue (p. 62):
É a tradição judaico-cristã e histórico-filosófico-jurídica, sistematizada pelos culturalistas do século XX como raiz axiológica e cognitiva do ocidente, que coloca como desafio de hoje: aproximar a vida singular do espaço cultural. Essa é a forma mais adequada para tratar a vida do homem, inseri-la na cultura. Cultura é, pelo que se disse, tudo o que o homem objetiva como valor, tudo o que referencia na relação com seu entorno. Na ordem das ideias, a distinção entre sujeito e objeto é lógica, na cultura tem caráter existencial. Queremos dizer que a vida tanto é objeto de investigação quanto é experiência singular. Tomando o viver como objeto de investigação, constatam-se os limites do conhecimento e criam-se teorias para explicar o mundo, assumindo a vida como exercício de escolhas experimenta-se existência singular. Por esse motivo, uma meditação sobre o homem precisa considerar que ele cria e absorve cultura, mas o faz segundo exigências existenciais próprias de sua singularidade.




sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Valores cristãos e o nome de Deus pronunciado em vão. José Mauricio de Carvalho Academia são-joanense de Letras





O último processo eleitoral colocou em evidência os valores cristãos. Pelo menos nunca se falou tanto de valores cristãos, embora quase sempre usados como justificativa de pensamentos e ações nada cristãos. Embora o Estado Nacional seja uma instituição laica, seria de fato interessante que houvesse no país real preocupação com os valores cristãos, à parte de qualquer religião, pois os valores cristãos constituem a coluna vertebral da sociedade ocidental construída sobre a liberdade pessoal e de organização, responsabilidade, estado laico e de direito e a democracia política.
Até onde entendo o conceito valores cristãos refere-se àqueles que foram defendidos e ensinados pelo mestre de Nazaré, o filho de um carpinteiro e de uma moça pobre. Por conta de sua mensagem radical na defesa do Reino de Deus ele foi torturado e morto numa cruz. Morto pelo fanatismo religioso de sacerdotes que não viram nele o enviado de Deus e pela omissão da autoridade romana que preferiu cometer uma injustiça flagrante a desagradar esses líderes religiosos judeus. É esse homem de paz, simples e de coração desarmado cuja mensagem de não violência e fraternidade foi aceita pelas multidões. Ele foi reconhecido depois de sua morte e ressureição como enviado especial de Deus e seu legítimo porta voz. A fé cristã nele enxerga pessoa divina a quem Deus mesmo honrou: o filho do Deus criador e partícipe de sua divindade.
Valores cristãos são, portanto, aqueles ensinados por Jesus e registrados nos ensinamentos que ele deixou em textos que a comunidade cristã reconheceu como referências para a construção do Reino de Deus anunciado por Jesus. Ele retomou os valores que vinham do judaísmo, atualizando-os para seus dias. Vamos lá: Amará seu Deus de todo coração e entendimento e não tomará seu nome em vão (de modo nenhum para justificar propósitos nada santos); Honrará o teu pai e tua mãe (cuidando deles e os amparando quando necessário); Não matarás (não apenas isso, mas não prejudicarás, não maltratarás de nenhum modo seu próximo, não o discriminarás, não recusará amparo ao estrangeiro, ao órfão e a viúva), não cometerás adultério (não trairás o amor), não furtarás (respeita as coisas do outro como extensão da pessoa dele que é como tu), não darás testemunho de nada falso (não estarás ao lado da mentira, especialmente quando essa te favorecer. Não espalharás notícias falsas e cuidará para reparar a mentira dita). Jesus disse com todas as letras quem era o pai da mentira, da enganação e da mistificação. A esses valores Jesus ajuntou mais alguns que estão em (Mt. 5, 3-10). Bem aventurados os que têm o coração de pobre (que não se preocupam em ajuntar bens que não usem para fazer o bem), os que sofrem (ou são vítimas de injustiça), os mansos (porque não proclamam a violência, não a praticam, não defendem a tortura ou qualquer forma de perseguição contra o outro), bem aventurados os puros (que buscam com firme propósito o Reino de Deus, que não se afastam dos seus ensinamentos), os pacíficos (porque não estimulam a violência, a atrocidade, a barbárie) e os misericordiosos (porque perdoam os limites dos outros homens que são como ele próprio imperfeitos). Em resumo, avaliou a Igreja, viver na fé em Deus, na esperança de sua promessa de salvação e na pratica da misericórdia ou amor ao próximo.
Com esse conjunto de valores cristãos, Jesus não queria falar de diferentes tipos de pessoa, mas propor atitudes para orientar o homem que espera e confia em Deus. E sabedor de que não consegue viver tudo isso viver na santidade requerida é também humilde e reconhece sua insuficiência diante de Deus. Esses valores foram agregados à ideia de pessoa humana para qualificar o ser que é singular, capaz de escolher livremente e se responsabiliza pelo que faz. Pessoa humana que se tornou o valor mais importante do ocidente e foi trazido para o ordenamento jurídico das principais nações do ocidente. Esses são os valores cristãos.


sexta-feira, 16 de novembro de 2018

A ESQUERDA NA AMÉRICA LATINA. Selvino Antonio Malfatti



Sr. Garcia
.
Como era vista esquerda e direita no passado?  O de esquerda acha que o de direita o USURPOU; o de direita acha que o da esquerda quer USURPÁ-LO. Em outras palavras, o primeiro acha que o outro o roubou e o segundo acha que primeiro quer roubá-lo.
Quem está com a razão. Cada um apresenta centenas de razões a seu favor!
Sociologicamente e politicamente, desde que se instituiu o regime representativo, ora a direita é hegemônica, ora a esquerda. Não é uma gangorra que sobe e depois desce, mas um pódio que cada um, ora sobe, ora desce, e vice-versa.
De momento, na América Latina e - em parte no ocidente - assistimos o refluxo da esquerda.
No início do século XXI parecia que a esquerda, na América Latina, não terminava mais a orgia de poder. A tonalidade do mapa era um mar cor de rosa que cobria o solo, mas há pouco mudou para azul. O golpe de misericórdia parece ter sido dado no Brasil com a vitória de Bolsonaro. A partir de 1º de janeiro, o maior país da América Latina, será governado por alguém que não esconde dizer e agir como de direita sem adjetivos. “Para os vermelhos”, como dizia na campanha, “lhes resta o cárcere ou o exílio”.
Mas não é só o Brasil. Não faz um ano, Chile vota-se para direita. Na Colômbia Ivan Duque puxou o freio da esquerda. O México deixou um vislumbre de esperança para esquerda com Andrés Manuel López Obrador. A má vontade de interessar-se pela política ao sul da América tem minado a esperança da esquerda. Para piorar a situação o autoritarismo dos países da Venezuela e Nicarágua nada recomenda para a esquerda. O desafio para dar meia-volta para a esquerda parece uma travessia de deserto. Nem mesmo a voz do octogenário ex-presidente uruguaio, José Mujica, convenceu a esquerda que sempre pensa na vitória final. Diz Mujica: “ No hay derrota definitiva ni triunfo definitivo”.
A esquerda de ontem não é mais igual a de hoje. Até então, no passado, o pêndulo oscilava do centro-esquerda da Concertación chilena e a Frente Amplio de Uruguay até o autoritarismo extremado do militar Hugo Chevez na Venezuela tendo apoio do cubano Fidel Castro. No meio campo ficava Nestor e Cristina Kirchner que reformaram o populismo de esquerda da Argentina, Lula do Brasil e Evo Morales da Bolívia, sindicalistas provenientes de movimentos sociais. Desenvolveram políticas tradicionais e externamente agiram pragmaticamente.
A outra esquerda, a de outrora, se aglutinava em organismos regionais de integração, tais como União das Nações Sulamericanas, a Comunidade dos Estados Latinoamericanos e caribenhos e Aliança Bolivariana para os povos de nossa América. Hoje estes organismos encontram-se agonizantes.
Parece que a crise da esquerda na América Latina atualmente está relacionada com o descrédito de Hugo Chaves e Fidel Castro, após suas mortes, e o colapso da Venezuela. Além disso, e na mesma esteira, estão os governos ditatoriais de Nicolas Maduro na Venezuela e Daniel Ortega na Nicarágua. A repressão de outrora do líder sandinista tem sido criticada sem dó nem piedade pela própria esquerda em nível global e a ambiguidade da Venezuela desmerecem totalmente os governos de esquerda na América Latina.
Desde que a esquerda defina-se por governos democráticos representativos, com submissão ás regras destes regimes, certamente voltarão a merecer os votos dos eleitores e poderão governar seguindo suas plataformas, tal como acontece com as esquerdas europeias. E os organismos regionais abandonem a ideia de implantar o comunismo, pois somente os intelectuais ainda creem nele. O povo por sua vez, mais pragmático, somente quer a possibilidade de bem estar.
Quanto à direita....fica para um próximo artigo.


sexta-feira, 9 de novembro de 2018

UM ROTEIRO PARA O MEC - Prof. Dr. Ricardo Vélez Rodríguez









Amigos, escrevo como docente que, através das vozes de algumas pessoas ligadas à educação e à cultura (dentre as quais se destaca o professor e amigo Olavo de Carvalho), fui indicado para a possível escolha, pelo Senhor Presidente eleito Jair Bolsonaro, como ministro da Educação.
Aceitei a indicação movido unicamente por um motivo: tornar realidade, no terreno do MEC, a proposta de governo externada pelo candidato Jair Bolsonaro, de "Mais Brasil, menos Brasília". Acho que o nosso Presidente eleito ganhou definitivo apoio da sociedade brasileira no pleito eleitoral recente, em decorrência de um fator decisivo: ele foi o único candidato que soube traduzir os anseios da classe média, que externou a insatisfação de todos os brasileiros com os rumos que os governos petistas imprimiram ao país ao ensejar uma tresloucada oposição de raças, credos, nós contra eles, como se não pudêssemos, os habitantes deste país, sedimentar alguns consensos básicos em relação ao nosso futuro. Jair Messias Bolsonaro foi eleito em razão deste fato: traduziu, com coragem e simplicidade, os anseios da maioria dos eleitores. A sua campanha, carente de tempo na mídia e de recursos, ameaçava não decolar. Decolou, e, mais ainda, ganhou as praças e ruas, através de meios singelos de comunicação como o Smartphone e a Internet, coisas que o brasileiro comum utiliza no seu dia a dia desta quadra digital da nossa sociedade tecnológica.
Como professor e intelectual que pensa nos paradoxos estratégicos do Brasil, apostei desde o início no candidato Bolsonaro. Achei a sua proposta de escutar o que as pessoas comuns pensam uma saída real para a insatisfação e a agonia que as sufocavam, nesses tempos difíceis em que se desenhava, ameaçadora, a hegemonia vermelha dos petistas e coligados. Graças a Deus o nosso candidato saiu vencedor, numa campanha agressiva em que foram desfraldadas inúmeras iniciativas de falseamento das propostas e de fake news, e em que pese o fato de que ele próprio tivesse de pagar um preço alto com a facada de que foi vítima em Juiz de Fora, desferida por um complô do crime organizado com os radicais de sempre.
Enxergo, para o MEC, uma tarefa essencial: recolocar o sistema de ensino básico e fundamental a serviço das pessoas e não como opção burocrática sobranceira aos interesses dos cidadãos, para perpetuar uma casta que se enquistou no poder e que pretendia fazer, das Instituições Republicanas, instrumentos para a sua hegemonia política. Ora, essa tarefa de refundação passa por um passo muito simples: enquadrar o MEC no contexto da valorização da educação para a vida e a cidadania a partir dos municípios, que é onde os cidadãos realmente vivem. Acontece que a proliferação de leis e regulamentos sufocou, nas últimas décadas, a vida cidadã, tornando os brasileiros reféns de um sistema de ensino alheio às suas vidas e afinado com a tentativa de impor, à sociedade, uma doutrinação de índole cientificista e enquistada na ideologia marxista, travestida de "revolução cultural gramsciana", com toda a coorte de invenções deletérias em matéria pedagógica como a educação de gênero, a dialética do "nós contra eles" e uma reescrita da história em função dos interesses dos denominados "intelectuais orgânicos", destinada a desmontar os valores tradicionais da nossa sociedade, no que tange à preservação da vida, da família, da religião, da cidadania, em soma, do patriotismo.

Na linha dos pre-candidatos ao cargo de ministro da Educação foram aparecendo, ao longo das últimas semanas, propostas identificadas, uma delas, com a perpetuação da atual burocracia gramsciana que elaborou, no INEP, as complicadas provas do ENEM, entendidas mais como instrumentos de ideologização do que como meios sensatos para auferir a capacitação dos jovens no sistema de ensino.
Outra proposta apareceu, afinada com as empresas financeiras que, através dos fundos de pensão internacionais, enxergam a educação brasileira como terreno onde se possam cultivar propostas altamente lucrativas para esses fundos, mas que, na realidade, ao longo das últimas décadas, produziram um efeito pernicioso, qual seja o enriquecimento de alguns donos de instituições de ensino, às custas da baixa qualidade em que foram sendo submergidas as instituições docentes, com a perspectiva sombria de esses fundos baterem asas quando o trabalho de enxugamento da máquina lucrativa tiver decaído. Convenhamos que, em termos de patriotismo, essas saídas geram mais problemas do que soluções.
Aposto, para o MEC, numa política que retome as sadias propostas dos educadores da geração de Anísio Teixeira, que enxergavam o sistema de ensino básico e fundamental como um serviço a ser oferecido pelos municípios, que iriam, aos poucos, formulando as leis que tornariam exequíveis as funções docentes. As instâncias federal e estaduais entrariam simplesmente como variáveis auxiliadoras dos municípios que carecessem de recursos e como coadunadoras das políticas que, efetivadas de baixo para cima, revelariam a feição variada do nosso tecido social no terreno da educação, sem soluções mirabolantes pensadas de cima para baixo, mas com os pés bem fincados na realidade dos conglomerados urbanos onde os cidadãos realmente moram.
Essa proposta de uma educação construída de baixo para cima foi simplesmente ignorada pela política estatizante com que Getúlio Vargas, ao ensejo do Estado Novo, pensou as instituições republicanas, incluída nela a educação, no contexto de uma proposta tecnocrática formulada de cima para baixo, alheando os cidadãos, que passaram a desempenhar o papel de fichas de um tabuleiro de xadrez em que quem mandava era a instância da União, sobreposta aos municípios e aos Estados.

"Menos Brasília e mais Brasil", inclusive no MEC. Essa seria a minha proposta, que pretende seguir a caminhada patriótica empreendida pelo nosso Presidente eleito.

Postado por Ricardo Vélez-Rodríguez às 03:32

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