sexta-feira, 27 de abril de 2018

O Mito, o conceito e sua deturpação.José Mauricio de Carvalho Academia de Letras de São João del-Rei





No decorrer da história da cultura a palavra mito teve significados distintos desde que surgiu entre os antigos gregos. Platão a concebeu como forma deturpada de verdade ou como aquilo que se distancia de uma narrativa verdadeira. Aristóteles elaborou na Poética essa compreensão e a apresentou não somente como falsa narrativa, mas como maneira aproximada ou simbólica de dizer algo. Esta noção de verdade aproximada abriu espaço para uso do termo como narrativa simbólica com valor moral ou religioso e assim passaram a ser nomeadas as narrativas cosmogônicas ou soteriológicas, isto é, que narravam as origens ou fins do universo de uma perspectiva religiosa, como se vê na Bíblia.
Entre os modernos a palavra mito adquiriu um sentido não reconhecido na antiguidade. Um dos responsáveis por essa virada gnosiológica foi o italiano Giambattista Vico que enxergou nas narrativas mitológicas não inverdades ou verdades diminuídas, mas uma outra forma de dizer a verdade. E ele observou que é possível comunicar uma verdade de várias maneiras. Disse ainda que os povos ao narrarem sua origem se valia de caracteres poéticos e simbólicos para expressar aspectos difíceis de serem transmitidos numa linguagem lógica e discursiva. Porém, foi no idealismo alemão que o mito ganhou uma significação mais elaborada ao ser apresentado como uma espécie de religião natural, isto é, forma natural pela qual ocorre a manifestação do Absoluto entre os povos. O grande articulador dessa forma de pensar foi Friedrich von Schelling autor de uma Filosofia da mitologia, onde avalia as narrativas mitológicas como manifestação da divindade na natureza.
O pensamento contemporâneo retomou as considerações do idealismo alemão para destacar na narrativa mítica uma realidade decorrente da compreensão fenomenológica de entender o mundo. Para os fenomenólogos sempre que se pensa se está pensando algo. Daí a expressão consciência de, para traduzir esse entendimento de que se é a consciência subjetiva que pensa o mundo, como ensinou Descartes, ela pensa o mundo representando-a nela ou o medindo segundo suas possibilidades. Por isso, Ernest Cassirer no Ensaio sobre o homem trata essas formas simbólicas ou poéticas de descrever as origens como reveladora da distância existente entre o símbolo e o que ele representa. Assim as narrativas míticas, embora privadas de rigor lógico, não são incoerentes se observadas na ótica dos sentimentos, que são muito fortes entre os primitivos.
A Sociologia moderna trouxe esse entendimento contemporâneo para descrever o surgimento de elementos de formação dos grupos. Esse uso foi deturpado na linguagem comum. Isso ajuda a entender o uso despropositado que passa ser feito do conceito para representar um homem e sua liderança. A extrema direita foi campeã nesse uso deformado do conceito ao veicular a ideia de que Hitler ou Mussolini eram mitos. Isso andou meio esquecido em razão dos destinos da guerra. Aproveitando-se da ignorância geral a direita brasileira está assanhada tentando propor outro mito ou de fazer a sociedade engolir outro mico.



10 comentários:

  1. Li, muito interessante.

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  2. Sempre que se pensa, se pensa algo.
    Mas quando os homens estão pescando, o cérebro se esvazia.

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    1. Pois concordo com você, so na pescaria se escuta a voz do silêncio.

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    2. Estamos carentes de grandes líderes, portanto não temos mitos, tanto os bons ou ruins morreram.

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  3. Um mito não deve ser MICO, mas nosso povo sofrido, perde-se e tem dificuldades para processar tanta falácia dos ditos Representantes da sociedade.

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  4. A sociologia moderna explica o momento que estamos vivendo?
    Será que um dia os eleitores serão respeitados.

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  5. Uma grande interpretação do momento histórico.

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  6. Uma grande interpretação do momento histórico.

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  7. Estamos com tantas crises e sem mitos que fabricamos o oposto como mito, na verdade é mico.

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  8. Claro, estamos engolindo MICOS,faz tempo, somos patos.

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