A
geração pombalina começou a preparar a transição em Portugal da monarquia
absoluta para uma monarquia representativa. Era o século XVIII e o iluminismo
oferecia um novo olhar para o mundo. Emergia, naqueles dias, a confiança na
capacidade da razão conhecer o mundo, escolher a justiça e organizar a
política. Acreditava-se no progresso dos povos e melhoramento das sociedades
pelo uso da inteligência e distanciamento dos radicalismos
e fanatismos, com tripartição do poder estatal, liberdade religiosa e civil. Um
poder absoluto e autoritário não parecia coisa aceitável para cidadãos daqueles
dias.
Então
pensavam os portugueses em dar um novo rumo a sua organização política, mas um
fato mudou as prioridades no início do século XIX, a ameaça napoleônica. Então
a segurança do Estado lusitano ganhou urgência e a família real veio para o
Brasil, um lugar mais seguro para ser a sede da monarquia lusitana, longe das
disputas políticas da Europa. E a vinda do rei mudou a vida na antiga colônia, surgiu
a Biblioteca Nacional, o Jardim Botânico, fundaram-se as Escolas Superiores,
criou-se a Imprensa Régia, houve a abertura dos portos ao comércio e muitas
outras ações para solidificar o novo centro do Império Lusitano. Quando o rei
retornou a Portugal doze anos depois da chegada, para apaziguar disputas
internas, não sendo mais Napoleão Bonaparte uma ameaça, deixou para traz um
povo com lideranças conscientes de sua singularidade e importância. Os
habitantes do Reino já não mais concordariam em retornar a condição anterior à estada
do rei.
Assim,
quando Portugal tentou fazer as coisas retornarem ao que antes eram percebeu
que não mais seria possível. O jovem imperador que Dom João VI deixara aqui foi
sensível a esse sentimento autóctone e desejo de autonomia e liberdade. Então
ele comandou o processo de independência política, com rápido êxito e poucas
resistências. Afinal, era Pedro I o mesmo monarca de antes, herdeiro do trono
português, apenas agora na frente de um Estado independente. As dificuldades
para estabilizar o poder foram vencidas e surgiu o Império do Brasil.
O
Império brasileiro nasceu com algumas contradições, tinha uma raiz liberal construída
por Silvestre Pinheiro Ferreira e pela geração pombalina, mas continuava escravocrata,
tinha um Imperador culto, mas um povo pouco estudado, ansiava pela liberdade
religiosa, mas vivia sob o padroado. No entanto, manteve a estabilidade
política e a força da inteligência de seu chefe: D. Pedro II, pelo menos na
maior parte do tempo. Não era preciso provar a validade da ciência e de seus
resultados, até os pouco estudados a reconheciam. Lutava o governo central para
assegurar a unidade do Estado e a unidade dos brasileiros diante de revoltas
regionais. A República, no final do século XIX, deu o passo que faltava no que
se refere a separação entre Igreja e Estado e na confiança definitiva da
ciência, mas perdeu a estabilidade institucional com as revoluções que
protagonizou.
Nas
últimas três décadas, finalmente, alcançamos uma razoável estabilidade
política, o vigor das instituições da República cresceu e parecíamos manter
outros consensos fundamentais ao Estado Moderno: investimento na universidade
pública, confiança na ciência, separação Estado x Igreja, preservação dos
direitos civis e humanos, preservação ambiental, estado de direito,
independência entre poderes. Porém, de repente, o produto de décadas encontra-se
sob suspeição. Que a festa da independência seja a reunião de uma pátria unida
e respeitosa desses consensos que foram construídos durante anos de esforço e
esclarecimento. Isso porque é antigo como o Evangelho (Mt. 12,25): "Todo reino dividido contra si mesmo será
arruinado, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá.” Que
a festa do Brasil não seja um passo para trás na nossa história.