sexta-feira, 8 de março de 2013

Outro século e um mundo novo. José Maurício de Carvalho.





O século XXI se apresenta como um tempo onde as guerras entre Estados são raras, mas em que crescem os movimentos terroristas, revoltas étnicas e de forças isoladas de radicais religiosos, políticos e/ou grupos marginais que sobrevivem da droga e sequestros. Embora inimagináveis no cenário político até o século XX, quando os Estados Nacionais eram forças soberanas, estes novos grupos fazem coisas impensáveis até poucas décadas, como foi o ataque da Al Qaeda ao mais poderoso país da terra.  
Outro exemplo deste novo mundo, onde os Estados Nacionais deixaram de ser o monstro preconizado por Thomas Hobbes (Leviatã), monstro sempre capaz de esmagar pequenos grupos, é a invasão do Mali. A República do Mali é país da África Ocidental, tem nove milhões de habitantes espalhados por um território de mais de um milhão e duzentos mil km², superfície duas vezes maior que o Estado de Minas Gerais. Esta República, para os que estudaram nos antigos mapas da África, é o antigo Sudão francês que adotou o este nome depois da independência, em 1960.
Com a independência obtida há pouco mais de cinqüenta anos, a República do Mali nunca passou por período significativo de paz e estabilidade política. Já enfrentou revolta militar em 1968, Guerra contra Burkina Faso, em 1985 e outra revolta militar, em 1991, desta feita com a suspensão da Constituição. Este país de nove milhões de habitantes encontra-se ameaçado por uma força de menos de 6000 homens de quatro grupos diferentes: a conhecida Al Quaeda (serpente de muitas cabeças), os Defensores da fé, o Movimento Jihadista do oeste da África e a Brigada de Sangue. São grupos terroristas, formados por radicais islâmicos reforçados por cerca de mil guerreiros tuaregs, povo nômade (berbere) com cerca de um milhão de pessoas divididas em confederações. As confederações berberes se esparramam pelo território líbio, do Niger e adjacências e tinham relações de amizade com o ex-ditador Muamar Kadafi. Encontram-se sem espaço no novo governo da Líbia e entraram na guerra do Mali. Os grupos de radicais islâmicos, embora tenham origem diversa, convergem na filiação ao terrorismo e no uso da força para impor a Sharia, o terrível código de leis derivado do Corão. Em pouco tempo aterrorizaram a população da parte oriental do Mali, impondo-lhes a lei islâmica, enquanto as frágeis forças militares do país recuaram para a defesa da capital.
Depois de ter metade do território tomado pelos terroristas e o risco de perder o restante, o governo de Bamako (capital do Mali) fez o que parecia inimaginável: solicitou ajuda da antiga Metrópole. Encurralado pela circunstância e com antigos laços com a ex-colonia, o governo francês lançou uma ofensiva contra os terroristas. A França espera vencê-los rapidamente e passar o controle da ex-colonia a uma força internacional formada pela Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental.
A instabilidade na África Ocidental afeta muitos interesses ocidentais inclusive brasileiros, confiantes que estamos na retirada do petróleo do pré-sal. Dificilmente nossa marinha conseguirá enfrentar em alto mar, sem apoio terrestre, piratas e forças terroristas sediadas em algum país da África Ocidental controlado por terroristas.
Esta é mais uma razão para a aproximação entre países lusófonos, cujos interesses em torno da língua comum, costumes parecidos e negócios emerge neste novo mundo de configuração inimaginável há algumas décadas. Apenas para lembrar a Guiné-Bissau (outro país lusófono) está ao lado da confusão no Mali e seus dirigentes assistem preocupados os rumos do conflito.

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