O
mau uso dos ensinamentos de Jesus de Nazaré, transformados em trampolim
político ou simplesmente pervertidos para enriquecer empresas que se apresentam
como suas seguidoras, deu origem ao que um juiz da Suprema Corte nomeou de
cristianismo do mal. Naquela ocasião mostrei que não há e nem haverá um tal
cristianismo, mas existe a deturpação da mensagem de Cristo usada para o mal. E
essas empresas que fazem isso acabaram não só deturpando a mensagem libertadora
e sagrada do Filho de Deus, como provocam o adoecimento e a neurose de muita
gente. Há casos em que essas empresas contribuem para aumentar a culpa ao focar
no pecado e punições do Altíssimo e, assim, levar à depressão e multiplicar a
baixa estima entre seus infelizes seguidores. Todas as ameaças colocadas a
serviço do aumento de receitas da empresa, estimulada enlouquecidamente por quem
deveria dar de graça o que de graça receberam. A
frase “de graça recebestes, de graça dai” (Mt 10,8) mostra que o Filho de
Deus não aprova a comercialização dos seus ensinamentos, embora pareça
legítimo ao pregador ganhar uma retribuição por seu trabalho e o templo obter
os recursos para sua manutenção. Porém isso está
longe de autorizar o enriquecimento dessas instituições.
Se
o mau uso dos ensinamentos evangélicos produzem neurose e baixa-estima, além de
patrocinarem projetos políticos anticristãos, a mensagem religiosa que aponta
para o alto e se mantém fiel aos ensinamentos de Jesus, não apenas oferece a
porta de entrada para o Reino de Deus, mas ajuda o fiel a ter uma vida mais
significativa e valiosa. Com base no diálogo com Deus, ele enfrenta com mais
efetividade e confiança as adversidades naturais da vida e recupera-se mais
facilmente dos problemas emocionais. Esses assuntos se tornaram objeto de
estudo de uma linha de pesquisa psicológica que ganhou força e reconhecimento
em Faculdades de Medicina mundo afora com a linha de pesquisa religião/espiritualidade e saúde. Próximo
de nós, o melhor representante desses estudos é o NUPES da UFJF, dirigido pelo
Dr. Alexander Moreira-Almeida que reúne a sua volta um talentoso corpo de
pesquisadores.
No
livro Viktor Frankl e a psiquiatria (Porto
Alegre, MKS, 2019, 338 p.) e ainda mais em Viktor
Frankl e o inconsciente (Porto
Alegre, MKS, 2021, 348 p.) chamamos atenção para a importância de uma vida com
sentido e do papel que a religião e a espiritualidade possuem como fator gerador
de saúde mental, bem como para os desvios e razões para a negligência da
transcendência na psiquiatria ocidental, devido a influência do positivismo e
do materialismo nas Faculdades de Medicina. Os dois livros examinam os ensinamentos
do filósofo e psiquiatra Viktor Frankl, um dos notáveis representantes da
psicologia fenomenológica, cujo diferencial foi a revisão da psicanálise e a
abertura ao transcendente estimulada pelos estudos que fez de Martin Buber.
É interessante a forma como essa linha de investigação psiquiátrica examina, com crescente interesse e isenção, os efeitos positivos da Religião/Espiritualidade na saúde mental. Esse assunto ganha diariamente novos estudos como mostrou recentemente H. G. Koenig no artigo Religião, espiritualidade e saúde: a pesquisa e as implicações clínicas. Ali ele diz que (KOENIG, H.G. Religion, Spirituality, and Health: The Research and Clinical Implications. ISRN Psychiatry. 2012 b; 2012: 278730. Published online 2012 Dec. 16.): “Na primeira edição do Handbook [27], identificou 110 estudos publicados antes do ano 2000 e 344 estudos publicados entre 2000 e 2010, totalizando 454 estudos. Entre esses relatórios estão descrições de como religião e espiritualidade ajudaram as pessoas a lidar com uma ampla gama de doenças e/ou uma variedade de situações estressantes.”
E na cuidada síntese que
H.G. Koenig produziu está demonstrado não só o aumento dos estudos sobre o
assunto, mas a comprovada influência sobre a saúde mental de uma fé religiosa
esclarecida. E quem diz isso são os atuais e cuidadosos estudos de medicina que
foram antecipados por Viktor Frankl em seus trabalhos sobre a logoterapia. E os estudos resumidos por
Koenig comprovam aquilo que filósofos como Karl Jaspers escreveram (Os mestres da humanidade, Coimbra, Almedina, 2003, p. 139): “Jesus demonstrou a
libertação da angustia existencial no assumir da cruz.” E a quem ele se dirigia
com seus maravilhosos ensinamentos (id., p. 136): “a qualquer pessoa que
encontrasse. Todos lhe convinham. O importante era proporcionar a iluminação
interior, através da qual crente vê e ama.” Assim, iluminados, eles abriam as
portas do Reino de Deus.