Não sou da área da saúde, nem biólogo e muito menos químico. Dedico-me às ciências humanas, mais precisamente à sociologia e filosofia. No entanto, penso que o provérbio popular de que a saúde é demasiado importante para ser deixada só para médicos – adágio este citado por Mark G. Field, da Escola da Universidade de Harvard de Saúde Pública - tem sua razão de ser, desde que se enxergue o homem como um ser multidimensional.
E esta me parece deva ser a postura em relação ao problema (ou epidemia ou praga?) das drogas, mormente o crack. Por isso, quero me deter um momento neste. Sabemos que há nas ruas do Brasil um milhão de usuários, entre 15 a 25 anos. Esta droga basta ser experimentada uma só vez e o sujeito está indelevelmente viciado. A vontade de querê-la aloja-se no cérebro e ninguém mais consegue extirpá-la. A ânsia de fumar mais uma pedra é incontrolável. O usuário sempre vai querer mais uma, outra e outra mais. A fissura pela droga aumenta na medida em que a vontade for satisfeita. Um pesadelo infindável.
O tratamento é prolongado, caro e nada animador. Somente 10% conseguem manter-se na abstinência por que, conforme alguns, curar não cura mais. A vigilância se torna eterna. Como diria Dante Aleghieri na entrada do Inferno: abandonai toda esperança vós que entrais (lasciate ogni speranza voi ch´entrate).
E nada de impactante se faz. Isto significa que o Brasil está jogando no ralo seu maior potencial dos próximos anos: seres humanos inúteis a si mesmos e aos outros. Serão cidadãos que vão necessitar de tudo por que se tornarão totalmente incapacitados. Não estudarão, não terão profissão, não formarão famílias, não trabalharão. E o pior de tudo, é que, como diria Sartre, isoladamente será um esforço inútil da sociedade e de si mesmos. Como mortos-vivos, carregam seu próprio corpo, perambulando nos lares e ruas, roubando e destruindo tudo o que encontram pela frente para saciar o vício. Destroem famílias, matam seus próprios pais ou irmãos, cidadãos inocentes. É uma guerra “sem reféns”. E o pior, neste cenário, tudo o que for feito por si sós, em termos de esperança, muito pouco valerá.
O crack é uma guerra que o Brasil – e outros países – enfrenta. Numa guerra as divergências políticas, religiosas, científicas, educacionais devem ceder lugar à união. É preciso deixar de lado picuinhas e se focar no principal. E o principal são nossos jovens dizimados pela pior de todas as drogas, a cocaína em pedra, fumada em cachimbos de fabricação caseira.
Mas o que fazer? Não é fácil, mas muitas vezes de onde menos se espera pode vir uma sugestão luminosa. A minha é esta. Convido outros a apresentarem sugestões. É preciso organizar um grupo – tarefa, nos moldes de uma operação de guerra, fechando todos os espaços físicos, sociais, políticos e jurídicos. A presidência (deve ser a presidência para haver legitimidade e respeitabilidade) nomeará um coordenador nacional. Este instará junto aos governos estaduais e distrito federal para que os governadores façam o mesmo que a presidência. Os coordenadores estaduais se encarregarão para que haja coordenadores municipais. A estes coordenadores das três esferas se aglutinarão autoridades e lideranças – federais, estaduais e municipais - para uma ação conjunta terapêutica, educativa, preventiva e repressiva à cocaína e ao crack, envolvendo usuários e distribuidores. É possível? Sim. Já há experiências com relativo sucesso. Por que não aperfeiçoá-las?