Em 2005 toma posse pela primeira vez como chefe de
governo, no cargo de chanceler – na Alemanha equivalente a primeiro ministro -
a senhora Angela Merkel, tendo como legado nada mais e nada menos do que Konrad
Adenauer. A partir de então, por dez anos consecutivos timoneia os rumos da
política alemã com desdobramentos na Europa, no ocidente e outras partes do
mundo. Neste primeiro decênio, em meio a crises de todo gênero ela conseguiu
colocar uma Alemanha destroçada pela guerra como líder do Velho Continente.
Com efeito, após o fim da II Grande Guerra a Alemanha foi
dividida em oriental e ocidental em 1949, porém, pouco a pouco, cada uma delas
iniciou uma vida política própria. A oriental praticamente se tornou satélite
da URSS, subordinando-se às decisões superiores de Moscou. A ocidental,
paulatinamente, retoma a vida autônoma. Nesse contexto, o renascimento dos
partidos políticos, na ocidental, ocorreu com as primeiras eleições
administrativas em 1946, quando se apresentaram à disputa os democratas
cristãos, os sociais democratas e os liberais, permanecendo esses por quase
meio século na arena política. Na zona dominada pelos soviéticos, os sociais
democratas e os comunistas são obrigados a se fundirem, dificultando a
competição para os demais partidos, como os democratas cristãos.
Em 14 de agosto de 1949, realizam-se as eleições na
República Federal da Alemanha que dão a vitória aos democratas cristãos sob a
liderança de Konrad Adenauer, o qual, em setembro, forma o primeiro gabinete de
centro-direita, com os liberais e outros partidos conservadores. Adenauer
escolhe para ministro Ludwig Erhard que leva adiante uma proposta
político-econômica da economia social de mercado.
Com o democrata cristão Adenauer no governo, no cargo de
chanceler, e Erhard como ministro da economia, a Alemanha reingressa no
concerto das nações democráticas ocidentais. A União Cristã Social – CDU e CSU
– permaneceu hegemônica até 1966, quando se inaugura um governo de coalizão com
os sociais democratas.
Do mesmo modo que em outros países da Europa, a partir da
década de sessenta, começa o período de decréscimo em termos eleitorais dos
democratas cristãos, embora com momentos de recuperação. A queda maior, porém, ocorrerá a partir de
1998, com a vitória do partido social-democrático e de seu candidato Gerhard
Schoeder. Finda então a era de Helmut Kohl, chanceler desde 1982. E, em novembro de 1999, eclode o escândalo
dos “fundos negros”, após a descoberta de uma colossal evasão fiscal. Parte
teria ido parar na CDU, liderada por Helmut Kohl. O acontecimento colocou em
xeque o próprio partido, deixando dúvidas sobre sua sobrevivência.
Naquela manhã de dois lustres atrás, quando Gerhard Schröder,
que havia vencido as eleições dois meses antes, abriu o caixa-forte e entregou
para Angela Merkel as chaves da chancelaria. Junto recebeu dois coisas: os
presentes de Sílvio Berrlusconi ao seu predecessor e a reforma do trabalho
feita por Schröder. Os presentes de Berlusconi tinham pouca importância, mas a
reforma do mercado de trabalho foi sendo construído paulatinamente e com
pertinácia por Frau Merkel. Como consequência a economia da Alemanha tornou-se
uma potência mundial. A antiga garota trazida por Helmut Kohl, logo após a queda
do Muro de Berlim, tinha duas qualidades essenciais para a política, aliás,
previstas por Maquiavel: sorte (fortuna) e flexibilidade (virtù) com as quais
pode resistir às investidas ao poder e tornar-se a líder mais longeva da União
Europeia.
Ao mesmo tempo determinada, consegue manter o controle do
sistema nervoso. É mais flexível que Schröder ou Helmut Schmidt. É provida de
enorme capacidade física, apesar da condição de mulher, mas ao mesmo tempo
afasta-se da prepotência, característica esta intolerável num mundo
democrático.
Merkel foi forjada na crise. A de 2008 quando liderava um
governo de grande coalizão com os sociais-democratas. A do euro e da Grécia em
2010 – 2011, como Chanceler de uma coalizão com os liberais. A de 2015 ainda
com a Grécia de Tsipras e Ucrânia. A da massa de refugiados que chegavam à
Alemanha, em torno de 850.000 em dez meses. Esta postura com os refugiados ao
mesmo tempo lhe causou embaraços, mas também recebeu aplausos ao declarar que a
constituição alemã garante aos refugiados de guerra, asilo político. Isto
salvou a honra da Europa, mas criou divisões no governo e nos partidos de
apoio. Tudo isso em meio a crises bancárias, caso OPEL da indústria
automobilística, movimentos xenófobos, o escândalo da Volkswagen, viagens pelo
mundo (347 fora das fronteiras), relações tensas com Obama e sobretudo com
Putin. Mas ela, impávida, sempre clarividente e segura no que fazia conduzia a
Alemanha que, do fundo do poço, chegou ao topo.