A
vitória de Donald Trump no recente processo eleitoral americano foi
surpreendente para os órgãos de comunicação, pois as pesquisas eleitorais não o
apresentavam como ganhador. Apesar das projeções em contrário, ele foi eleito o
45º Presidente no sistema eleitoral norte americano que nem sempre consagra
como vitorioso o candidato mais votado.
Contudo, a eleição de Trump, se foi surpreendente por contrariar as previsões
das pesquisas, não surpreende se compreendida como parte da onda direitista que
ganhou força em diferentes países do ocidente nas últimas décadas. Ela reapareceu
alimentada pelo terrorismo islâmico, pelo fanatismo religioso e pela migração
em massa para a Europa.
Dessa
onda direitista fazem parte a eleição de Theresa May como Primeira Ministra da
Inglaterra e a saída do Reino Unido da Comunidade Europeia. Theresa May está
conduzindo com entusiasmo e vigor o afastamento do Reino Unido da Comunidade
Europeia, acelerando a revogação das leis da CE, de 1972, que haviam sido
integradas à legislação britânica. Ela assumiu no lugar do Primeiro Ministro
Conservador, do mesmo Partido, David Cameron, por sua vez defensor da
permanência do Reino Unido na Comunidade Europeia. Essa lembrança serve para
destacar que o movimento para a direita é complexo e embora tenha conteúdo
partidário no bem definido modelo eleitoral europeu, às vezes transcende os Partidos.
May assumiu no lugar de Cameron, que era do seu Partido, mas desejava a
permanência do Reino Unido na CE. O próprio Trump nunca foi o candidato
preferido dos principais representantes e dirigentes do Partido Republicano pelo
qual se elegeu.
Dessa onda direitista também fazem parte o
crescimento de partidos nacionalistas em vários países. Os que têm maior
visibilidade são o Partido de Geert Wilders (Partido para a Liberdade - PW) que,
mesmo perdendo as eleições da Holanda, tiveram aumento significativo de
representantes parlamentares e a Frente Nacional na França (FN), pela qual
Marine Le Pen deverá ser candidata a Presidente da França nas próximas eleições.
O reaparecimento e articulação da direita francesa remonta a 1972, quando a FN foi
fundada reunindo diversas forças nacionalistas sob a liderança de Jean Marie Le
Pen, pai da atual candidata à Presidência Francesa.
Historicamente
Direita e Esquerda nasceram, como categorias, na Revolução Francesa para
separar posições conservadoras de outras mais comprometidas com as mudanças. Na
segunda parte do século XX foram categorias usadas para separar o mundo livre do
mundo comunista, numa divisão conhecida como guerra fria. Contudo, é preciso cuidado
e atenção aos fatos se quisermos entender a direita contemporânea. A questão
não opõe, hoje em dia, capitalistas a socialistas como foi até recentemente, embora
possa ajudar a caracterizar as diferenças entre ambos. A direita de hoje se
caracteriza pelo forte nacionalismo, protecionismo econômico, rejeição da
migração, forte repressão da criminalidade, deportação de imigrantes ilegais. Surge
como resposta de grupos nacionalistas aos fortes movimentos migratórios para a
Europa e América do Norte e à expansão islâmica.
A
direita contemporânea também é diferente da concepção de direita da primeira
metade do século passado. Os exemplos mais famosos de governos de direita daqueles
dias foram os nazistas e fascistas. Tinham ambos em comum com a direita
contemporânea o forte nacionalismo e o desejo de controlar os industriais, subordinando
o interesse do capital aos interesses do Estado. Isso mostra que não se pode
usar o conceito tal como foi usado na segunda metade do século para entender o
que se passou antes. Se a Alemanha e Itália se opuseram ao Comunismo, não foi
para defender os capitalistas europeus ou a liberdade, mas como forma de
combater o nacionalismo e o expansionismo russo na Europa. A indústria nesses
países foi nacionalizada, inclusive a estrangeira. Nesse sentido, no século
passado, os países liberais, nomeadamente Estados Unidos e Reino Unido foram adversários
primeiro de Nazistas, Fascistas e depois dos Comunistas. Se a União Soviética
foi aliada das democracias liberais durante a Segunda Grande Guerra, o foi por
circunstância histórica. Logo que a Grande Guerra terminou liberais e
comunistas estavam em posições opostas. Entre as muitas diferenças da direita
contemporânea do nazi-fascismo está: ela não é corporativista, expansionista,
unipartidarista, militarista, anticomunista e antissemita como foram movimentos,
ou não é de forma tão fundamental. Ela contraria os interesses capitalistas de
um modo diverso do século passado. Agora combate a mundialização da economia na
medida em que estimula o protecionismo e olha desconfiada os grandes blocos
econômicos. Contra a mundialização, a direita contemporânea valoriza os grupos
nacionais.
No
entanto, direita e esquerda radicais, enquanto categorias empregadas para
caracterizar movimentos políticos, afastam-se dos interesses do capital e são
adversários de posições fundamentais da democracia liberal até um passado
recente. A direita contemporânea tem por característica combater as sociedades
plurais, o multiculturalismo, a diversidade social, à aproximação entre os
povos, alimentando o ódio ao estrangeiro, ao pobre, ao diferente, ao
ecumenismo, quando não ao homossexual e o índio.
Quanto
ao homem que vive nesses dias transitou do humanismo trágico tematizado pelo
existencialismo do século passado para uma nova versão do homem-massa: infantil,
bárbaro especialista, senhorio satisfeito, como dizia Ortega, mas também
tecnocrata, egoísta, angustiado, irracional e dramático. Sentindo-se ameaçado
no seu gozo reage com os muros da irracionalidade e da violência, rearticulando
o nacionalismo em novas bases.