Com certeza todos se lembram do belíssimo filme “O Nome da Rosa“ baseado no romance de Humberto Eco, filósofo e literato italiano. Nesse filme, Guilherme de Baskerville, franciscano, discípulo de Roger Bacon- e seu aprendiz - Adso de Melk, Frei e amigo de Guilherme de Occam - chegam a um convento nos Alpes. Como pano de fundo o enredo gira em torno da explicação das mortes que ocorriam naquele convento. No entanto, o verdadeiro objetivo era discutir os métodos científicos da indução e dedução.
Agora Humberto Eco nos brinda com outro romance, “O Cemitério de Praga”. Pelo que me consta, ainda não foi traduzido para o português. Este romance, em forma de diário, é narrado através de um personagem com dupla personalidade. Nele, cada personalidade escreve alternadamente, narrando os acontecimentos de que foi protagonista como se fossem duas pessoas distintas.
O romance prende o leitor desde o início até o fim. O período que se desenrola é o final do século XIX e o ambiente se passa em Turim e Palermo, na Itália, e Paris, na França. No início é bastante cômico, devido às definições dadas aos padres, povos e organizações. Os jesuítas são chamados de maçons vestidos de mulher, os judeus devoradores de crianças cristãs, os maçons continuadores dos templários decididos a acabarem com hebreus, cristãos e a monarquia. Os comunistas são identificados como conspiradores e sabotadores.
Após esta parte hilariante o romance toma um rumo amedrontador, cheio de atentados e assassinatos. A parte final é tenebrosa. Há uma trama generalizada. Um abade morre duas vezes, cadáveres são enterrados nos pátios das casas ou bóiam sobre o rio Sena, Missa Negra, navios explodem em pleno mar mandando para os ares todos os tripulantes. Os jesuítas conspiram contra os maçons, estes estrangulam os padres com as próprias tripas. Personagens conspiram uns contra os outros. A versão da Comuna de Paris é descrita como um fiasco. A trama de serviços secretos envolve italianos, franceses, prussianos, russos, numa ação de espionagem e contra espionagem.
O centro da trama se refere a um documento falso, um “borderau”, sobre uma reunião de sábios judeus no antigo Cemitério de Praga. Consta que Hitler teria tido conhecimento deste documento e o teria usado para exterminar os judeus nos campos de concentração. Foi um documento forjado a várias mãos, mas com o retoque final do personagem principal do livro, o tabelião falsário, capitão Simonini. O documento fala de uma reunião, naquele cemitério, dos chefes dos rabinos de várias partes da Europa, os quais firmam os Protocolos dos Sábios Anciãos de Sião. Nesses Protocolos estariam traçados os planos dos judeus para conquistarem o mundo e a aniquilarem o cristianismo. Conforme o documento, á meia-noite, no Cemitério de Praga, chegaram doze indivíduos envoltos em mantos escuros, e uma voz, saindo do fundo de uma tumba os saudou como os doze Rosche-Bathe-Abboth, chefes das doze tribos de Israel, e cada um deles respondeu. “Saudamos-te, filho do condenado.” Daí prosseguia a voz. “Passaram-se cem anos desde o nosso último encontro. Donde vindes e a quem representais?” E cada um se apresentou dizendo-se representante de Amsterdam, Toledo, Worms, Peste, Cracóvia, Roma, Lisboa, Paris, Constantinopla, Londres, Berlim e Praga. Após isso, cada uma das vozes proclamou as riquezas de sua localidade. Calculadas as riquezas, passa-se a descrever o plano para aniquilar os cristãos e apoderarem-se do mundo. Para tanto seriam tomados os bancos, os meios de comunicação, a educação, as ciências, as artes. Enfim, o Plano do Cemitério de Praga seria um projeto para os judeus tornarem-se senhores de tudo o que houvesse sobre a terra.
( IL CIMITERO DI PRAGA, Umberto Eco. Milano, Bompiani, 2010)