O homem nasce ligado à uma terra e à humanidade. Ele tem esses dois vínculos. O primeiro é uma circunstância espaciotemporal e o segundo uma comunhão espiritual. Não se deixa de ser cidadão do mundo porque se nasceu num terminado território, mas a vida nesse país somente ganha densidade quando se comunica, pelas criações do seu espírito, à comunidade humana. Em outras palavras, o alcance das questões e realizações universais passa pelo fortalecimento das criações nacionais. É com o desenvolvimento das nações que a humanidade se consolida, pois cada povo tem seu papel, maior ou menor, na construção dessa história comum. Parece que foi o que Georg Hegel escreveu em sua Introdução à História da Filosofia (4ª ed., São Paulo, Nova cultural, 1988, p. 121): “A forma particular de uma filosofia é sincrônica com uma constituição particular do povo, onde ela aparece, com as suas instituições, com as suas formas de governo, com a sua moralidade, com a sua vida social, com as atitudes, hábitos e preferências, com as suas tentativas e produtos científicos, com sua religião, com seus êxitos militares, com todas as circunstâncias externas, (...) nos quais surge e se desenvolve um espírito mais alto”. Esse espírito mais elevado era, para Hegel, uma razão universal, ou melhor a cultura humana em toda sua expressão.
Nesse sentido, um nacionalismo radical e
isolacionista como o defendido pelos partidos de extrema-direita em diversas
nações ocidentais é exemplo de caminho a ser evitado. A Frente Nacional, que
concorreu recentemente às eleições francesas com Marie Le Pen é um pobre
projeto nacional, porque pensa a nação isolada dos outros povos. Esse partido
proclama um nacionalismo fechado, com fronteiras bloqueadas aos produtos
estrangeiros e ao próprio estrangeiro. Nesse sentido, essa direita não é
liberal como se pensa, ela é antiliberal, mas o pior é que não se enxerga parte
de uma humanidade comum.
Em contrapartida, não penso que se
possa, pelo menos no atual momento da civilização, deixar de lado o cuidado com
as coisas nacionais, especialmente com a produção espiritual e o progresso nacional.
Se, como Hegel disse, o espírito universal (1988, p. 88): “se vai enriquecendo
com novas contribuições à maneira do rio que engrossa o caudal à medida que se
afasta da nascente”, o equilibrado crescimento mundial depende do
desenvolvimento das nações. Assim, é triste quando as minorias de um país como
o nosso se descomprometem de seu destino. Boa parte da nossa elite econômica,
para garantir miserável e ilegalmente o próprio enriquecimento subornou a elite
política. Essa por sua vez, ocupada com seus privilégios e cômodos da vida,
descomprometeu-se do destino nacional. E o problema não é de uma única empresa
ou de um único partido, está generalizado nessa imoralidade de 40 partidos e um
patrimonialismo que associa ilegalmente altos funcionários aos ricos
empresários.
E parte dessa elite que espolia, sonega,
furta, corrompe e é corrompida, nos momentos de dificuldade corre à busca de lugares
para onde fugir, lugares que hoje avalia bons porque não permitem que se faça o
que aqui eles praticaram. Os últimos fatos da política nacional mostram um
conluio de empresários, marqueteiros e políticos para assegurar o
enriquecimento próprio à custa da sociedade e do seu progresso, ameaçando a
felicidade coletiva, o progresso e a sobrevivência do povo.
Por que a inserção no mundo somente se
fará pela sociedade a que legitimamente se pertence, entendo que somente
contribuiremos verdadeiramente para o futuro da humanidade e para o nosso
pessoal, trabalhando honestamente pela nação a que pertencemos.
José Mauricio de Carvalho –
Academia de Letras de São João del-Rei.