sexta-feira, 22 de agosto de 2025

A FÉ DE NOSSOS PAIS. Selvino Antonio Malfatti.

 



A aura sacra que acompanhava as pessoas do despertar até á noite agora passou para um mundo prosaico de trabalho sem luz. Um ser humano desnudo com uma carapuça de fantasia gritando felicidade na passarela da vida. Conheceu o bem e mal em troca da felicidade. Um crânio sorrindo.

O sacro de cada dia com sentido para o prosaico de um dia após o outro sem luz. O mudo morreu e o homem nele. Nem dias, nem meses ou ano fazem sentido. Todos sabem o que o espera no fim da jornada: a morte.

Onde está a fé da família que rezava junto? As missas ou cultos com igrejas repletas? Ou um arrependido no fundo da igreja rezando solitário? A fé morreu e com ela a esperança? A caridade, descarte sem serventia?

Deus foi embora e os santos nos abandonaram. Ficou só a ciência. Ela foi encarregada de aliviar a dor, consolar o aflito. Mas ela é fria, não tem coração, só razão. A ciência não abraça, só explica. Como medico que cuida da doença, mas abandona o doente.

Cada etapa da vida tinha seu sentido. Ninguém era meteorito que se precipitava no vácuo e desaparecia incandescente. Nascia e a comunidade recebia. Crescia e ingressavas na fé. Forma uma família de uma só carne com o cônjuge. Pecava e perdoado. Morria e a comunidade do além o recebia.

A vida era sacra. O alimento uma dádiva divina. O sexo um dom de criar vida. Respirava-se o sacro. Levanta-se com o sinal-da-cruz e termina o dia com orações da noite. A fé fosse presente em tudo, e não apenas em objetos ou pessoas: um universo onde tudo respirava fé. Não há figuras, porque o sagrado não se deixava conter em imagens fixas; estava nas ruas, nas casas, nos sinos, nas preces. Procissões e a da vida comunitária, unida pela devoção. O fogo das velas, a luz dourada dos altares, a intensidade das festas religiosas. O mistério: a fé como presença difusa, inefável, que tudo tocava e tudo envolvia.

Agora é diferente por que se fazem as mesmas coisas sem a fé. O mundo dessacralizou-se. Foi a perda do caráter místico do mundo. Tudo é natural, pode ser explicado pela ciência que substituiu o poder do sagrado. Romarias pedindo chuva deixaram de fazer sentido diante da previsão do tempo. Missas para uma boa colheita tornaram-se anacrônicas com as previsões de safras. Para que rezar? Deus não se comove. A oração, no máximo pode comover a si mesmo. Esta é a lógica da ciência. Forças sobrenaturais não interveem na natureza.

Estamos num impasse: o sacro ou o natural. Aquele ambiente místico está materializado pelo mundo físico. Os nossos pais era precisavam externar o interior. Devia ser visível. Para comprovar fé precisa fazer o sinal da cruz. Para dizer que fala com Deus precisa recitar em voz alta o Pai-Nosso. Pedir ajuda, balbuciar o Santo-Anjo.

A toda hora dizer graças a Deus, Deus queira, vá com Deus, Adeus, Oxalá. Para ter em mente o sobrenatural guia-se pelo tempo fracionado em semana, meses e anos cada divisão representam um santo ou ato litúrgico. Marcava locais por templos, catedrais, ruas com santos.

Agora prevalece o paradoxo. Multidões se formam para receber uma autoridade religiosa, marchas-para-Jesus reúne milhares de fiéis, procissões congregam muitas centenas de seguidores. Locais de aparições atraem devotos aos milhares. No dia seguinte cada um volta para sua casa e continua tudo como antes.  Num momento multidões oram publicamente e de repente desfazem-se tudo como uma nuvem! Nem sinal do que aconteceu.

Os sinais externos se voltam para o interno? O sentido externado recolheu-se para o interior e somente aflora em alguns momentos e em seguida recolhe-se para o interior?

Onde está a fé de nossos pais?


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