O inigualável contador de fábulas, Jean de La Fontaine,
costumava ensinar um valor através de uma fábula, geralmente envolvendo
animais. A moral da estória era um valor social ou um princípio ético. Podemos citar
a Formiga e a Cigarra, a Raposa e as Uvas, o Leão e o Rato entre outras.
Estamos convivendo com uma pandemia neste ano de 2020.
Como é viver recluso em casa com os familiares: pais, filhos, avós, netos e
mesmo outras pessoas? Se alguns meses atrás fizéssemos a pergunta: é possível
isto? É muito provável que responderíamos que não, pois numa sociedade
democrática isso seria impossível. No entanto, cá estamos vivendo isso, quer
gostemos, quer não, pois reclusão ou morte. Vamos imaginar como seria uma ninhada
de ouriços vivendo numa mesma toca para enfrentar um inverno severo. Conseguem
viver só por que ficam perto uns dos outros tendo cuidado de picar o menos
possível o outro. Eles terão que conciliar a liberdade de cada um, saúde de
todos e economia de guerra para não faltar. Cada um deve usar sua liberdade,
sem impedir a dos outros. A saúde ao abrigo, dentro do ninho. E a sobrevivência
na economia de todos e cada um.
Da mesma forma, dentro de um grupo familiar, posto em isolamento, repentinamente com todas as qualidades e defeitos seus membros se vêem face a face. A desconfiança de que o pai ou a mãe protege um filho, a suspeita de que algum receba mais que o outro. O ciúme da musculatura do irmão, a beleza mais saliente de uma irmã. O casal, uma cobrança antiga ficada para trás, desejos incontidos de vingança, ciúmes, invejas, amor frustrado, amizade aos frangalhos. Tudo isso são espinhos de ouriço picando uns aos outros.
Da mesma forma, dentro de um grupo familiar, posto em isolamento, repentinamente com todas as qualidades e defeitos seus membros se vêem face a face. A desconfiança de que o pai ou a mãe protege um filho, a suspeita de que algum receba mais que o outro. O ciúme da musculatura do irmão, a beleza mais saliente de uma irmã. O casal, uma cobrança antiga ficada para trás, desejos incontidos de vingança, ciúmes, invejas, amor frustrado, amizade aos frangalhos. Tudo isso são espinhos de ouriço picando uns aos outros.
No isolamento das famílias brasileiras está a ideia de
salvação coletiva. Como deve dar-se o isolamento? O Estado e o mercado podem
parar enquanto possuírem reservas. Por isso há duas posições: parar totalmente
na esperança de que o mal acabe antes ou parar parcialmente, deixando uma parte
isolada, os de risco maior, e os demais levarem adiante a economia como
puderem. O Brasil optou pela primeira, isto é, todos param, o mal vai embora e
todos retornam. Mas e se o mal persiste, como é o caso? Aí se instala o caos: o
governo federal determina o isolamento, alguns estados admitem certas atividades
com métodos próprios, municípios autoliberam liberam e outros não, justiça que prende
quem não obedecer e os cidadãos?
Voltemos à toca dos ouriços. Eles compulsoriamente têm
que conviver para sobreviverem. Mas cada um quer usufruir de sua liberdade. Se
algum quiser mais espaço espinha o outro. Este esbraveja. Todos precisam
preservar a saúde e por isso devem ficar entocados. Se saírem, deve ser de
extrema necessidade e retornar ao mais rápido possível. Os gastos devem ser os
mais parcimoniosos possíveis. Só gastar o essencial.
Da mesma forma nós, estamos em isolamento, confinados nos
nossos lares. Antes vivíamos mais fora dos nossos lares do que dentro.
. Levávamos uma vida líquida, volátil, de contatos
virtuais e online. Agora, de repente, somos submetidos a contatos face a face,
físicos, exprimidos. Como está sendo a acomodação à nova vida? Recolhi alguns
depoimentos deste isolamento. Transcrevo-os, sem citar a autoria.
A maioria enfatizou a experiência de estar frente à
frente consigo mesmo e por isso: “Uma forte experiência existencial”. Ou;
"meu marido e eu estamos literalmente engaiolados num apartamento'.
"meu marido e eu estamos literalmente engaiolados num apartamento'.
Na
esteira da do auto isolamento veio junto: “A experiência do autoconhecimento é
imensa.” E quando não a consciência do autoconhecimento: “Eu acho que a
introspecção não faz mal a ninguém e nesta clausura, começamos a dialogar com
nos mesmos e com pessoas que antes nunca havíamos dialogado. Eu acho que muitas
pessoas sofrerão mudanças internas nunca antes imaginadas. O egoísmo foi
substituído pelo "nós. Já ouvi muitas opiniões e acho que apesar dos
pesares, sairemos ilesos, se Deus quiser, longe de contaminações.”
“Já para outros, o isolamento era uma praxe da própria
vida.” Gostaria
de falar por telefone e não digitar. Faz muitos anos que moro sozinha, não há
companhia melhor que a minha. Tenho um mega conhecimento de mim, a quarentena
não interferiu em nada. Sempre pensei nos vulneráveis, agora mais ainda. Estou muito
preocupada com a crise econômica do país. Meu pão de cada dia é garantido. Como
pratico várias atividades agora está difícil reduzir, sair menos de casa.
Culminou aposentadoria de 20h com quarentena o que está dificultando um pouco
ficar em casa. Não vou entrar em detalhes o que faço para ajudar seres que
precisam.“
Outros sentiram a solidão e o peso do isolamento: “Eu
estou ficando louca. Com depressão, pânico e ansiedade. Não por ficar em casa,
mas por não ter ver e abraçar minha neta que mora a apenas duas quadras de
distância mas é como se fosse mil quilômetros. Do falar por vídeo não adianta.
Eu não aguento mais.”
Houve alguns que mencionaram questões
político-ideológicas: “Mas o principal é a compreensão de que a sociedade
Capitalista não é compatível com a vida. E o quanto a irresponsabilidade
eleitoral de alguns poderia minar um país se não houvesse resistência de outros
lados.”
Alguns encararam com normalidade a clausura: “Tenho
ocupado o tempo para pesquisar” ou ainda: “Estamos preso em nossas Residências,
mas esperamos confiante, que logo tudo vai passar”