Florença, cidade
toscana da Itália, mereceu um livro de Pierre Antonetti, professor de
literatura de Marselha, com o título de “A vida cotidiana de Florença no Tempo
de Lorenzo, o Magnífico”, da série a HISTÓRIA VISTA DE BAIXO, por Pier Luigi
Vercesi. Ele descreve Florença como um território muito pequeno, que
repentinamente eclodiu numa floração fantástica. A cidade era constituída por
uma comunidade muito minga, 40 mil habitantes, com o agravante de no século XV
recém tinha se recuperado da Peste que a assolava desde 1348, conforme o
Decameron de Boccaccio.
Ainda hoje qualquer
analista se surpreende e fica estupefato ao deparar repentinamente com
Florença. Há arte em toda parte: nas ruas, nos prédios, nas igrejas sem falar
nos museus. Não se sabe por onde começar, onde olhar primeiro, ou dar maior
atenção ou deter-se. Tudo é magnífico como seu líder Lourenço de Medici. E a
pergunta inevitável: mas como surgiram num só lugar e ao mesmo tempo tantos
gênios artistas e pensadores? Às margens do Arno toda cidade é uma obra de
arte. Só para citar alguns: Dante, Giotto, Leonardo da Vinci, Maquiavel,
Michelangelo. E também devemos mencionar Masaccio, Beato Angelico, Botticelli,
Ghiberti, Donatello, Verrocchio, Benvenuto Cellini, Leon Battista Alberti,
Marsilio Ficino e muitos outros. Todo este ambiente cultural costuma-se
denomina-lo de Renascimento italiano.
Florença, uma
cidade republicana, mais precisamente um Principado, governada pela família
Médici, apoiada por uma oligarquia constituída de bancos, comércio e indústria.
Lourenço de Medici, o Magnífico, um homem de letras, empolgou a elite local,
nacional e até internacional em torno da arte, literatura, filosofia e
Política.
Incentivada por Lourenço a cidade sofreu uma remodelação
completa, as casas de madeira deram lugar as de pedra e tijolos, as moradias
familiares substituíram os palácios. O exemplo dos Medici foi seguido pelas
famílias Spinelli, Pitti, Strozzi, e Rucellai, entre outras.
As condições
econômicas da maioria da população parecem não ter influído no projeto
artístico de Florença. Este seguia inexorável seu objetivo: encantar a cidade.
Havia populações de “miseráveis”, pobres e modestos. O foco de Lourenço não era
solucionar a pobreza, mas ornamentar com arte a cidade. Com certeza passava ou
não pela sua cabeça: “pobres sempre tereis entre vós”. Beleza não cai do céu, se
não for conquistada, de per si não virá.
Se não foram as
estruturas econômicas que explicam o boom artístico, certamente o ambiente
cultural pode explicar. Os Mecenas, entre eles Lourenço, serviam de intermediários
entre os artistas e a produção das obras. Houve um líder que sublimou e canalizou o
conteúdo que aflorava espontaneamente. Foram criadas as condições propícias
para germinar o que era apenas um potencial. Miguelangelo, por exemplo, recebeu
de Lourenço um atelier. O fenômeno pode ser explicado “ex a se” e não “ab alio”.
Estava dentro da cidade e não fora.
Todo este esforço
e movimento cultural de Florença se denominou de Renascimento. Costuma-se
dividi-lo em três fases que vai do século XIV ao séculoXVI: Trecento,
Quattrocento e Cinquecento.
1.
O Renascimento do
“Trecento” italiano se manifesta particularmente em Florença. Esta - tal uma
Atenas - ergue-se como um centro político, cultural e econômico regional. Nesta
fase despontam os gênios artísticos e intelectuais Giotto, Boccaccio e
Petrarca.
2.
No segundo período,
o “Quattrocento”, o Renascimento
dissemina-se por toda península. É o auge do Renascimento na Itália. Pontificam
Botticell, Da Vinci, Rafael, e como coroamento, Michelangelo.
3.
No terceiro
período, o “Cinquecento”, o Renascimento conquista a Europa, desdobrando-se em
outras dimensões culturais como estéticas, filosóficas e políticas. Um delas é
o maneirismo artístico, a Contrarreforma religiosa e o Barroco da Igreja
Católica. Destacaram-se na literatura Ariosto e Torquato de Tasso. Na política
culmina com Nicolau Maquiavel.
O
historiador francês Yves Renouard
(1908-1965) assim se expressa:
“O
gênio germinou em Florença nos séculos XIV e XV mais do que em qualquer outra
cidade do mundo. Certamente Atenas no século V de Péricles e no século IV
reunira um número incrível de homens de gênio. Mas nunca tantos gênios surgiram
em poucas décadas como em Florença...”
Por
isso, podia concluir: O Espírito respira onde quer.