Não é difícil entender porque numa sociedade onde a moralidade não é bem debatida se desorganiza. Os costumes não são simplesmente ensinados, as pessoas precisam conhecer os motivos pelos quais existem. Sem isso pouco importa dizer que elas precisam agir moralmente, elas pensarão em seus benefícios imediatos. Não entenderão que seu benefício momentâneo significará prejuízo para todos, inclusive ela mesma no futuro. Sem se dar conta dos males, provavelmente continuará praticando os atalhos e arranjos do benefício espúrio. Além disso, mudam a vida e os costumes, os valores precisam se adaptar à nova realidade social. Isso é a atualização dos valores a que Miguel Reale denominava de invariantes axiológicos e não será admitida sem entendimento das razões.
Daí
as críticas que fiz à reforma de ensino porque, entre outras simplificações, ao
retirar a disciplina Filosofia do currículo obrigatório, tirou dos jovens a
oportunidade de discutir, de forma qualificada, os costumes e seus fundamentos.
A questão, porém, não se resume a isso, não parece possível ensinar ciência
dissociada da tradição humanística do ocidente sob pena de nos afastarmos dos
valores da cultura, do mesmo modo que não se pode ensinar humanidades separadas
da ciência moderna. E essa terá esse problema, apesar da propaganda simplória e
cara na qual o governo gasta mal o dinheiro da sociedade. Essas coisas pioram
quando se leva para o Ministério da Educação alguém que não é professor e não
conhece a atividade pedagógica. Já tivemos outros exemplos de políticos ou
economistas na pasta da educação, como o famigerado Paulo Renato de Souza, que
mesmo mistificado pela mídia paga, não deixou um único trabalho sobre o ato e o
significado de ensinar e, depois de sua morte, ocorrida há alguns anos, não houve
um único estudo sério sobre suas ideias pedagógicas, concordássemos ou não com
elas. É um desastre para um povo quando suas elites, no caso a política, se
comporta desse modo. E não parece que a nossa elite econômica seja melhor que ela.
Porém,
nossa atenção está voltada para a Previdência, que ocupará o noticiário nacional
nas próximas semanas. Não há dúvida que ela é necessária porque a população
brasileira está envelhecendo e esse é um problema comum de vários países. Todos
os países mais desenvolvidos, cuja pirâmide etária tem as características que a
nossa pirâmide terá em poucos anos, têm aposentadoria prevista para depois dos
sessenta anos. Porém, esse é um assunto duro, difícil, sua condução precisa ser
feita por um governo capaz de olhar os olhos da sociedade e dizer, assim
precisa ser feito por tais motivos. E a sociedade acredita por que seus
políticos são austeros (econômicos), não desviam dinheiro do Estado, não se
envolvem em corrupção (são honestos), não se enriquecem ilicitamente. A
sociedade acredita porque sua elite econômica não deve nada aos institutos de
Previdência (ela não vive no luxo às custas do sacrifício dos mais pobres) e,
portanto, o modelo previdenciário precisa mudar porque não se sustenta. O povo
acredita nesses líderes porque sente que eles pensam no povo, pensa seu futuro,
pensa sua posição no mundo e lhe diz a verdade (veracidade). Se a mudança, que
precisa ser feita, vem de um grupo sem os valores necessários para cobrar
sacrifícios, receberá do povo o repúdio e a recusa. Se esse povo precisa pagar
dois estádios de futebol para ter um, duas estradas para ter uma, duas
hidroelétricas para ter uma, a falta de legitimidade moral desse governo que
sobrevive nesse estado de coisas, se torna o obstáculo para organizar o Estado,
as contas públicas e definir o futuro desse povo. Política é futuro, política é
administrar interesses, política é gerir com eficiência. Nada virá sem respeito
a princípios morais que hoje em dia temos como essenciais para o funcionamento
da vida pública.