Ainda
sem abrir os lhos para o mundo sente o ímpeto de viver. Sofreguidão na
procura do alimento de quem deu a vida. A partir daí a natureza acumula forças,
vigor, vida em
abundância. O corpo cresce, torna-se belo e tudo é
encantador. Os hormônios fazem o sangue ferver de cupidez. Que bela é a vida.
Cheia de energia, alegre, sempre precisar de esperança.
Por
que os idosos falam de dor? Ressentem-se de decepções? Choram perdas de quê? De vez
em quanto se houve falar que alguém está doente. Mas que mal tem? Falam que
outro está desenganado. O que é isso? Comentam que fulano morreu. Que importa?
Tudo está tão distante, inatingível. Isso é coisa de velho. O jovem está imune.
Ele possui a vida que extravasa e inunda o seu redor.
Ah!
Foi o velho doente que mora em outra cidade? O avô, bem, descansou o coitado.
Por que o pai? Podiam ter durado mais alguns anos. Meu irmão? O problema é que
não se cuidou! De repente se dá conta que ela rondou por perto. Mas aí? Mas
aí já é tarde. Precisa urgentemente voltar. Mas “la diritta via era
smarita”. Além disso, não há mais volta. O tempo, que parecia inesgotável,
agora rola impassível, inexorável para Andrômeda.
Mas
o jovem? O jovem não morre. Até vinte anos...a vida é eterna. Por
que foi quebrada a lógica? Quem permitiu isso? O jovem? A família? Governo? A
culpa? Não adiantam culpados. A vida não volta. A morte, sim, se compraz,
diante da vítima. Esta desfalece. Antes da abocanhada final vai perdendo
pedaços até deixar somente a metade. O corpo formiga, as pernas tremem e a boca
endurece. Partido ao meio sobrou apenas
a metade, o corpo. Mas o pior é a perda da metade da alma. Vai junto com a
outra parte. A realidade se torna etérea, evanescente, volátil. Levitam os
sentimentos sem onde pousarem. Saltita a memória entre o início e o fim. O
pensamento não consegue pensar. Ele se deixa levar pela ruptura da partição.
Metade se foi. O que fará a outra metade?
Ao
estupor sucede a revolta? Por se tirou metade. Talvez fosse preferível não ter
sobrado nada, tirado tudo. Metade ficou para perambular inconsolável. A
presença de quem se foi distanciando aos poucos, envolta em contemplação, luto,
enlevo e revolta. Raiva e ódio. Por quê? Simplesmente não tem explicação. Aos
poucos a resignação. Só resignação, nunca aceitação e menos ainda compreensão.
Continuar a viver? Por que não partir junto? Mas encontrar onde a outra metade?
Agarra-se a uma consolação: cuidou, rezou e chorou. Pelo menos o corpo recebe
uma morada digna. A alma, onde estará ela? Às vezes faz alguma visita, mas
muito rápida para deixar algumas gotas de bálsamo para a outra metade que
ficou. E então, com saudade exclama:
“alma minha gentil, que te partiste tão cedo desta vida descontente, repousa lá
no Céu eternamente” até nos unirmos novamente.