Muitos americanos foram às ruas
protestar contra a morte do jovem negro Freddie Gray, de 25 anos, que se feriu
ou foi ferido enquanto estava sob responsabilidade da polícia de Baltimore
depois de ser preso, sem razão legal, em 12 de abril próximo passado. A maioria
da população norte-americana revela-se indignada contra a discriminação dos
negros pelas autoridades policiais e descumprimento dos direitos civis. Um
pequeno número entre esses manifestantes promoveram grande confusão na cidade
de Baltimore, saquearam e incendiaram lojas, enfrentaram a polícia levando as
autoridades decretarem toque de recolher.
Milhares de manifestantes se reuniram no
dia 1º de maio para protestar contra a exposição universal na cidade de Milão,
um evento bilionário que deve se estender por seis meses na elegante cidade
italiana. A manifestação pretendia denunciar o enorme investimento naquele
evento num momento em que a economia anda mal e os Estados mostram-se fracos e
sem recursos para enfrentar a crise. No meio dos manifestantes uma centena protagonizou
ação violenta, queimando latas de lixo, veículos e objetos do mobiliário urbano,
transformando a cidade italiana num caos. Essa última confusão bastante
semelhante às ações do Black Bloc que promoveu grande anarquia no Brasil nos
últimos meses. Black Bloc, recordem, é um movimento anarquista cujas
manifestações violentas pipocam em diversos países do mundo. Basta algo ter
visibilidade mundial lá estão eles se esforçando para instalar o caos. A
atuação desses grupos é tão mais violenta quanto fracas e inseguras se mostram
as autoridades locais. Esses grupos violentos parecem se inspirar nos
movimentos contra a globalização que tiveram início nos anos 90 na Europa e
Estados Unidos, cuja forma de agir era semelhante. Vestiam-se de negro e usavam
capuz para impedir a identificação.
De comum entre os dois eventos a
incapacidade do Estado de responder eficazmente os problemas atuais. No primeiro
a incapacidade norte americana de superar o preconceito racial e garantir a
efetivação dos direitos civis para os negros. No segundo a incapacidade dos
governos de enfrentarem com eficiência a grande crise econômica que se iniciou
em 2008 e cujas consequências ainda andam pelo mundo, inclusive no Brasil. Nos
dois eventos a presença de uma minoria, organizada e anárquica a enfrentar os
agentes do Estado no esforço para destruí-lo.
Essa realidade mundial pode merecer
várias leituras e interpretações, mas não deixa de mostrar que, onde o Estado
atua mal, as consequências são quase sempre em ordem crescente: a manifestação
inconformada, a revolta e a violência. Entre nós se multiplicaram grupos de
justiceiros, aumentam o registro dos crimes e a ação inconformada da população
que, vez ou outra, espera fazer justiça com as próprias mãos.
Na raiz da insatisfação, lá de fora e
daqui, um tempo onde as pessoas não sabem a que ater vida e a direcionam ao
consumo ansioso e gozo irresponsável, cuja frustração culmina em mais violência.
Um tempo em que as guerras convencionais foram substituídas pela violência
intra-nacional e onde o hedonismo ansioso se nutre de drogas alucinógenas e
estimulantes, essas últimas capazes de acelerar o funcionamento do cérebro e
induzir a hiperexcitabilidade.
A realidade mais especificamente humana,
a individualidade e liberdade, exigem para sua manifestação, um Estado
organizado capaz de assegurar a ordem, promover o dever e de funcionar bem nos
serviços que presta. Sem responder aos desafios de nosso tempo, os Estados
contribuem para popularizar a desesperança e desassossego. Assim caminhamos num
tempo de intranquilidade, não por causa da bomba atômica e dos riscos do
cataclismo nuclear, mas da violência urbana que pode alcançar qualquer um em
qualquer parte.