Quando se aproximam as festas natalinas é natural que as pessoas busquem entender o sentido do Natal. No entanto, este entendimento não é igual para todos. O Natal pode ser visto sob vários aspectos como o oficial, o tradicional e o bíblico. Como primeiro é bastante conhecido, o segundo vivenciado atualmente pela sociedade, vou deter-me um pouco no Natal bíblico, mais precisamente dos evangelistas.
O Nascimento de Jesus ou Natal como é narrado nos Evangelhos nos deixa um pouco confusos. Vejamos alguns detalhes. Dos quatro evangelistas, somente dois narram o nascimento de Jesus e os outros começam a narrativa depois de Jesus já grande, isto é, menino ou moço. Outra constatação é que os apóstolos escreveram não para os judeus, mas, certamente para os gregos. Além disso, os evangelhos foram escritos bastante depois do que tudo aconteceu, provavelmente até a metade do primeiro século. Então, já há uma visão teleológica embutida, isto é, estão mirando um objetivo. Outra surpresa: a língua. Não foi o hebreu ou aramaico a língua dos Evangelhos e, sim, o Greco, ao menos na sua redação final. Os cultos nas igrejas (eclésia) era em grego. Há, inclusive, resquícios na Missa. É o “Quirie eleison” (que em grego significa: Senhor, tende piedade de nós)
A aproximação do cristianismo com a cultura grega deu-se de imediato e espontaneamente. Foi, como se diz, um amor à primeira vista. Evidentemente por que os temas existenciais eram os mesmos: vida, morte, ressurreição, sofrimento, bondade, amor, justiça, espírito, Deus, além de haver algumas teorias gregas muito próximas ao cristianismo, como o estoicismo. Naquele momento histórico a cultura grega era a mais elevada do mundo, pois os próprios romanos que conquistaram a Grécia pelas armas foram depois conquistados pela cultura grega. Até mesmo em Roma as comunidades cristãs eram na sua maioria de origem Greco - judaica.
Disso decorre que a nova religião, o cristianismo, ao abandonar o judaísmo associou-se ao helenismo e foi graças a esta síntese que conseguiu elaborar uma teologia sistêmica e de cunho universal. Dentre estes judeus helenistas destacou-se no início da era cristã Filon de Alexandria que via no conceito de Logos da filosofia grega (traduzido para o português como Verbo) uma síntese da obra divina e a forma como Deus operava no mundo. Este conceito de Filon – o Logos ou Verbo - vai aparecer no começo do Evangelho de São João e durante toda exposição ele está subjacente. Para ele, o nascimento de Jesus, o Natal, foi obra do Logos, o Verbo.
A Criação do Mundo e o Juízo Final foram unidos pelo Verbo, de modo que princípio e fim sempre estão acontecendo. O Verbo, no entender de João, é o verdadeiro Natal.
Vejamos como se expressa.
São João, 1
1. | No princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus. | |
2. | Ele estava no princípio junto de Deus. | |
3. | Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi feito. | |
4. | Nele havia a vida, e a vida era a luz dos homens. | |
5. | A luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam. | |
6. | Houve um homem, enviado por Deus, que se chamava João. | |
7. | Este veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos cressem por meio dele. | |
8. | Não era ele a luz, mas veio para dar testemunho da luz. | |
9. | [O Verbo] era a verdadeira luz que, vindo ao mundo, ilumina todo homem. | |
10. | Estava no mundo e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o reconheceu. | |
11. | Veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. | |
12. | Mas a todos aqueles que o receberam, aos que crêem no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus, | |
13. | os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas sim de Deus. | |
14. | E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória que o Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade. |