Judeus indo para as câmaras de gaz.
Há um texto bastante conhecido que consta haver sido
encontrado, ao final da Segunda Grande Guerra, num campo de concentração. Não
sabemos se verdadeiramente foi, mas ele resume uma experiência tremenda do que
ali se passou. Aquelas palavras mostram algo contrário a noção positivista de
sacerdócio da humanidade. Em outras palavras constata, contra a tradição
positivista de sacerdócio da humanidade, que a desejável competência intelectual
é imprescindível para fazer um homem melhor, mas não o torna uma pessoa moral.
Eis o texto:
Prezado Professor, sou sobrevivente de um campo de
concentração. Meus olhos viram o que nenhum homem deveria ver. Câmaras de gás
construídas por engenheiros formados. Crianças envenenadas por médicos
diplomados. Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês
fuzilados e queimados por graduados de colégios e universidades. Assim tenho
minhas suspeitas sobre a Educação. Meu pedido é: ajude seus alunos a
tornarem-se humanos. Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados ou
psicopatas hábeis. Ler, escrever e saber aritmética só são importantes se
fizerem nossas crianças mais humanas.
Esse texto sintetiza, de forma maravilhosa, uma experiência
necessária ao nosso tempo. Queremos que a competência que o conhecimento
encerra não se torne motivo de vergonha pela ausência de compromisso moral. O
contrário é o que se deseja, que o conhecimento aprendido não se afaste do
respeito humano próprio e por outras pessoas. Enfim, que se respeite o próximo
como a si mesmo, conforme ensinou o Profeta de Nazaré, grande mestre a
humanidade (Mt 22, 34-40 e Mc 12, 30-31).
O filósofo alemão Immanuel Kant
recuperou a síntese feita por Jesus dos Dez mandamentos e sistematizou um ideal
de homem. Em resumo, o homem é alguém que tem valor absoluto ou que é um fim em
si mesmo, não podendo ser usado como meio para se obter o que quer que seja.
Kant reconheceu, com seu imperativo, que o homem é o maior valor com que temos
que lidar. O imperativo categórico resume o modelo ético kantiano e indica
como o problema da escolha deve ser enfrentado, no plano filosófico. Na escolha
da lei moral é que reside a liberdade humana, porquanto é necessário resistir
às inclinações de nossa condição animal e escolher não fazer o mal. Uma ordem
moral, assim parece a Kant, não pode ser fundamentada em elementos que não são
obrigatórios, o que não significa que seja necessário suprimir as inclinações
para que uma ação seja considerada moral. O que Kant pretende é estabelecer as
condições para que uma ação possa ser aceita como moral indo além do
conhecimento de como o mundo funciona.
O conhecimento da filosofia e da
ciência não são dispensáveis, a ignorância e o fanatismo também contribuíram
para a barbárie perpetrada nos campos de concentração. Porém o conhecimento é
insuficiente se não vem acompanhado da capacidade crítica de avaliar o conteúdo
e do compromisso moral de fazer o bem e evitar o mal.