A atividade do homem se manifesta sob duas formas: a
ativa e a contemplativa. A contemplativa, porém está condicionada à ativa. Para
que possa se dedicar à contemplação o ser humano necessita de um satisfatório
funcionamento biológico, de produção suficiente de coisas, ambiente, enfim,
condições propícias para subsistir. O contemplativo está condicionado ao ativo.
O homem se torna
homem na convivência com seus semelhantes. Ele, mentalmente, com cada ser
humano, continuamente se faz ser humano. A evolução biológica aconteceu, e
pronto. Mas a evolução da consciência acontece continuamente. E como acontece?
Através da interação, da passagem cultural de uma geração para outra, de uma
pessoa para outra.Embora ele possa laborar solitariamente, pode construir um
mundo habitado só por ele no entanto, o
relacionar-se, o interagir, unicamente pode ocorrer com seus pares. Até
mesmo para que possa alçar-se à condição contemplativa, necessita preencher a
condição ativa, isto é, uma vida específica, um ambiente cultural e uma
história. Estas três realidades constituem a condição humana, sem a qual, o ser
humano não poderia desabrochar. Elas são as condições da sua existência, que possibilitam transpor a vida ativa para a
vida contemplativa.
Isto significa que os homens não nascem homens, mas se
fazem no decurso de suas vidas. Eles são um eterno “fieri’ do nascimento à
morte. A partir daí, o homem não faz parte das coisas, embora sua existência
está condicionada a elas. É com elas que ele pode tornar-se distinto delas. As
coisas são ferramentas para o homem desprender-se delas. O homem precisa de
artefatos terrenos para abandonar a Terra’, Preenchida a condição ativa o homem
pode lançar-se à contemplação. Esta se faz pela racionalidade ou representação.
A racionalidade se propõe fins no agir humano. A racionalidade se opõe ao
instinto que, ao invés de prever a ação humana, determina-o. Os instintos
passam a substituir os valores ou os fins racionais. Eles deslocam o sentido
racional e os valos que deles decorrem degradam o homem e substituem a
humanidade pela animalidade, inclusive com a colaboração da razão. Nisso
consiste a corrupção do homem. Da mesma forma que alguns fósseis vegetais,
através do processo de mineralização, transformaram-se em pedras, alguns seres
da natureza animal tornaram-se seres humano. Então, enquanto a evolução
fisiológica aconteceu uma vez, a cultural acontece com cada ser humano.
A convivência humana é formada de relações e de passagens
intermediárias, como vida familiar e a vida social e desta para a política.
Evidentemente que, uma das mais significativas é a relação entre o
homem-cidadão e o homem-político. Sobretudo porque são esferas distintas, embora continuadas. O cidadão preexiste ao
político. O político, inclusive, depende da maneira que foi preparado como cidadão. Por
isso, o conjunto e o resultado das ações que preparam o cidadão constituem a
cultura cívica, O cidadão é um político potencial.
Como cidadão, ele
estende seu agir aos mais diversos espaços da vida humana: à economia, religião,
profissão e política. Nessa ação, ele age, de acordo com a cultura na acepção
kantiana que diz: “...a capacidade de escolher os próprios fins em geral (e,
portanto, de ser livre) é a cultura.” Esse é o sentido da paidéia grega ou
humanitas latina, a qual indica um agir específico do homem em oposição ao
animal, criando um ethos cívico, ou o”animal político’ segundo Aristóteles.