sexta-feira, 17 de setembro de 2021

"Paz entre o Brasil e os republicanos" . Selvino Antonio Malfatti

 

 
Aquela parte do Rio Grande que se estende ao longo da fronteira, no Pampa, teve uma formação diferente do resto do Brasil. Ao mesmo tempo em que o rio-grandense marcava as fronteiras com os castelhanos, recebia deles fundamental influência. Era uma permuta de uma via de duas mãos. Os estancieiros eram, ao mesmo tempo, povoadores de terras e soldados. Rechaçavam qualquer tipo de tentativa de invasão, ao mesmo tempo formavam com eles uma irmandade.
Formou-se um linguajar próprio, quase uma língua, popularmente denominado ”portunhol”, que é uma síntese do português com o espanhol.  Constituem-se com sotaque diferente, palavras mescladas, palavras próprias. Quanto mais se aproxima da fronteira com uruguaios e argentinos, mais aumenta as idiossincrasias entre gaúchos de lá e de cá.
Quem percorre o Rio Grande ficará admirado pela quantidade de tradições que o fundamentam. O Tradicionalismo perpassa o modo de ser próprio do habitante do rio grande. Pode-se-se dizer que o relicário do tradicionalismo gaúcho é o Centro de Tradições gaúchas - CTG. 
O gaúcho possui danças próprias, vestimenta própria, utensílios próprios, maneira própria de fazer. O tratamento é pelo pronome “Tu” e não “você” como no resto do Brasil.
Gosta de se apresentar de peito aberto, isto é, sincero. Dificilmente usa palavrões. Trata a mulher com muito respeito, chamando pelo termo carinhoso de “prenda”. Perante a mulher o gaúcho se considera “peão”.
O gaúcho ama seu solo, o chama de rincão, e, como o quero-quero, está sempre pronto a defendê-lo. 
Não é briguento, mas “não leva desaforo” para casa. Em parte se pode dizer que é fanfarrão, mas só a primeira vista. Por tudo isto, comemora com prazer e espontaneamente o Dia 20 de Setembro.
Em cada recanto do solo riograndense há um CTG. Neles, desde a mais tenra idade, os participantes, meninos e meninas, aprendem os valores: a honradez, o respeito, a sinceridade, a solidariedade. A família, a religião e propriedade alheia são considerados sagrados. Dificilmente um membro de CTG se desorienta do caminho cívico.  O CTG é uma instituição tão calcada nos princípios da cidadania que outros estados estão adotando com entusiasmo como Santa Catarina e Paraná. Há perspectiva de Mato Grosso também adotar.
Por isso, entre os estudiosos da cultura rio-grandense, como Simon Schwartzman,  acham que não era só a questão político-econômica que fez o Rio Grande rebelar-se contra o resto do país na Revolução Farroupilha. Havia um sedimento cultural que amalgamava uma identidade própria.
Neste dia, 20 de Setembro, os gaúchos celebram A Revolução Farroupilha, fato este ocorrido de 1835 a 1845, no atual estado brasileiro do Rio Grande do Sul.
Logo após a independência do Brasil – século XIX – tem início uma série de Revoluções cada uma delas reivindicando algo específico que vai desde maior autonomia até a independência. Neste contexto surge a Confederação do Equador, a Cabanagem, Sabinada, Balaiada e a Revolução Farroupilha.
Esta só em parte é semelhantes às demais revoluções da época, pois os Farrapos tinham um ideal claro a ser atingido. É conhecida mundialmente, como atesta o escritor italiano Umberto Eco que lhe dedica várias páginas no livro O Cemitério de Praga, inclusive convolvendo heróis italianos e rio-grandenses, e narrando façanhas de Guerra dos Farroupilhas.
A Revolução Farroupilha se destaca das demais pela sua peculiaridade. Os farroupilhas tinham um Estado organizado com:

- uma constituição
- uma assembleia e um presidente eleitos
- uma capital
- símbolos estatais
- embaixadores para manter relações diplomáticas
Esta república manteve-se independente por 10 anos voltando ao seu antigo Estado brasileiro através de um convite pacífico do Duque de Caxias.

Que o conflito físico ou material entre a Província e o Império estava encerrado pode-se ver na participação do Imperador na Guerra do Paraguai em Uruguaiana. D. Pedro II, como um voluntário, parte para o front da guerra: Uruguaiana, justamente no ponto em que a Pátria fora violada. No Rio Grande do Sul mostra que não é um estranho: calça botas,  veste pala e usa chapéu de couro e participa ativamente da guerra. Neste momento qualquer veleidade separatista tornou-se página virada. (MALFATTI, S.A. Raízes do Liberalismo Brasileiro. Porto Alegre, Pallotti, 1985, p. 132)

Por tudo isso, o gaúcho é brasileiro por opção e por convicção.

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