sexta-feira, 24 de março de 2023

QUARESMA. Selvino Antonio Malfatti.

 



 

O catolicismo , e algumas religiões cristãs como a Igreja Ortodoxa, a Anglicana, a Luterana, tem um período de seu ano litúrgico denominado Quaresma, cuja origem etimológica é Quarenta.

O cristianismo se alicerça sobre três grandes pilares: o pecado/culpa, redenção e o perdão. Dentre eles o mais problemático é o pecado por que gera a culpa coletiva e hereditária da humanidade. O pecado original. Exige arrependimento individual e coletivo para obter o perdão. Só com isso se restabelece a ordem na sociedade. Mas o que é a culpa original. É uma crença e sentimento coletivo de perda. O cristianismo apresenta como causa o pecado dos primeiros seres humanos. Prudentemente apresenta um corte da história humana: a presença da razão. Um “antes” e um “depois”. Evidentemente não há uma autocritica mais profunda do surgimento da razão. Foi instantâneo? Como a intervenção direta de Deus, pintada por Miguel Ângelo, em um Adão descansando no cotovelo do mapa do Brasil recebendo o elã espiritual do Deus da velha Europa?

Contudo subsistia o problema do mal. No início da Idade Média, um bispo, Santo Agostinho de Hipona, enfrenta a questão do mal. E a conclusão é que a causa do mal é o pecado e este tem uma origem inerente à natureza humana, é originário à natureza. No entanto, contrariando Pelágio, é necessária a graça de Deus. Não bastou o sacrifício de Cristo.

 HiponaHipona,

E o pecado cometido por culpa de quê? Que pecados poderiam cometer? Desobedecer a Deus? Pobres humanos! Coitados! E mais: uma culpa colossal que passa de geração em geração. Se não deveriam provar do fruto, senão conheceriam o bem e o mal, como poderiam fazer bem ou mal antes da desobediência, sem conhecer o bem e o mal? O problema está nisso: se a causa de todas as culpas é a primeira culpa da qual não há culpado porque então culpado?

Os personagens no ato do Pecado original: Deus, Adão e Eva, a serpente, o fruto. Desenvolvimento. A serpente insta Eva a provar do fruto, ela aceita, oferece a Adão este também aceita. São flagrados por Deus nus, são expulsos do Paraíso devem trabalhar sofrer e morrer.  A Salvação acontece com Jesus que se oferece em sacrifício para o perdão do Pecado Original e os demais pecados. 

Até mesmo a Igreja demorou para reconhecer o Pecado Original: século XVI d.C, no Concílio de Trento.

Este é o pecado original, origem da vulneração da natureza humana, da dor e do mal no homem e na sociedade. É um pecado de raiz, transmissível e geral aos seres humanos. O homem não se faz pecador, nasce com o carisma: “minha mãe me gerou em pecado”, diz o Salmo 51. Além disso, o pecado original é fonte de todos os demais pecados.

A questão é que o problema está invertido. Em vez de partir da hipótese do pecado (culpado), se deveria partir da virtude (inocência). Quem disse que somos maus, pecadores? Com certeza não foi Deus! Muito menos o sexo é algo repugnante.

Não existe nada para perdoar. Tudo que Deus fez é bom. Ele viu que tudo era bom. Foi uma obra perfeita, em que pesem as paixões e incoerências, mas superadas com livre arbítrio. Será que Deus deu o livre arbítrio como armadilha para induzir o homem ao pecado e condená-lo? Não se esconda de Deus. Sua nudez não é má. Não precisa ir longe para encontrá-lo. Ele está dentro de nós.

Diz o filósofo Baruch Spinosa:

‘Pare de me pedir perdão! Não há nada a perdoar. Se eu o fiz, eu é que o enchi de paixões, de limitações, de prazeres, de sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio. Como posso culpá-lo se responde a algo que eu pus em você? Como posso castigá-lo por ser como é, se eu o fiz?”

 


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