Uma das grandes dificuldades da vida humana é
enfrentar aquilo que os filósofos da existência denominaram situação-limite.
Karl Jaspers, por exemplo, dirá que essas situações alcançam todos os homens
entorno a temas dolorosos e que tocam a existência conferindo-lhe uma dimensão
de fracasso. Ele se pergunta na Iniciação
Filosófica, se tenho que morrer, que incorrer em culpa, ser tocado por
difíceis possibilidades que não tenho controle, enfim se tenho que sofrer
(JASPERS, 1987, p. 21): “que farei eu perante este fracasso absoluto e cuja
intuição não me posso furtar se honestamente o apreendo?”.
O fracasso humano decorre não tanto do sofrimento
em si, mas de não encontrar uma razão para o sofrimento, o que nos coloca no
cerne do olhar de Frankl para o sentido. Uma das formas de chegar ao sentido é
pelo entendimento do sofrimento. O sofrimento somente é suportável se ele
possui algum sentido para quem sofre.
Uma das mais belas passagens
do livro de Frankl A busca de Deus e
questionamentos sobre o sentido é uma passagem em que Pinchas Lapide comenta
uma passagem bíblica conhecida de todos. Refiro-me ao texto que está no
evangelho de Mc 15, 34 que conta que estando Jesus em agonia na cruz, ele reza
o Salmo 22: Eloí, Eloí, lemá sabachtani.
Lapide esclarece que as palavras de Jesus não expressam dúvida, nem questionam
Deus, mas é uma busca de sentido para o sofrimento na acepção que Frankl
preconiza. Eis a explicação de Lapide (FRANKL, 2014, p. 144): “Em todas as traduções alemãs está
escrito: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? A tradução hebraica diz o
contrário: Meu Deus, meu Deus, para que me abandonaste? E a diferença são dois anos-luz.
Porque o Por que tu me abandonaste vem
de uma dúvida em Deus, ela questiona Deus, ela se volta para trás, ao passado,
à motivação, enquanto a pergunta como foi formulada há três mil anos em
hebraico e como Jesus certamente sabia, olha para o futuro, não questiona a
Deus, mas sim lhe coloca a questão de como o sentido deste sofrimento com toda
a certeza é pressuposto, mas que gostaria de descobrir por que ele me foi
imposto.”
O
que a discussão proposta por Frankl ensina é que o sofrimento, por si mesmo não
ajuda ninguém, nem deve ser procurado, isso seria masoquismo. Logo, se o sofrimento
por si mesmo não ajuda ninguém a alcançar o sentido, é preciso descobrir uma
razão para ele quando nos atinge. E interpretando a explicação de Pinchas
Lapide, Frankl diz (ibidem): “se eu entendi corretamente então a gente poderia
dizer que se trata de uma pergunta dirigida a Deus, mas não um questionamento
de Deus”. Assim, nesses dias de semana santa, a pergunta que Jesus dirige a
Deus explicita a necessidade humana de significar o sofrimento. Jesus não tinha
dúvida de que havia um propósito para seu sofrimento, o que ele não conseguira
é entender adequadamente é a razão de Deus e é essa a pergunta que ele Lhe dirige
ao rezar o salmo 22. Estamos diante de um questionamento do maior significado
porque aponta para o futuro, a descoberta do sentido do sofrimento, o que
representa uma referência importante para viver.