A Universidade Federal de Santa Maria –UFSM - reserva
cotas para alunos do sistema público e para os autodeclarados: negro, indígena,
pardo ,num total de 220 cotas. Além disso, o candidato deve se submeter à entrevista
constituída por uma comissão que envolve aluno, professor, técnico e
representante do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros.
Há algum tempo uma candidata do curso de pedagogia se autodeclarou parda e
provisoriamente foi matriculada. Na entrevista a comissão entendeu que ela não
podia ser considerada parda e, portanto, perdeu a vaga. Não conformada
ingressou na justiça.
Outra candidata ao curso de medicina da mesma
universidade também se autodeclarou parda. A comissão entendeu que não se
enquadrava nos critérios e negou-lhe a matrícula. Ingressou com uma ação na
justiça, recebendo do juiz parecer favorável, alegando que uma comissão não tem
competência para julgar a raça.
Aí que está o problema. Raça nunca deveria ter sido
critério para nada. É um argumento cientifico falso. Raça não pode ser critério
para avaliação nenhuma por que é errôneo. Já vou demonstrar o que afirmo.
O conceito de raça não tem mais nenhum valor científico
no estudo do ser humano: nem para a antropologia física ou biologia, apenas
pela antropologia cultural. As diferenças físicas mais ou menos evidentes (cor da
pele, estatura, forma craniana) não têm relação com a capacidade cognitiva,
comportamentos sociais ou qualidades morais.
Há mais de décadas que antropólogos e genealogistas não
se cansam de enfatizar que 99,9% do patrimônio genético é comum aos seres
humanos e que apenas 0,1% varia discretamente entre as populações e não entre
indivíduos. Por isso, o conceito de raça não tem mais direito de cidadania e
deve ser banido por motivos científicos.
Não estão na mesma ordem as diferenças culturais e por
isso antropológicas, conforme Edward Tylor com as Primitivas Culturas ou Franz
Boas e Claude Lévi-Straus em Raça e História e Raça e Cultura. Aqui sim se pode
encontrar as diferenças, mas não na raça. As pessoas e os grupos se diferenciam
não por que são negros ou pardos mas, por que são diversos culturalmente, como
etnia, meio ambiente, oportunidades.
O conceito de raça humana desaparece da ciência, mas
reaparece no imaginário coletivo e principalmente na retórica política ou
ideologia servindo para estigmatizar a diversidade cultural. Todos conhecem os
efeitos nefastos da ideologia de raça que desencadeou as mais cruéis e
sangrentas guerras. Inclusive o direito entrou nessa história e a maioria das
constituições, ao garantir os direitos do homem, cita a raça.
No caso das cotas da UFSM se o sujeito objeto da ação não
existe, não existem também os problemas que se diz inerente a ele. Se Paulo não
existe, não existe tampouco a gripe de Paulo. Logo, as ditas ações afirmativas
são concessões de privilégios.
No entanto, o que existe é o cultural e as ações
afirmativas podem e devem incidir nele. Quais poderiam ser? O cultural diz
respeito à educação, ao ambiente social, às oportunidades de trabalho e
formação. Se todos são racialmente iguais e as culturas diferentes, deve-se
apostar no cultural e não na raça. Apostar na raça é criar ou aprofundar as
disparidades. No caso da candidata de medicina – através de normas errôneas –
criou uma injustiça. Alguém que disputou pelo critério cultural foi eliminado
pelo racial. Devem valer os mesmos critérios para o mesmo objetivo.
Infelizmente ainda tem abrigo na Constituição brasileira
o conceito de raça quando invoca a igualdade LEGAL: Todos são iguais perante a LEI,
sem distinção de sexo, RAÇA, trabalho...Em outras palavras, reconhece as
diferenças de raça, da mesma forma que de sexo...