O governador do Estado de São Paulo, José Alkmin, e agora
o do Rio de Janeiro, seguidos de outras autoridades decidiram internar
compulsoriamente os viciados em crack. Evidentemente a decisão é polêmica, pois
envolve aspectos jurídicos e éticos. Do outro lado da moeda, no entanto,
existem outras realidades igualmente importantes, tais como a pessoal, familiar e social. Resumiria numa palavra: humana.
Para o cumprimento da lei exigir-se-ia uma solicitação
médica de internação e a questão ética envolve o princípio da autonomia. Para
atender o primeiro quesito faz-se necessário a criação de Centros de
Atendimento Psicossocial – CAPS. Como nem união, nem estado e muito menos municípios
possuem suficientes, por isso seria ilegal a internação.
A questão ética diz que é necessário o consentimento do
paciente para que determinado procedimento seja feito ou de algum parente, como
pais, filhos, esposa, netos etc. Quem são os atores envolvidos na questão das
drogas químicas e mais especificamente o crack? Para mim é pessoa, a família e
a comunidade. A sociedade indiretamente arca com o peso daquela pessoa viciada.
Precisa dar-lhe alimento, vestuário, habitação, saúde. A sociedade só recebe a
fatura e paga. Não tem nenhum retorno. Certamente concordaria com a internação
compulsória. Acontece que a sociedade não é parente e, portanto, não pode dar o
consentimento legal, embora apoie a internação compulsória dos viciados. A
sociedade quer curar-se desta ferida que a está levando para a morte. Precisa
urgentemente de socorro.
E o usuário de droga dará o consentimento? O viciado em
crack não possui mais autonomia da vontade, pois é dependente, e por isso,
abúlico. Tornou-se um simulacro de ser humano. É um corpo humano com alma, mas
sem vontade e consequentemente sem liberdade. Está oco por dentro. Tem
sentimentos, contudo a razão foi dominada pelo instinto. Quer ser recuperado? Até
quer, mas não tem forças, vontade suficiente. Por isso está impedido de dar o
consentimento.
Na impossibilidade de o sujeito manifestar-se é preciso
consultar um familiar. Qual a situação da família com a presença de um viciado
em crack? Por causa dele casais brigam, se ofendem, separam-se, odeiam-se. Os
filhos se dispersam, os irmãos se desentendem, pais e filhos enfrentam-se. Quem
não conhece casos de viciados em crack que roubam e assassinam os pais.
Violentam as irmãs, batem nos irmãos, roubam-nos e os matam. São famílias
inteiras pedindo socorro para que alguém faça alguma coisa. Pais amarram os filhos para evitar que se droguem. Mães trancam o filho para
não deixá-los ir para rua. O desespero chega ao auge quando os filhos têm que dopar o próprio pai para levá-lo ao tratamento.E quando não aguentam mais e tiram-se a própria
vida, suicidam-se.
Por isso, o objetivo maior da
internação compulsória é a família e elas tem o apoio de todos. Elas também
são gente. Os familiares merecem ter uma vida normal. A presença do drogado nelas as está
desintegrando e jogando fora vidas inteiras. É muito sofrimento, um calvário
que não termina mais e o grito desesperado dos familiares ouve-se de todos os
lados: Meu Deus, por que tanto sofrimento?