sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

A REVOLUÇÃO FRANCESA – IDEOLOGIA E COMPOSIÇÃO SOCIAL. Selvino Antonio Malfatti.




 
O livro A Revolução Francesa de Israel Irvine Jonathan pela Editora Enaudi, dá uma nova interpretação à Revolução Francesa. Israel nasceu em Londres em 1946. Dedica-se à pesquisa da história holandesa, o iluminismo e judaísmo na Europa. Leciona História Europeia Moderna no Instituo de Estudos Avançados Princeton, Nova Jersey, Estados Unidos.
Neste livro são trazidos alguns fatos novos e um revisão interpretativa. Entre os fatos novos consta que no Terceiro Estado do Revolução Francesa não havia nenhum homem de negócios, banqueiro, empresário. Nenhuma pessoa que se ocupasse com afazeres típicos da burguesia. Já Burke havia se apercebido disto, qual seja, a alta porcentagem de advogados dedicados à literatura presentes na Assembleia. Pululavam jornalistas, escritores, professores, livreiros, padres e non nobres e alguns filósofos. Por isso, as lideranças da revolução não representavam nenhuma categoria social específica. Dizia um panfleto da época que se houvesse algum intelectual que se emocionasse com os acontecimentos de Paris eram NÃO franceses.
O autor da Revolução Francesa distingue dois braços do iluminismo: o de Locke e Newton, reformista, deísta, inclusive comprometendo-se com as confissões cristãs. E o de Spinoza, radical, materialista, ateu e demagogo. Percebe que os iluministas da academia –filósofos e cientistas - que tomaram parte nos Estados Gerais de 1789 eram um mínimo. Condorcet, por exemplo, arquiteto da revolução não conseguiu se eleger. Sièyes foi eleito por um fio. Bailly foi eleito, mas como ele mesmo explicou: foi uma exceção. O confronto verificou-se logo de início: de um lado os homens de letras e de outro os acadêmicos, pessoas de ciência. Somente dez, dos mil e duzentos deputados eram filósofos ou cientistas iluministas, os demais homens de letras.
No que se refere ao conteúdo ideológico, não foi a ala dos iluministas da linha de Voltaire, mas sim os de Rousseau, como Robespierre, Danton e Marat que conduzia os rumos da Revolução. Condorcet, por exemplo, que não pertencia ao grupo, foi preso e acabou seus dias na prisão. Logo de início emerge uma tensão entre os homens de ciência, os filósofos ou iluministas e os homens de letras, literatos e contrários à ciência. Vale lembrar a primeira obra premiada de Rousseau: se a ciência e as artes fazem os homens felizes. E a resposta foi: não.Teria havido uma ligação ideológica entre o Terror e os princípios revolucionários? A filosofia estaria relacionada com o filosofismo, republicanismo, materialismo, ateísmo e perversão moral? Tudo indica que não. Haja vista que os filósofos do período de 1789 a 1793 foram brutalmente mandados à guilhotina por Robespierre. Os sobreviventes afirmam obstinadamente que a ideologia da revolução era distinta e contrária à filosofia dos iluministas. A inspiração foi buscada em Rousseau cujo conteúdo se inspirava num obsessivo puritanismo moral, mesclado de autoritarismo, anti-intelectualismo e xenofobia.
Conforme Israel, da mesma forma que hoje não se pode explicar a Revolução francesa através da luta de classe, também não se pode admitir de que não foi essencial ou contingente a ruptura entre Igreja católica e Revolução. O impulso anti-cristão foi essencial e se manifestou desde o início, como se pode observar pela atuação de Robespierre. Defendia que a religião, como um dos componentes do contrato social, deveria continuamente ser tutelada, isto é, cercear-lhe a autonomia. O contrato social civil deveria sobrepor-se ao religioso. A religião fazia parte do contrato e não podia ser considerado um órgão autônomo ou independente. O descristianização foi um componente essencial da Revolução e a acompanhou no precedente, no desenrolar e no ulterior desdobramento.
Israel pretende desmascarar o mito de que foram os iluministas que inspiraram a Revolução. Para ele exatamente este mito dificulta a compreensão dos fatos. Entende que a Revolução foi obra e graça de quem não entendia de filosofia ou ciência. Foi obra de ficção literária que passava ao largo e longe do pensamento filosófico, como de Locke, e científico como de Newton. Quando a oposição se avolumou o apelo foi o Terror mandando para guilhotina qualquer dissidente ou opositor.
Da mesma forma, Israel pensa que não foi uma matriz radical do iluminismo que animou a Revolução. Simplesmente pensa que não houve nada de iluminismo na Revolução. Houve, sim, uma ideologia sui generi cujo ápice e escoadouro natural foi o Terror. Um a um os seguidores que creram que fosse iluminismo deserdaram ou foram mortos. Foi o que aconteceu com francês Condorcet, com o americano Paine e o adepto do culto da razão, Cloots mandado para guilhotina por Robespierre.


segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

2020, um novo ano como referência de autotranscendência. José Mauricio de Carvalho – Academia de Letras de São João del-Rei.

                                                                         

Nestes dias de internet e celulares a vida corre rápida e o ritmo é cada dia mais acelerado. Tudo tem pressa na era da comunicação digital e momentos como a passagem do ano nos coloca a pergunta pelo modo como estamos lidando com o tempo. É preciso ensinar as novas gerações mais coisas que as anteriores precisavam para viver. Cada um de nós precisa aprender mais e agir mais rapidamente na rotina diária. Isso porque a sociedade se encontra nesse processo de aceleração da vida. Não parece que importa muito às pessoas o quanto isso as faz esquecer de quem somos e as lança num tempo de massas. Massa é sociedade que não questiona a razão da vida e o que fará com o tempo que dispõe para viver.
Tempo é o tecido da existência humana, tempo é o que nos faz ser o que somos e o que dimensiona o valor de nossa vida. É no quanto nos dedicamos a cada coisa, no tempo que nos preparamos para viver os acontecimentos, que se acentua, para nós, a pergunta pelo sentido. Tempo tem, portanto, a ver com o sentido e valor que damos a nossa vida. Quando entendemos que nos tornamos o produto do que escolhemos e vivemos, antecipamos um pouco nossa finalidade existencial, o sentido de nossa vida.
Toda a meditação filosófica durante o século que passou ensinou que o progresso não virá de forma automática. Quer o progresso material da sociedade e dos indivíduos, quer a evolução moral ou pessoal dessas sociedades ou pessoas, somente ocorrerão com esforço e, às vezes, em razão do que acontece de forma inesperada. O destino de cada um será fruto do que ele conseguir realizar para superar, na circunstância, aquilo que o impede de realizar o sentido de sua vida. Isto é, realizar seus sonhos, viver seus desejos, fazer coisas que façam a vida valer a pena ou ter valor para ele. No fundo a renovação periódica dos anos revela que a vida dos indivíduos humanos e o futuro da sociedade permanecerá um acontecimento que transcende previsões.
E se o futuro depende do que fizermos a cada instante, o entendimento do passado, traz lições importantes e permanecerá, em boa parte, nebuloso. Nossa compreensão do passado se renova com as gerações que realizam novas interpretações do já vivido. Isso porque o passado fornece respostas e é tolice não avaliar essas lições ou tentar entender o que elas indicam. Porém, a crescente compreensão do passado nunca o revelará integralmente, ficará sempre uma parcela para se melhor entendido no futuro.  
Cada homem tem, no quadro geral da sociedade em que vive, a responsabilidade de fazer surgir a pessoa que tem em si e que vai se tornando real com suas escolhas. Assim, a consolidação de cada novo eu entre os homens mostra a aventura de um novo sujeito diferente de todos os outros que existem ou já existiram. O homem comprometido com seu destino e responsável por ele torna-se pessoa. Esse conceito traduz a realidade do indivíduo humano tocado pelos objetivos da moralidade, da autorrealização e da autotranscendência.
Assim, em meio às incertezas gerais quanto ao destino próprio e da sociedade, as pessoas de fé contam com um diferencial. Elas acreditam que a vida que anima sua existência e de tantos outros tem um propósito de melhora, que podemos notar quando estudamos a História. Uma melhora que não vem sem esforço e comprometimento, mas uma melhora visível para quem tem fé num Deus que governa a história.
Um feliz 2020 para todos, um feliz ano novo na esperança de que ele renove nosso compromisso conosco e em sermos melhores a cada dia. Desse modo ajudaremos a aprimorar a sociedade e a viver responsavelmente o compromisso conosco mesmo.
F E L I Z  A N O  N O V O!

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