Martin
Buber distingue um falso do autêntico nacionalismo, o segundo dedicado a curar
as dores identificadas na consciência nacional dos povos. Ele também contrapôs
o nacionalismo forjado no Sacro Império e reorganizado pelo idealismo alemão,
que foi assumido pelas nações ocidentais, do nacionalismo judaico.
O
estabelecimento do esteio religioso, parece-lhe o elemento definidor da
nacionalidade judaica, e pensando assim respondeu aos filósofos do ocidente e a
parte elite judia. Refiro-me à burguesia judaica, rica e poderosa, que estava,
no início do século passado, bem integrada na comunidade germânica. Buber
pretendia a reconstrução do Estado judeu, como propusera Theodor Herzl, mas
para viver o ideal histórico do judaísmo, que é anunciar aos outros povos o
Reino de paz na terra, na trilha do judaísmo espiritual preconizado por Hermann
Cohen.
Se
Buber discorda de Herzl por não considerar possível um projeto político que se
afastasse do judaísmo espiritual, distancia-se também de Cohen porque o
judaísmo espiritual não é uma proposta íntima como a moral kantiana segundo
avaliava Cohen, mas uma ação coletiva comprometida com a construção do Reino de
Deus. Dessa forma, o nacionalismo judeu embora esteja na base dos nacionalismos
cristãos do ocidente, distingue-se dele pelo vínculo diverso entre a fé e a
nacionalidade.
A
análise de Buber, diferenciou a espiritualidade cristã da judaica, mostrando
que a segunda não se resume a uma experiência íntima, mas é nacional. Sua
análise, embora profunda e complexa, não considerou um aspecto da tradição
cristã. No universo cristão, tome-se, por exemplo Portugal, Delfim Santos aborda
a relação entre espiritualidade e nacionalidade, destacando a importância da vocação
de cada homem. O filósofo português pensa a sociedade de seu tempo, suas
dificuldades e os desafios. Delfim Santos parte daquela concepção vinda do
idealismo alemão. Porém, para ele, nação era espaço coletivo e democrático, com
um tipo de democracia que não prescinde da atuação qualificada de seus
cidadãos. Para Santos a formação moral era que qualificava a participação dos
cidadãos no grupo, e não apenas lhes oferecia a chance de viver cada qual
conforme seu próprio projeto de vida.
Essa
vida qualificada significava vencer as dificuldades de cada tempo, numa
concepção de história entendida como enfrentamento de crises. Esse esquema se
tornou comum entre os filósofos da existência e outros próximos que trabalhavam
de parecida como o filósofo espanhol José Ortega y Gasset. Crise para eles era
mais que o pensado por Husserl, isto é, uma crise de consciência que se deu
conta das insuficiências do modo de pensar moderno. Para esses filósofos trata-se
de uma crise de cultura, onde as nações perderam a confiança e segurança no
futuro, o homem afastou-se de si e empobreceu a participação coletiva.
A
crise da democracia e sua requalificação era para esses pensadores uma forma de
rever a participação dos cidadãos na construção do futuro dos povos, uma
maneira de vencer a democracia das massas, um desafio que permanece atual. Em O homem e a filosofia, pequenas meditações sobre a existência e a
cultura entra-se nessa questão ao dizer que um projeto cultural somente se
faz a partir da singularidade existencial, um compromisso não se vive sem o
outro. Esse entendimento destaca um aspecto não considerado por Buber, a vocação
e singularidade existencial é inseparável do compromisso com a construção de
uma comunidade ética.