Volta e meia se ouve que alguma biblioteca pública foi fechada. Geralmente quem toma esta decisão? Quase sempre algum burocrata exercendo uma função pública. Ora, entregar a decisão do fechamento ou não de uma biblioteca
pública a técnicos frios e burocráticos é no mínimo lamentável. O que eles
levam em conta? Se o prédio oferece segurança, condições, e não é deficitária. Isso é significativo?
É. Mas não é só isso que está em jogo.
O fechamento de bibliotecas
atualmente não é um fenômeno isolado. É uma prática generalizada. Acontece aqui
no nosso país – a Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro, a biblioteca pública
de Porto Alegre, do Rio Grande do Sul, por exemplo, e várias outras, foram
simplesmente fechadas sem compensações ou alternativas. A prática se generaliza na
Europa e até mesmo nos Estados Unidos.
Embora atualmente existam “bibliotecas virtuais”, através
de aparelhos como Ebooks, Kindle, e-readers, tablet, kindle paperwhite e
outros, pelos quais podemos trazer a biblioteca até nós em vez de irmos a ela,
o papel que uma biblioteca real desempenha ainda é insubstituível. E por isso, não
justifica seu fechamento, sem uma compensação.
Há dois tipos de fechamento. O primeiro tem como fator
preponderante as diminuições crescentes de investimentos e dotações
orçamentárias. As que fecham, neste caso, querem evitar a falência. O segundo,
o fechamento é temporário, para reformas. Só que estas ditas reformas se
prolongam indefinidamente. Por que, antes de fechar, não se pensou em algum
local que as abrigasse?
Quais as conseqüências do fechamento de bibliotecas,
mormente as públicas? É o mesmo que abortar crianças, embrutecer jovens e
desamparar idosos. Antes que cresçam são mortos, ao começar conhecer a vida
do espírito são forçados a viver como brutos e quando podem deleitar-se da
cultura são destinados à solidão. O que será da próxima geração de leitores,
pesquisadores, estudiosos e mesmo sonhadores através de ficção? Será o
apocalipse cultural? Ou um mundo do virtual “Ensaio sobre a Cegueira” de José
Saramago para um mundo real?
Olhemo-nos bem nos olhos. Os livros são caros,
principalmente os novos e os clássicos. Por outro lado, a missão de uma
biblioteca é de dispô-los a todos. Todos mesmo: jovens e idosos deveriam ter a
possibilidade de ler aquilo que querem, quando quiserem, independente da
situação econômica de cada um. Os livros fazem o mesmo papel para o espírito
que o oxigênio, a água e o sol para os seres vivos. Todos têm o direito de ter
acesso.
Quando se fala em biblioteca a maioria de nós pensa no
empréstimo de livros. Mas não é só para isso que servem. As bibliotecas são
lugares calmos, confortáveis que muitos buscam para fugir do burburinho do dia
a dia e dar-se ao luxo de pensar e sonhar, viver o espiritual. São também lugares de encontros, de
trocas de idéias, de estudos. A biblioteca é um coração que pulsa no bairro que moramos, de nossa cidade ou do
país do qual somos cidadãos.
Penso que cada um está passando o filme de sua infâncoia e juventude em sua mente.
Desde a infância olhávamos com admiração e respeito para o prédio da biblioteca
de nossa cidade. E se tivéssemos qualquer tempinho vago entrávamos na
biblioteca nem que fosse apenas para folhear o jornal ou as revistas, ver quem
estava lá e conversar, dar uma olhada no catálogo para ver as novidades. E na
maioria das vezes saíamos com um livro em baixo do braço. Voltávamos para casa,
saltitantes, orgulhosos, sentindo-nos semideus. Lembro-me que no colégio onde
estudava como interno, havia certos livros proibidos de serem lidos. O motivo não vem ao caso. Não tive
dúvidas: associei-me à biblioteca pública da cidade e lia tudo o que tinha vontade.
Se você está lendo este artigo certamente não é dado a
práticas de abortar agentes culturais. Ao contrário esmera-se para
aprimorá-los. Por isso deve ser um defensor de bibliotecas públicas. Aliás,
diga-se de passagem: no dilema de fechar ou não uma biblioteca é como estar
diante de uma encruzilhada de dois caminhos. Um leva para as trevas, cegueira e outro
para a luz, a visão. Basta escolher.