O
psiquiatra e filósofo Vitkor Frankl acolheu dos filósofos da fenomenologia a
ideia de que o homem é constituído como corpo material, com função
vital-psicológica e dimensão espiritual. Ele trabalhou esse entendimento a
partir do pensamento de Nicolai Hartmann e, especialmente, de Max Scheler. Isso
lhe permitiu pensar um humanismo que reconhecia a insuprimível realidade do
espírito. Essa questão teórica teve importância prática ao tratar o sofrimento
psíquico separado de outras dores oriundas do espírito. E compreender,
adicionalmente, que essas últimas, embora não sejam da mesma natureza dos
primeiros, produzem sofrimento psíquico ou os agrava.
Os
quatro estratos mostram o homem completo: matéria – vida – consciência –
espírito ou sinteticamente corpo vivo e consciência espiritual. Descrever assim
o homem abre a visão do que ele seja. Os estratos se superpõem de modo que com
a descrição fenomenológica (FRANKL, 2017 c, p. 69): “é somente no espaço do corporal-psíquico-espiritual
que o humano vem à tona pela primeira vez.”
Descrever a realidade desse modo evita uma visão unilateral do homem. Evita
que se reduza o sujeito a impulsos, instintos ou mecanismos fisiológicos
próprios de quem fica no funcionamento corporal ou dele faça um espírito
desencarnado.
Ao
descrever a vida humana com esses quatro estratos e verificar que eles são irredutíveis,
os fenomenólogos ratificaram que o espírito não pode ser explicado por outro
estrato. E mais, nota-se que o espírito é o estrato responsável pelo pensamento
lógico e a compreensão consciente do mundo. No entanto, o homem não apenas está
no mundo como um objeto entre outros. O espírito não apenas compreende, mas
está na raiz das escolhas, o que leva os fenomenólogos a dizer que o espírito é
a base da liberdade. Uma liberdade limitada ou circunstanciada é fato, mas
ainda assim uma liberdade. Esse aspecto reconhecido empiricamente por todas as
pessoas serve como contraposição para a ideia de que o homem é resultado de processos
que podem ser descritos pelas ciências naturais, como fizeram psicanalistas e
outros cientistas. Nessas reduções o homem é visto como nada mais que (LUIJPEN,
1973, p. 184): “uma coisa, visto que se pode afirmar, em sentido estrito, ser
ela o resultado de processos e forças”.
Logo, nesse esquema, o espírito é sede dos
valores e do sentido, sem anular a força dos impulsos do psíquico. O espírito,
para Frankl, encontra-se acima dos outros estratos e permite orientá-los, nele
se situando o sentido existencial. Desse modo (KRETSCHMER, 1990, p. 63): “A
filosofia do sentido se encontra imediata e inseparavelmente vinculada a
filosofia dos valores. Ocorre que só valores podem dar sentido à vida.” É por
isso que escolhas envolvem elementos espirituais. O tema da responsabilidade
ganhou importância em nosso tempo, pois perdeu força na sociedade de massas,
atraindo a atenção do filósofo e do cientista. Da perspectiva psicopatológica,
Frankl observou que a descrição fenomenológica do homem por estratos permitiu
diferenciar os transtornos psíquicos dos nascidos na esfera espiritual.