O
domingo que passou, devido à comemoração do dia dos pais, assistiu se
multiplicarem nas redes sociais os cumprimentos aos pais. Também se viu
agradecimentos tímidos, lembranças saudosas, mas quase nada sobre o sentido e
valor da paternidade. E, em meio às mensagens e às mudanças nas famílias de
hoje, terminei o dia pensando na importância do pai enquanto referência de
afeto, segurança, dos valores morais e da esperança. Pouca novidade, Freud já
associara a formação da estrutura moral à educação paterna. Por outro lado,
Freud insistiu pouco na importância que tem as referências paternas na
construção da vida singular, que é o modo próprio da vida humana.
O
homem, apesar da racionalidade, é um animal. Como tal precisa aprender a viver
com seus instintos e a realizar seus desejos como é possível numa sociedade
civilizada. Neste sentido, a presença do pai junto aos filhos, especialmente
enquanto ainda são pequenos, é referência imprescindível de orientação
existencial. Ainda quando os filhos se rebelam, e frequentemente o fazem para
experimentar trajetória própria, é o pai que eles têm em vista. E é este pai
que eles aprenderão a imitar e respeitar à medida que seguem sua própria via
existencial, mesmo quando seguem por caminho diferente. Mesmo envolvido na difícil
tarefa de levar adiante a existência singular, mesmo criando cada geração seu
estilo de viver, é o pai que cada um terá como referência quando a vida trouxer
as crises. É a lembrança paterna, sobretudo da infância, o espaço onde cada
qual encontra os elementos para seguir adiante e fazer diferente do pai, mas
como o pai. E quanto mais velhos ficamos, mais reconhecemos o valor e o
significado desta presença.
Quando
o pai consegue ser presença de afeto e segurança, o que ele ensina não simplesmente
reproduz os valores sociais, mas é orientação segura para vida, baliza do que é
bom e do que não é. Neste nosso tempo de violência, irresponsabilidade e gozo
ansioso, quanta gente pode dizer que teve um pai como referência? Quantos jovens
que hoje enchem as casas de correções, quando destes que já não cabem em nossas
cadeias estariam lá se tivessem tido, ao seu lado, principalmente na infância,
um pai. Não importa a classe social, nem é preciso ser perfeito, mas é necessário
ser alguém que ama e orienta. Quantos desses jovens perdidos não o seriam se
tivessem tido um pai. Apenas um pai que eles também pudessem amar e de quem não
se envergonhassem.
Ninguém
pode deixar de cuidar da própria vida, de fazer diariamente suas escolhas. E
não há como subtrair-se à responsabilidade pessoal nas escolhas do dia a dia,
no campo pessoal ou profissional, no universo político ou religioso. A vida de
cada um é essencialmente sua edificação, mas na hora de escolher, o que o pai
ensinou ou deixou de fazê-lo, mostrará seu peso.
O
que foi dito acima mostra que cada pessoa é responsável pelo rumo que der a
seus dias. Em última instância é o indivíduo mesmo o grande agente de sua vida.
No entanto, o que este dia dos pais sugere é que criar com trabalho e amor deixa
a marca da presença paterna na vida singular. E não estamos falando ao longo deste
texto do pai biológico, mas do que é presença. Não somos o primeiro homem, dizia
Ortega y Gasset para explicar que aprendemos uma língua, ciência, costumes e
crenças que já existem. Se tudo isso estará presente em nossas escolhas futuras
como ele diz, também aprendemos a coragem, a perseverança, a experiência do
amor e os valores na condução da vida pela convivência com o pai.
O
dia dos pais passou, que ele possa, além dos cumprimentos da ocasião, ser oportunidade
de reflexão sobre o compromisso de ser pai. Que ele aumente a consciência da
responsabilidade com os filhos e com o futuro dos homens e do país. Se não formos
melhores pais, não contribuiremos muito com o futuro da humanidade. Pois sem
limitar os instintos, superar o egoísmo primitivo, não é possível a aceitação
do outro, o reconhecimento de sua liberdade. Não se aprende a amar e a ir
adiante das situações sem superar as limitações do egoísmo infantil.