O ator brasileiro, Flávio
Migliaccio suicidou-se deixando uma Carta acusando, genericamente, não se sabem
bem quem:
“Me desculpem, mas não deu
mais. A velhice neste país é (…) como tudo aqui. A humanidade não deu certo. A
impressão que foram 85 anos jogados fora num país como este e com esse tipo de
gente que acabei encontrando. Cuidem das crianças de hoje”, disse na carta.
Questiona-se: o quê e por
que não “deu certo” a velhice. Responderia que foi pelo seguinte: a saúde fez
a sua parte, mas a política se omitiu. A ciência melhorou a saúde, deu mais
anos de vida, aprimorou a qualidade de vida, ofereceu a possibilidade de
alegria de viver na velhice. A política não providenciou assistência à saúde,
não disponibilizou locais próprios, abandonou-os à própria sorte ou encerrou-os
em casa junto com filhos e netos: sem saúde, sem alimentação adequada, sem
acesso a bens materiais e imateriais, sem lazer, sem passeios, como poderia dar
certo?
O que está em jogo é
estruturar o período da velhice para que seja prazeroso e o menos dolorido
possível. Em sociedades adiantadas, os vários períodos da vida possuem uma
organização cujo trajeto flui normalmente. Assim acontece com o período de
criança, infância, adolescência, juventude e vida adulta. Em cada período
destes as pessoas ingressam e saem naturalmente. Para cada uma delas esperam-se
comportamentos adequados e o ingresso e saída se dá sem traumas, a não ser os
próprios do período. Uma criança passa da infância para a adolescência sem
sentir e transcorre o tempo no estágio sem transtornos.
Isto é ocorre com a velhice.
Quando a pessoa ingressa nela se vê perdido, abandonado, sem finalidade. Não há
uma estrutura que abrigue a velhice. Refiro-me uma estrutura institucional
assumida pelo poder público e coadjuvado pela iniciativa privada.
Este é o princípio da
solidariedade entre as gerações. Há uma geração anterior que originou a atual,
uma geração atual que precisa cuidar desta quando envelhecer. São três momentos:
anterior, atual e posterior. O fluxo solidário não pode ser interrompido com o
perigo do rompimento do vínculo cultural. Se o elo estabelecido se romper as
gerações deixarão de se identificar umas com as outras como um nós.( Cf. Manuel
Castells, sociólogo espanhol, em artigo publicado por La Vanguardia, 20-06-2020).
Acresce-se o aumento da
expectativa de vida em lugares de ciência mais avançado, mas de estruturas de
assistência não tão avançados, causa desequilíbrios quando não houver políticas
públicas adequadas. Até pouco causava
admiração os septuagenários, depois vieram os octogenários, em seguida os
nonagenários e agora já aparecem os centenários. A gerontologia requer cuidados especiais: saúde, alimentação,
lazer, assistência 24 horas. O problema é que não há estruturas públicas para
isso e as privadas são caríssimas. As famílias não conseguem dar suporte
econômico a esses seus familiares. E o poder público é omisso. Com isto as
gerações de idosos ficam à mercê das famílias que não podem suportar
economicamente e muito menos emocionalmente os idosos.